Roberta Machado

A equipe selecionou obras que est�o � disposi��o da popula��o ao ar livre. Como essas pe�as est�o sujeitas � a��o do tempo de forma mais acelerada que as esculturas de cole��es particulares, o registro detalhado ajuda a preservar a apar�ncia original dos trabalhos. Os pesquisadores foram a duas cidades mineiras e colheram as imagens no Adro do Santu�rio do Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas, e em tr�s igrejas de Outro Preto: a da Ordem Terceira de S�o Francisco de Assis, a da Nossa Senhora do Carmo, e a de Nossa Senhora das Merc�s e Miseric�rdia.
A miss�o art�stico-tecnol�gica teve in�cio em junho do ano passado. Armados de um esc�ner tridimensional de alta precis�o, os especialistas foram capazes de digitalizar est�tuas e adornos dos templos sem remov�-los do lugar nem isolar a �rea de trabalho. O servi�o foi feito assim mesmo, em meio aos turistas, que tamb�m estavam interessados em fotografar as obras e procuravam v�-las de perto. “A luminosidade era um problema porque o c�u nublado, com sol ou escurecendo, resultava em muitas varia��es no escaneamento. Tivemos de repetir muita das fotos”, lembra o coordenador do projeto e professor do ICMC, Jos� Fernando Rodrigues J�nior.
O equipamento de �ltima gera��o foi colocado em frente �s obras, de onde emitia um laser que varria toda a �rea em volta (veja infografia acima). Cada sali�ncia e cada curva das pe�as barrocas foram traduzidas em uma nuvem de pontos que servia como um enorme mapa volum�trico. “Para adquirir toda a informa��o, � necess�rio instalar a m�quina em posi��es diferentes”, explica R�mulo Assis, especialista cedido gratuitamente para esse projeto pela Leica Geosystems, a mesma empresa que tamb�m emprestou o esc�ner de alta resolu��o. “Para uma est�tua, umas tr�s posi��es s�o o suficiente”, estima Assis.
O trabalho resultou em um grande volume de dados brutos. Cada uma das obras escaneadas chegou a gerar mais de 2Gb de informa��es, que, apesar de detalhadas, pouco lembravam os modelos originais. A maior parte do servi�o veio depois, quando esses dados foram tratados, remodelando os objetos de acordo com os guias fornecidos pelo esc�ner. Com a ajuda de um computador, a equipe fez um detalhado jogo de ligue os pontos chamado triangula��o, criando as min�sculas superf�cies que mais tarde deram forma �s pe�as virtuais.
Durante essa etapa, Rodrigues J�nior e seus colegas tamb�m se encarregaram de fechar verdadeiros buracos deixados pela digitaliza��o. A ilumina��o ruim e a posi��o est�tica das pe�as esconderam alguns pontos. “O mais dif�cil foram os profetas”, conta o professor, referindo-se aos 12 profetas de Aleijadinho, que ficam no Santu�rio do Bom Jesus de Matosinhos. “Pode n�o parecer, mas algumas est�tuas s�o muito altas, ent�o tivemos de escane�-las 12 vezes, de diferentes �ngulos, para completar a informa��o. E, ainda assim, algumas partes ficaram faltando.”
Fidelidade Depois dessa etapa, o resultado era uma s�rie de representa��es muito parecidas �s obras originais, mas ainda de aspecto artificial. Quando d� volume aos objetos, o software de computador cria texturas de metal ou de pl�stico – que nada t�m a ver com o trabalho art�stico de Aleijadinho. Para deixar os adornos com apar�ncia mais realista, os pesquisadores do ICMC contaram com o apoio de uma empresa especializada em colora��o de imagens em tr�s dimens�es. Os peritos usaram fotografias das obras como refer�ncia e aplicaram os tons de pedra e de madeira na superf�cie virtual.
Por fim, a equipe precisou reduzir o tamanho dos arquivos sem sacrificar a resolu��o da imagem para tornar o resultado acess�vel a qualquer internauta. Essa fase, chamada decima��o, foi feita com um software livre. Os arquivos foram processados com um plugin especial que permite a intera��o 3D com os objetos virtuais.
Os modelos tridimensionais foram colocados no ar h� duas semanas, com v�deos que ajudam a ver a rota��o das pe�as. Os usu�rios tamb�m podem clicar nos objetos e gir�-los para v�-los de outros �ngulos, nem sempre vis�veis at� mesmo para quem interage com as obras reais. Embora n�o seja perfeita, a qualidade da reprodu��o � suficiente para agradar aos interessados pelo trabalho de Aleijadinho, e at� mesmo especialistas. “Obviamente, trata-se de montagem fotogr�fica. Nem o mais moderno sistema ser� a mesma coisa que ver a obra in loco”, diz Marcelo Coimbra, curador da exposi��o Ber�o do barroco brasileiro e seu apogeu com o Aleijadinho, atualmente em cartaz em Bras�lia. “Mas acho que acrescenta mais do que se perde. Em rela��o a passear em 3D, achei formid�ve”, elogia Coimbra.
Para a equipe do ICMC e para o curador, o projeto tem grande potencial educativo. O ambiente virtual pode gerar mais interesse nos jovens pela arte barroca do que uma simples ilustra��o em um livro did�tico. “� importante dar essa oportunidade como um primeiro acesso. Principalmente ao estudante, que ser� estimulado a conhecer melhor a obra”, ressalta. A qualidade da reprodu��o tridimensional seria suficiente tamb�m para outros projetos, como a produ��o de c�pias dos adornos feitas em uma impressora 3D.
A iniciativa � apoiada pela Comiss�o de Cultura e Extens�o do ICMC, pela Pr�-Reitoria de Cultura e Extens�o da USP e pelo Museu de Ci�ncias da universidade, que j� manifestou o desejo de desenvolver uma exposi��o virtual a partir desse trabalho. O ICMC tamb�m deve continuar a realizar o trabalho de digitaliza��o do patrim�nio hist�rico brasileiro, embora ainda n�o tenha revelado que outras obras ganhar�o modelos virtuais.
SAIBA MAIS
Um artista misterioso
Antonio Francisco Lisboa (1738-1814), mais conhecido como Aleijadinho, tem uma biografia marcada por lacunas e d�vidas. Muito n�o se sabe sobre esse artista e arquiteto brasileiro, mas a vers�o mais conhecida de sua hist�ria d� conta de que ele era um mesti�o, filho do arquiteto e mestre de obras portugu�s Manuel Francisco Lisboa e de uma de suas escravas. Estima-se que ele tenha sido acometido, por volta dos 40 anos, por uma doen�a degenerativa (hansen�ase, porfiria e poliomelite s�o algumas das poss�veis condi��es), o que teria rendido a ele o famoso apelido. Qualquer que fosse a condi��o de sa�de do mestre escultor, � sabido que a limita��o o obrigava a trabalhar com ferramentas amarradas �s m�os. Seu estilo inovador tornou-se um expoente da arte colonial no Brasil e at� hoje � admirado pelo conjunto de belas obras sacras em madeira e pedra-sab�o.
Acesse e visite
» As obras digitalizadas de Aleijadinho podem ser vistas no site www.aleijadinho3d.icmc.usp.br.
» Para quem for � capital federal, uma dica � visitar a exposi��o Ber�o do barroco brasileiro e seu apogeu com o Aleijadinho, em cartaz na Caixa Cultural Bras�lia at� dia 11. Visita��es de ter�a-feira a domingo, das 9h �s 21h.

