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Estado de Minas

Pesquisa com ratos explica as vis�es de quem quase morreu

Segundo pesquisa, o c�rebro de ratos que sofrem parada cardiorrespirat�ria continua ativo por at� 30 segundos. A constata��o pode ajudar a explicar por que alguns pacientes t�m vis�es enquanto s�o reanimados por m�dicos


postado em 20/08/2013 09:55 / atualizado em 20/08/2013 09:55

(foto: Valdo Virgo/EM/D.A PRESS)
(foto: Valdo Virgo/EM/D.A PRESS)

“Ningu�m jamais voltou daquele pa�s”, disse Hamlet, referindo-se � morte. O personagem de Shakespeare, contudo, foi desmentido pelo pr�prio pai, que retornou do al�m para revelar ter sido assassinado. Fora da fic��o, existem relatos de pessoas que garantem ter carimbado o passaporte nesse territ�rio desconhecido. S�o indiv�duos que, declarados mortos, voltam � vida com a lembran�a de transitar por uma dimens�o diferente de tudo conhecido. Muitas vezes, conseguem ver, do “outro lado”, m�dicos, familiares e o pr�prio corpo jazendo no leito.
As chamadas experi�ncias de quase morte (EQM) permanecem um tabu para a ci�ncia porque desafiam a no��o de que a consci�ncia e a mente n�o passam de produtos da qu�mica cerebral. Al�m disso, colocam em d�vida o entendimento de que a vida se extingue no �ltimo suspiro. A partir da d�cada de 1960, por�m, quando os m�todos modernos de reanima��o cardiopulmonar entraram para a rotina das emerg�ncias hospitalares, os relatos de pacientes n�o puderam ser ignorados.

Com mais gente ressuscitada, as hist�rias deixaram de ser casos isolados contados entre cochichos e passaram a ser ouvidas nos consult�rios m�dicos. De acordo com um estudo da Universidade de Michigan, aproximadamente 20% dos sobreviventes de parada card�aca nos Estados Unidos afirmam ter visto a luz no fim do t�nel, antes de serem acordados. Isso, no Ocidente. O antrop�logo Darrell Champlin, professor da Universidade Santa Cec�lia que estuda o tema h� duas d�cadas, explica que experi�ncias de quase morte est�o presentes em todas as culturas. “N�o conhe�o um lugar que n�o tenha sua colet�nea de relatos. O que muda � a aceita��o que se tem do fen�meno, at� porque a morte, em locais como o Tibete, por exemplo, faz parte de um processo totalmente natural. A vis�o � muito diferente das culturas em que a ci�ncia � materialista”, opina.

Em busca de respostas para o fen�meno, alguns cientistas tentam encontrar explica��es fisiol�gicas que justifiquem a sensa��o de ter estado em um lugar semelhante �s descri��es do Para�so, incluindo a presen�a de parentes mortos e seres luminosos e flutuantes. De uma coisa eles est�o certos: os pacientes n�o est�o mentindo nem aumentando. “As experi�ncias de quase morte s�o reais para aqueles que sobreviveram”, garante Jimo Borjigin, professora de fisiologia molecular e neurologia da Universidade de Michigan.

Oxigena��o
Principal autora de um estudo publicado pela Pnas, revista da Academia Nacional de Ci�ncia dos EUA, Borjigin n�o est� dizendo, contudo, que h� vida al�m da morte. Pelo contr�rio, a pesquisadora sustenta que o fen�meno pode ser explicado por rea��es fisiol�gicas. Antes de ser uma prova de que o c�u existe, essa seria uma consequ�ncia natural da falta de oxigena��o e a��car no sangue, eventos que ocorrem no caso da parada cardiorrespirat�ria. “N�s sabemos que o c�rebro pode ser estimulado para produzir n�veis mais elevados de atividade quando as taxas de oxig�nio e de glicose est�o diminuindo rapidamente. Isso sugere que a nossa consci�ncia normal pode ter algo a ver com n�veis de flutua��o desses dois elementos”, acredita Borjigin.

