Grégoire Courtine e Léonie Asboth, pequisdores da Escola Politécnica Federal de Lausana, na Suíça

Gr�goire Courtine e L�onie Asboth, pequisdores da Escola Polit�cnica Federal de Lausana, na Su��a

(EPFL / Alban Kakulya)

Quando ocorrem danos parciais na medula espinhal, a paralisia inicial pode ser seguida por uma espont�nea e natural recupera��o da fun��o motora. No entanto, em casos de les�es completas, isso n�o acontece. Nesse caso, para obter uma reabilita��o significativa, s�o necess�rias estrat�gias que promovam a regenera��o das fibras nervosas, que t�m papel fundamental na comunica��o entre diferentes partes do corpo, transmitindo sinais el�tricos e informa��es. Agora, pesquisadores dos Estados Unidos e da Su��a descobriram que, para restabelecer a atividade funcional ap�s a les�o medular grave, o crescimento dos neur�nios e de suas fibras deve ser direcionado at� suas regi�es-alvo naturais. A equipe testou a abordagem em ratos e obteve resultados promissores: os animais voltaram a andar.

O tratamento desenvolvido fez com que os ax�nios — um tipo de fibra nervosa que permite a comunica��o entre os neur�nios — voltassem a crescer ap�s uma les�o na medula espinhal. As cobaias recuperaram a capacidade de andar, exibindo padr�es de marcha semelhantes �quelas que restabeleceram a habilidade naturalmente ap�s les�es parciais.

Mark Anderson, autor s�nior do estudo, conta que alcan�ar a recupera��o funcional nas cobaias foi um grande desafio. Primeiro, o grupo precisou descobrir se seria poss�vel regenerar as fibras nervosas. "H� cinco anos, demonstramos que � poss�vel regenerar as fibras nervosas em les�es anat�micas completas da medula espinhal. No entanto, tamb�m observamos que isso n�o � suficiente para restaurar a fun��o motora porque as novas fibras n�o conseguem estabelecer conex�es adequadas do outro lado da les�o", detalha, em nota, o cientista do Wyss Center for Bio and Neuroengineering, nos Estados Unidos.

Bernardo Drummond Braga, chefe do Departamento de Coluna do Instituto de Neurologia de Goi�nia, refor�a que a maior dificuldade na regenera��o �, de fato, o neur�nio encontrar o outro lado. "Em uma les�o medular completa, ocorre a perda da comunica��o do c�rebro com a parte desconectada da medula. Uma informa��o que sai do c�rebro para mover a perna n�o consegue atingir a musculatura respons�vel pelo movimento. Por ser uma les�o completa, todas as fun��es dos neur�nios da medula s�o perdidas", conta.

O m�dico brasileiro compara a situa��o ao rompimento de uma corda de sisal cheia de pequenos filamentos. "Ligar a corda de volta, filamento por filamento, parece imposs�vel. Agora imagine se essa conex�o de filamento por filamento n�o for realizada com as pontas corretas. Ou seja, se o fio do bra�o for conectado errado ao da perna. Isso n�o traria uma resposta funcional adequada, e o grupo combinado de impulsos nervosos n�o levaria a uma fun��o ordenada."

No novo estudo, Anderson e os colegas buscaram descobrir se direcionar a regenera��o de ax�nios de subpopula��es neuronais para suas regi�es-alvo naturais poderia levar a uma restaura��o funcional significativa ap�s les�o na medula espinhal. Primeiro, eles usaram an�lises gen�ticas avan�adas para identificar grupos de c�lulas nervosas que permitem a melhora da caminhada ap�s o problema. Para isso, o grupo, incluindo cientistas das universidades da Calif�rnia e de Harvard, usou equipamentos de �ltima gera��o da Escola Polit�cnica Federal de Lausana, na Su��a.

"Nossas observa��es usando sequenciamento de RNA nuclear unicelular n�o apenas expuseram os ax�nios espec�ficos que devem se regenerar, mas tamb�m revelaram que esses ax�nios devem se reconectar aos seus alvos naturais para restaurar a fun��o motora", afirma, em nota, Jordan Squair, o primeiro autor do estudo, publicado na edi��o desta semana da revista Science.

Regenera��o

Depois, partiu-se para o processo de regenera��o, que foi desenvolvido em tr�s etapas principais. "Primeiro, programas de crescimento desativados em c�lulas nervosas s�o reativados. Segundo, subst�ncias nas quais as fibras nervosas podem crescer s�o induzidas na �rea da les�o, permitindo que os ax�nios se regenerem atrav�s da les�o. Terceiro, s�o fornecidas subst�ncias que atraem e orientam as fibras nervosas para que cres�am de volta �s suas regi�es alvo naturais", explica Michael Sofroniew, autor s�nior do estudo e professor da Universidade da Calif�rnia.

Segundo o pesquisador, os resultados indicam que uma combina��o certa de interven��es possibilita a regenera��o de fibras nervosas e gui�-las at� suas regi�es-alvo naturais."Se isso for alcan�ado, algum grau de recupera��o da fun��o � poss�vel. At� agora, a recupera��o foi apenas parcial e longe do normal, mas � encorajadora", avalia.

Francisco Gondim, neurologista da Academia Brasileira de Neurologia, acredita que o caminho ainda � longo at� a possibilidade de que a abordagem seja utilizada em humanos. "Esse tipo de regenera��o segue princ�pios diferentes da em animais experimentais. Em animais, principalmente camundongos e ratos, ela ocorrer� de modo mais facilitado", explica. "Trata-se de uma descoberta importante como um novo princ�pio terap�utico, mas, at� que possa ser testado em humanos, a dist�ncia � muito longa."

Segundo o m�dico, muitas terapias com resultados satisfat�rios em animais n�o tiveram o mesmo efeito em humanos. "O princ�pio abordado no trabalho faz sentido e, eventualmente, dever� ter utilidade cl�nica, mas pode demorar d�cadas. Da� a necessidade de moderar as expectativas dos pacientes. � um campo dif�cil e complexo."

Os pesquisadores tamb�m reconhecem que promover a regenera��o em modelos maiores que roedores � mais complexo e requer outras estrat�gias. Gr�goire Courtine, autor s�nior do estudo, indica a possibilidade de uma combina��o de estrat�gias. "Esperamos que a nossa terapia gen�tica atue em sinergia com os nossos outros procedimentos que envolvem estimula��o el�trica da medula espinhal. Acreditamos que uma solu��o completa para o tratamento de les�es na medula espinhal exigir� ambas as abordagens, terapia gen�tica para regenerar as fibras nervosas relevantes e estimula��o da medula espinhal para maximizar a capacidade tanto dessas fibras quanto da medula espinhal abaixo da les�o de produzir movimento", diz o pesquisador da institui��o su��a.