Del�rios e altera��es do pensamento s�o sintomas marcantes desse dist�rbio. Mas h� outra caracter�stica que pode ser facilmente reconhecida nas entrevistas concedidas � televis�o por Nash, que inspirou o filme Uma mente brilhante (2008). O olhar inquieto, que n�o se fixa no interlocutor e faz movimentos r�pidos e descoordenados, � uma particularidade dos esquizofr�nicos. Um exame dessas altera��es poder� se tornar o primeiro m�todo de diagn�stico f�sico da doen�a, que, at� agora, � identificada apenas pela anamnese (entrevista feita pelo profissional de sa�de com o objetivo de avaliar um paciente).
Em uma pesquisa publicada na revista Biological Psychiatry, psiquiatras brit�nicos conseguiram diagnosticar pacientes de esquizofrenia com mais de 98% de precis�o baseados apenas em testes visuais. “Os pacientes n�o parecem ver o mundo da mesma forma que indiv�duos saud�veis. Eles t�m um olhar que n�o se fixa, que demora a seguir objetos em deslocamento, mas, depois que alcan�a a trajet�ria, os movimentos se tornam r�pidos e bruscos”, diz o principal autor do estudo, Philip Benson, do King’s College London e da Universidade de Aberdeen.
Benson lembra que, j� em 1908, esse padr�o ocular anormal foi notado em pacientes psic�ticos pelo psiquiatra Allen Diefendorf e pelo psic�logo Raymond Dodge, que desenvolveram testes para investig�-lo. Por�m, o rastreamento dos movimentos dos olhos era feito com um p�ndulo — o indiv�duo precisava seguir o vaiv�m do objeto —, enquanto, na pesquisa brit�nica, foram usadas imagens do dia a dia, sem que os cientistas precisassem orientar a dire��o que os participantes deveriam seguir. “O resultado com imagem � muito mais convincente e, talvez, mais informativo, porque � fruto de um movimento ocular natural”, acredita.
Testes
Os pesquisadores fizeram tr�s tipos de testes. Em um deles, os participantes tinham de manter a cabe�a ereta e seguir com os olhos, o mais suavemente poss�vel, uma linha que se movia em uma tela. Outro experimento apresentava fotos como paisagens, pessoas e alimentos, e o volunt�rio s� precisava olhar para elas, sem acompanhar um padr�o fixo. Por fim, os participantes deviam fixar os olhos em um ponto por alguns segundos e se nesse meio tempo aparecesse outro ponto, ignor�-lo. “Esse �ltimo � bem f�cil de entender e todo mundo pode fazer. Usamos como substituto para um teste muito mais dif�cil aplicado em outros laborat�rios, que costuma confundir os pacientes”, relata Benson.
Enquanto participavam dos exames, os pacientes tinham os olhos filmados e analisados por um software de computador, que tra�ava um caminho a partir dos pontos nos quais as pessoas haviam fixado o olhar. Os resultados (veja arte) n�o deixaram d�vidas de que esquizofr�nicos t�m um padr�o de movimento ocular bastante diferente do de pessoas saud�veis e n�o conseguem se fixar em um objeto por muito tempo, como ficou claro principalmente no �ltimo teste. A an�lise dos exerc�cios visuais foi feita pelos pesquisadores sem que eles soubessem de quem eram os exames. Ao combinar o resultado dos tr�s experimentos, eles chegaram ao �ndice de 98,3% de precis�o diagn�stica. Houve, inclusive, casos de pessoas que estavam no grupo de controle e, depois de fazer os testes, a esquizofrenia foi detectada. O contr�rio tamb�m ocorreu, com quatro pacientes tidos como esquizofr�nicos, mas que apresentaram um desempenho que os colocava na fronteira entre o dist�rbio e a normalidade.
Philip Benson explica que, do ponto de vista cl�nico, a pesquisa ainda n�o traz benef�cios diretos para os pacientes. Mas ele destaca a import�ncia dos resultados para detectar pessoas em risco. Acredita-se que a esquizofrenia tem componentes heredit�rios. “Uma vez que entendermos melhor como s�o os padr�es espec�ficos de movimentos oculares de esquizofr�nicos e de pacientes que sofrem de outras doen�as, como depress�o e bipolaridade, poderemos ajudar os m�dicos a testar as pessoas que est�o em risco e desenvolver planos de tratamento para elas”, afirma.
Apoio
O psic�logo Elizeu Coutinho de Macedo, coordenador do Programa de P�s-Gradua��o em Dist�rbios do Desenvolvimento da Universidade Presbiteriana Mackenzie, concorda que um marcador para a esquizofrenia poder� ser importante para o diagn�stico precoce. “Se tenho um paciente esquizofr�nico, ser� que o filho dele tem probabilidade de desenvolver o surto? O diagn�stico precoce ajuda no acompanhamento, desde a informa��o aos trabalhos de suporte”, afirma.
Em 2007, Macedo publicou um artigo no qual tamb�m analisa os movimentos oculares de esquizofr�nicos. O trabalho, pioneiro no Brasil, replicou m�todos utilizados em estudos estrangeiros. Um dos interesses do psic�logo no padr�o de explora��o visual dos esquizofr�nicos � que avalia��es importantes da psicologia, chamadas testes projetivos, podem ser mal interpretadas no caso desses pacientes. Nos testes, o psic�logo apresenta pranchas com imagens e a pessoa deve dizer o que v� ali. Embora n�o exista resposta certa ou errada, o terapeuta consegue analisar a interpreta��o e, assim, avaliar o paciente. “Como, na esquizofrenia, o padr�o visual � reduzido, pode-se chegar a uma conclus�o errada, como dizer que a pessoa tem problemas de mem�ria”, explica.
O psic�logo ressalta, entretanto, que o autismo e alguns dist�rbios mentais, como depress�o e transtorno bipolar, tamb�m fazem com que os portadores apresentem movimentos oculares diferentes. “Seria interessante incluir em pesquisas outros grupos de pacientes”, afirma. Essa tamb�m � a opini�o de John H. Krystal, psiquiatra da Universidade de Yale e editor da Biological Psychiatry: “� encorajador ver o alto grau de sensibilidade desse modelo de diagn�stico. Ser� interessante constatar se essa abordagem permitir� aos investigadores cl�nicos distinguir pessoas com esquizofrenia daqueles indiv�duos com outros dist�rbios psiqui�tricos”. Philip Benson garante que j� est� fazendo isso: “Temos evid�ncias ainda n�o publicadas de que nossos testes tamb�m poder�o identificar o transtorno bipolar”.