Na recente pesquisa, o c�rebro de ratos foi monitorado por um eletroencefalograma no momento da morte por parada card�aca, induzida pelos cientistas. O exame confirmou que a atividade dos neur�nios continua, mesmo depois de o cora��o parar de bater e de o oxig�nio deixar de circular. Essa n�o �, propriamente, uma novidade. Especialista em EQM, o psiquiatra Alexander Moreira-Almeida, coordenador do N�cleo de Pesquisa em Espiritualidade e Sa�de da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), conta que estudos anteriores j� mostravam que isso ocorria entre 10 e 20 segundos ap�s a morte. Agora, os pesquisadores verificaram a atividade por at� meio minuto. O intervalo foi considerado surpreendente pelo anestesista George Mashour, professor de neurocirurgia da Universidade de Michigan e coautor do novo estudo. “As assinaturas el�tricas da consci�ncia excederam os n�veis detectados no estado de alerta”, afirmou, em um comunicado.

De acordo com Jimo Borjigin, n�o se trata apenas de um reflexo — os animais estariam, de fato, conscientes. Ela diz que h� pelo menos quatro linhas de evid�ncia de que os neur�nios n�o se moviam a esmo, mas obedeciam a padr�es de atividade previamente associados a esse estado de percep��o. Isso � medido pelas oscila��es nas diferentes faixas de ondas eletromagn�ticas, detectadas pelo encefalograma, sendo que atividades na frequ�ncia gama, observadas na pesquisa, est�o associadas ao n�vel de consci�ncia. Para Borjigin, essa rea��o seria explicada pelo instinto de sobreviv�ncia. “Talvez, os altos n�veis de atividade cerebral consciente reflitam a �ltima tentativa do c�rebro de salvar a si mesmo. A experi�ncia de quase morte pode ser simplesmente um subproduto n�o intencional desse esfor�o”, defende.

Complexidade
Alexander Moreira-Almeida reconhece que o estudo � interessante, principalmente pela detec��o de atividade na frequ�ncia gama, por�m afirma que a pesquisa nem chega perto de explicar a experi�ncia de quase morte. “� muito comum pesquisadores falarem e escreverem sobre EQM sem necessariamente conhecerem a fundo o assunto”, afirma o psiquiatra, um dos autores do livro Exploring frontiers of the mind-brain relationship, que come�a a ser publicado em portugu�s em vers�es resumidas e atualizadas na Revista de Psiquiatria Cl�nica, da USP. “Querer relacionar os 30 segundos de atividade cerebral dos ratos com experi�ncia de quase morte em humanos � extrapolar muito. Como comparar a vida mental de um humano � de um rato?”, questiona.

Para ele, n�o se pode procurar responder a um fen�meno t�o complexo em apenas um experimento cient�fico. O psiquiatra lembra que h� relatos de percep��es ver�dicas, como pessoas que descrevem coisas que de fato ocorreram no ambiente de morte, mesmo passados mais de 30 segundos da parada card�aca. A falta de oxigena��o poderia explicar alucina��es na forma de t�nel, luz e pessoas que j� morreram, mas n�o a vis�o de objetos e cenas reais, como os m�dicos fazendo a reanima��o.

O antrop�logo Darrell Champlin concorda. “A compreens�o dessa fenomenologia de EQM depende do entendimento n�o apenas dela em isolamento. N�o � justo aceitar a explica��o e a nega��o de um cientista que, antes de mais nada, quer descartar de pronto at� mesmo a menor possibilidade da realidade da fenomenologia, devido ao seu dogma de materialismo e, em segundo plano, desconhece por completo o enorme corpo de conhecimento que existe sobre esse campo”, argumenta. “Nesse �ltimo caso, seria o mesmo que pedir que um construtor explique a composi��o qu�mica do tijolo ou que um m�dico verse sobre t�cnicas de constru��o. Em suma, certamente n�o basta dizer que ‘deve ser um processo biol�gico ainda desconhecido’ sem sequer analisar o que j� se sabe.”

A principal autora do artigo publicado na Pnas, contudo, garante que n�o tem a pretens�o de esgotar o assunto. “O estudo, realizado com animais, � o primeiro a abordar o que acontece no estado neurofisiol�gico do c�rebro em processo de morte. Ele servir� de base para estudos futuros com humanos que investiguem as experi�ncias mentais que ocorrem nesse momento, incluindo ver a luz no fim do t�nel.”


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