
Bastou um post criticando a expans�o da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) para Jana�ba e Una�, justamente cidades que n�o pertencem ao vale, para o Blog do Jequi (blogdojequi.blogspot.com) receber uma enxurrada de coment�rios ofensivos, como: “Vale da pobreza”; “N�o tem nem escola, como vai ter universidade?”. Os haters, famosos odiadores da internet, disseminaram seu veneno com ataques. “� uma ira que eu n�o entendo”, desabafa o blogueiro respons�vel pela p�gina, Bernardo Vieira Silva, oficial judici�rio do Tribunal de Justi�a de Minas Gerais (TJMG), de 26 anos.
Criado em junho de 2011, o Blog do Jequi tem m�dia de 2,5 mil acessos di�rios. No espa�o s�o publicadas, diariamente, not�cias da regi�o. “Cerca de 90% do filtro de spam s�o ofensas an�nimas”, detalha Silva. Como a fun��o de comentar � restrita, com pr�-aprova��o, ele prefere n�o publicar as ofensas. Bernardo Silva conta que certa vez chegou a imprimir a tela e mostrou a um promotor pensando em processar o autor por cal�nia. “Mas teria que buscar o endere�o IP, e � dif�cil, porque normalmente eles postam de lan houses. Senti que n�o ia dar em nada e n�o prossegui”, ressalva Silva.
Se os atletas durante as Olimp�adas de Londres e at� a popstar Madonna viraram alvo de desacatos na web, os blogs de moda tamb�m n�o escapam da ironia dos haters de plant�o. No Sim, senhorita (srtasenhorita.com), a artista pl�stica Camila Gomes, de 29 anos, diz atrair o �dio da massa com a coluna “Cliente oculto”. Nela, a blogueira visita uma loja anonimamente e avalia o atendimento. O nome do estabelecimento � divulgado, mas os funcion�rios nunca s�o identificados. Mesmo assim, o conte�do � o campe�o de ofensas.
No caso mais grave, ela percebeu que, apesar dos codinomes diferentes, a mesma pessoa persistia em postar desacatos. “Encaminhei as postagens para a loja e falei que poderia ser um funcion�rio e que estava incomodando. Eles deram um retorno e os coment�rios pararam”, relembra. Camila explica que desistiu de responder aos xingamentos, porque acabaria alimentando a discuss�o. Mesmo quando recebe observa��es do tipo “Voc� est� rid�cula com essa roupa”, ela publica os textos, porque “a pessoa gastou tempo naquilo”, explica.
Em outra ocasi�o, a blogueira descobriu que uma pessoa utilizava o hor�rio do trabalho para encher sua caixa com mensagens negativas. “H� um recurso no Wordpress que determina o IP do usu�rio”, detalha. Depois de revelada, o hater desistiu de trollar (ridicularizar) o blog. “Se voc� n�o gosta, � s� fechar o navegador. Mas os haters n�o conseguem deixar de acessar o conte�do que dizem odiar. Hoje lido melhor com isso. Sei que eles est�o contribuindo com os meus n�meros (postagens)”, ironiza.
Pimenta pode ser refresco
“Detonadora master de blogueiras no Brasil”. Foi com essa indica��o que descobri a Titia Shame, do blog Shame on you, blogueira (blogueirashame.blogspot.com), que chega a ter cerca de 150 mil visualiza��es por dia e m�dia de 70 coment�rios por post. Defendendo-se com o lema “Quem n�o pode atacar o argumento ataca o argumentador”, ela denuncia falcatruas publicit�rias dos blogs de moda, aponta erros grosseiros de portugu�s, al�m de ridicularizar alguns looks postados. Tudo isso gerou a receita perfeita para alimentar o �dio de uma legi�o de mulheres, afinal, p�ginas pessoais sobre moda viraram febre na blogosfera.
At� o m�s passado, eram muitas as especula��es sobre quem seria a Titia Shame, que permanecia an�nima. Um pequeno deslize de sincroniza��o de contas do Twitter e do Instagram acabou associando a personagem � farmac�utica Priscilla Rezende, de 37, de Carmo do Para�ba, interior de Minas. No dia da revela��o, a hashtag #Shame chegou a ficar no trending topic do microblog. Priscilla foi alvo de uma enxurrada de ironias.
O blog foi criado em setembro do ano passado. Priscilla n�o se considera uma hater, porque diz n�o odiar ningu�m. “Percebia que as blogueiras mentiam para as leitoras e achava desonesto e injusto”, explica. A maioria do conte�do de den�ncias s�o colabora��es dos internautas. Quando o assunto � mais s�rio, ela investiga a veracidade antes de publicar. “Tenho minhas fontes secretas”, afirma.
Shame diz n�o se incomodar com o �dio alheio, mas procura n�o ler o que escrevem sobre ela para n�o se aborrecer. “Eu acho que deviam gastar essa energia para melhorar o trabalho delas em vez de se preocuparem comigo. Quem faz um bom trabalho n�o aparece no meu blog”, provoca. Normalmente, ela recebe muitas cr�ticas e ofensas em sua p�gina, por isso todos os coment�rios passam por modera��o. Priscilla brinca que as blogueiras t�m muitas “talif�s” (mistura de talib� com f�) que a xingam de variados nomes ao ver as postagens. Amea�a de processo ela recebe sempre, mas, segundo ela, todas sem embasamento jur�dico.

Cultura do �dio
Segundo Marco Ant�nio Alvarenga, de 36 anos, professor de psicologia e doutor em Psicologia do Desenvolvimento Humano (tema diferen�as individuais do bullying), os haters s�o pessoas geralmente mais fechadas � diferentes experi�ncias, ideias ou valores, portanto, apresentam pouca abertura em sua personalidade. Mas ele ressalva que n�o � s� isso.
A combina��o se torna problem�tica, pois eles s�o tamb�m pouco cordiais, am�veis e receptivos a outras pessoas. “S�o emocionalmente cegos a experi�ncias diferentes daquilo que acreditam. Esse mesmo tipo de pensamento ou cogni��o est� presente nos neonazista, nos intolerantes religiosos e em autoridades pol�ticas”, afirma.
A ilus�o de anomimato da rede serve para agredir sem sofrer as consequ�ncias. Mas Alvarenga acredita que os haters usam a rede mais como um sistema de manipula��o para propagar suas ideias do que necessariamente direcion�-las a algu�m, o que � ainda mais perigoso. “Uma vez tendo o aval de muitas pessoas, fica mais f�cil as ideias de �dio serem aceitas e incorporadas pelas outras pessoas”, justifica.
O professor explica que h�, em certo sentido, a rela��o dos haters com a disson�ncia cognitiva (conflito entre as pr�prias ideias). Segundo o professor, essas pessoas pregam que alguns tipos de condutas s�o incompat�veis com a humanidade, mas a forma como eles se comportam � incompat�vel com a coexist�ncia pac�fica entre as pessoas.
Os haters tem maior chance de desenvolver doen�as f�sicas e mentais, porque seu sucesso na vida � limitado, por sempre se preocuparem mais com o seu �dio do que o mundo ao seu redor. S�o pessoas, que segundo Alvarenga, podem sair dessa condi��o desde que encontrem a origem de tanto �dio e se submetam a um tratamento multidisplinar e especialmente psicoter�pico.