Com a estrat�gia de liberar gradativamente pequenas quantidades de horm�nios j� em contato com o organismo feminino, o anel vaginal se tornou uma alternativa para mulheres que n�o se adaptam � p�lula anticoncepcional ou a m�todos mais invasivos para evitar a gravidez, como o dispositivo intrauterino (DIU) e os implantes epid�rmicos. Uma nova proposta promete turbinar a t�tica com um combo protetor contra infec��es pelo v�rus da imunodefici�ncia humana (HIV) e da herpes simples 2 (HSV-2). A inten��o � manter a fun��o contraceptiva do dispositivo, conferindo a ele uma a��o tripla. Especialistas alertam, por�m, que esse dispositivo, se comercializado, n�o � capaz de substituir o uso da camisinha, que evita o cont�gio de uma gama maior de doen�as sexualmente transmiss�veis (DSTs).

O trabalho � liderado por pesquisadores da Conrad — uma organiza��o voltada para a pesquisa cient�fica e sem fins lucrativos ligada ao Departamento de Obstetr�cia e Ginecologia da Escola de Medicina de Eastern Virginia, nos Estados Unidos. O grupo � especializado em tecnologias de preven��o multifuncional (MPTs, em ingl�s), isto �, dispositivos de barreira usados com um gel ou um filme que t�m uma combina��o de anticoncepcionais, microbicidas e ou propriedades de anti-infec��es sexualmente transmiss�veis. O composto, portanto, atua com diferentes mecanismos que agem para evitar a gravidez, o HIV e ou outras DSTs.

Esse � o caso do anel vaginal apresentado ontem na Reuni�o Anual e Exposi��o da Associa��o Americana de Cientistas Farmac�uticos (AAPS) de 2013, em San Antonio, no estado norte-americano do Texas. A subst�ncia usada nos an�is intravaginais � composta por levonorgestrel (contraceptivo) e tenofovir (antirretroviral e microbicida). Os experimentos consistiram na libera��o desse composto em c�lulas humanas in vitro, al�m de estudos farmacocin�ticos em coelhos e ovelhas durante tr�s meses — per�odo m�ximo de perman�ncia do dispositivo no organismo.
Os n�veis de droga absorvidos foram comparados aos observados em outros estudos com o gel de tenofovir. Os dados coletados mostraram que as taxas de tenofovir entregues no tecido alvo a partir do anel intravaginal s�o similares ou superiores ao que foi constatado nos experimentos com o gel. A libera��o do agente contraceptivo tamb�m foi consistente com os n�veis esperados e j� observados como eficientes para a contracep��o.

“At� agora, o tenofovir � o �nico microbicida que foi comprovadamente eficaz na redu��o da infec��o pelo HIV quando usado topicamente. � importante desenvolver uma variedade de mecanismos de entrega dele a fim de atender as necessidades de diferentes mulheres”, diz Meredith Clark, pesquisadora principal do projeto. “O anel � o primeiro dispositivo a ser testado em mulheres que vai oferecer contracep��o, bem como a preven��o do HIV e herpes.” Clark divulgou os dados pr�-cl�nicos que precedem os testes em humanos, previstos para o pr�ximo ano. A especialista destaca ainda o potencial do dispositivo para permanecer no corpo por um per�odo muito maior que o anel convencional: 90 dias em vez de 30.

Riscos permanecem

A inten��o � de que a ader�ncia ao tratamento preventivo aumente com a aprova��o do novo m�todo. De acordo com especialistas, o uso do gel microbicida tem sido pouco aceito pelas mulheres devido � forma de entrega do composto. O ginecologista do Hospital S�rio-Liban�s Alexandre Pupo Nogueira considera que os cientistas uniram duas estrat�gias de prote��o muito interessantes, contracep��o e anti-infec��o, mas, segundo ele, � preciso refor�ar que o tenofovir n�o � capaz de eliminar o risco de cont�gio. “Com o anel, existem a contracep��o e alguma preven��o contra o HIV e o herpes, mas um benef�cio que n�o � 100% e isso os pr�prios pesquisadores colocam.”

Nogueira ressalta ainda que, ao pensar em DSTs, n�o se pode considerar somente o HIV e o herpes. “Temos outras DSTs, como a hepatite B e a gonorreia. H� doen�as que s�o menos importantes do ponto de vista social, mas que t�m bastante signific�ncia para o paciente. A clam�dia, por exemplo, pode obstruir a trompa e levar � esterilidade.” O especialista considera que, enquanto n�o houver um m�todo que seja t�o eficaz quanto a camisinha na preven��o de todas as DSTs, estrat�gias como a proposta pela Conrad precisam ser tratadas como uma prote��o extra.

Para o ginecologista, ainda � prematuro considerar a aplica��o em humanos, j� que os testes ainda n�o foram iniciados. O processo de testes cl�nicos � longo e ele estima que s�o necess�rios mais de cinco anos para que o anel de tripla prote��o chegue �s prateleiras. O que precisa ser avaliado pelos cientistas, segundo Nogueira, � se o tenofovir consegue o mesmo n�vel de prote��o do gel com o anel intravaginal. “Ainda assim, vejo com muito bons olhos a busca por alternativas de preven��o � infec��o pelo HIV. � a medicina e a ci�ncia funcionando na sua forma mais pura, ou seja, devagar, vamos ganhando conhecimento que � aplicado no dia a dia e desenvolvendo m�todos cada vez melhores para prevenir, identificar e tratar as doen�as.”

Al�m do anel intravaginal, a Conrad testar� um tipo de diafragma apenas com o gel tenofovir. O m�todo pode ser mais favor�vel � utiliza��o da subst�ncia. O diafragma tamb�m � um anel flex�vel, mas recoberto por uma pel�cula de borracha ou silicone, e colocado pela mulher dentro da vagina at� cinco horas antes da rela��o sexual. Utilizados em conjunto, o diafragma e o gel oferecem contracep��o e potencial para reduzir infec��es por HIV e HSV-2, como um sistema de fornecimento por demanda de prote��o imediata. Os dispositivos multifuncionais tamb�m ser�o apresentados, nesta semana, na Confer�ncia Internacional sobre Planejamento Familiar, em Addis Abeba, na Eti�pia


Palavra de especialista

Alberto Chebabo, infectologista do Laborat�rio Exame e do Hospital Universit�rio Clementino Fraga Filho, da Universidade do Rio de Janeiro

Autonomia feminina


“Na realidade, com essa estrat�gia, voc� aumenta o interesse da mulher em usar o m�todo preventivo porque ele vai ter a fun��o de reduzir, ao mesmo tempo, as infec��es do HIV e do herpes, al�m de contar com o efeito contraceptivo. Obviamente n�o substitui o preservativo. Devemos considerar um fator de autonomia feminina importante. Colocar o anel parte de uma decis�o da mulher, enquanto o preservativo � uma decis�o do homem. A frente de trabalho que desenvolve novas tecnologias para preven��o visa deter a epidemia. Com isso, seremos capazes de diminuir a transmiss�o a ponto que consigamos estabilizar o n�mero de pacientes com o HIV, trat�-los adequadamente e reduzir a transmiss�o.”