
Bras�lia – Por volta de 60 mil e 40 mil anos atr�s, o ber�o da humanidade come�ou a parecer pequeno para o Homo sapiens. H� muito, seus ancestrais tinham se espalhado pelo globo, mas a esp�cie do homem moderno como se conhece hoje continuava estabelecida na �frica. Naquele momento, por�m, se iniciou um movimento que mudaria para sempre o curso da hist�ria.
Estava na hora de dar adeus � savana para iniciar uma jornada rumo a outras paisagens. A essas alturas, diversas esp�cies humanas habitavam a Eur�sia. Elas eram descendentes dos primeiros homin�deos que se aventuraram fora do continente africano e, por mil�nios, viveram sem perturba��es em seus nichos. A chegada do Homo sapiens transformaria tudo isso – que o digam os neandertais, extintos depois do contato com seus primos pr�ximos.
O problema � que faltam f�sseis para esclarecer diversos pontos desse per�odo. Inclusive, como e onde se deu o primeiro contato entre homens modernos e neandertais, que, de acordo com pesquisas gen�ticas recentes, trocaram material gen�tico. Agora, a descoberta de um cr�nio parcial onde hoje � Israel poder� ajudar a compreender melhor o que se passou naquele lugar, naquele momento.
“A expans�o do homem moderno africano para a Eur�sia � um epis�dio-chave para a hist�ria da humanidade, porque, ao chegar, ele substituiu todas as popula��es existentes”, afirma Israel Hershkovitz, pesquisador do Departamento de Antropologia e Anatomia da Universidade de Tel Aviv. Durante quatro anos, uma equipe de cientistas chefiados por ele escavou em um local considerado um verdadeiro celeiro de f�sseis, a Caverna de Manot. L�, encontraram o cr�nio parcial de um indiv�duo que viveu h� 55 mil anos. A descoberta foi descrita na edi��o on-line da revista Nature desta semana.
De acordo com Hershkovitz, os tra�os anat�micos s�o bastante sugestivos. O formato se assemelha ao dos africanos e dos europeus modernos, mas h� diferen�as quando se compara ao dos levantinos, os povos que moram nessa localidade, que engloba Israel, L�bano, S�ria, Jord�nia, Chipre, Iraque e Pen�nsula do Sinai. O paleont�logo afirma que, provavelmente, foi ali que o homem moderno e o neandertal cruzaram pela primeira vez, um fato que teve como consequ�ncia a presen�a de 4% do DNA dessa esp�cie extinta no genoma da popula��o europeia moderna.
“Pela primeira vez, temos evid�ncias f�sicas de que homens modernos e neandertais habitaram o mesmo lugar ao mesmo tempo, algo que j� se suspeitava h� tempos”, afirma Bruce Latimer, paleont�logo da Universidade de Case Western que integrou a equipe de pesquisadores. Ele diz que o cr�nio parcial coloca em d�vida a hip�tese de que o intercurso aconteceu h� 45 mil anos, pois o cr�nio de Homo sapiens data de 55 mil anos, 10 mil antes de quando se acreditava ter ocorrido esse encontro inicial.
Colonizadores Segundo Latimer, f�sseis encontrados previamente indicam a presen�a de neandertais na regi�o do Levante naquela �poca. “Periodicamente, eles habitavam a regi�o onde fica a Caverna de Manot, que � quente e seca”, afirma. O local, recorda o paleont�logo, era a �nica rota por terra dispon�vel para humanos antigos se deslocarem da �frica ao Oriente M�dio, � �sia e � Europa. Por isso, tem sido alvo de diversos estudos arqueol�gicos conduzidos pelo Minist�rio de Antiguidades de Israel e pela Universidade de Tel Aviv, desde que foi descoberta pela equipe de Hershkovitz.
“Na verdade, nem sab�amos da exist�ncia dessa caverna, porque, com o tempo, ela foi ficando soterrada. Entramos nela por um pequeno buraco ainda vis�vel e nos deparamos com um pequeno cr�nio parcial”, recorda o paleont�logo. “Essa caverna foi habitada por homens pr�-hist�ricos por milhares e milhares de anos. � um local incr�vel e muito bonito”, descreve Hershkovitz.
De acordo com ele, apesar de a caverna ter fornecido abrigo a popula��es antigas por tanto tempo, n�o h� d�vidas de que a caveira encontrada l� pertence a um homem moderno, e n�o a um homin�deo primitivo, como poderia se supor. “N�o h� nada nela que seja diferente do homem moderno, apenas na parte de tr�s h� uma forma��o �ssea t�pica de homin�deos mais antigos. Ent�o, ela apresenta um mix de caracter�sticas. Para n�s, isso significa que se trata de um homem moderno, por�m mais antigo do que se imaginava encontrar naquela regi�o”, diz. Os testes de carbono indicaram a idade de 55 mil anos.
A hip�tese � de que esse indiv�duo adulto, cujo sexo n�o foi poss�vel determinar, tenha feito parte da primeira onda migrat�ria do Homo sapiens para fora da �frica. “Ele � o ancestral dos colonizadores europeus. Morfologicamente e anatomicamente, o cr�nio � muito semelhante aos dos primeiros homens do paleol�tico europeu, o que implica que ele integraria a popula��o paleol�tica ancestral no continente”, define Hershkovitz.
Vizinhos Para ele, o encontro desses primeiros colonizadores com os neandertais que j� habitavam a Europa naquele momento � extremamente prov�vel. A Caverna de Manot fica a menos de 50 quil�metros de outra em que j� foram escavados diversos f�sseis do homem de Neandertal. “Eles estavam vivendo lado a lado por milhares e milhares de anos”, lembra o antrop�logo. O cientista israelense destaca, inclusive, que o indiv�duo encontrado em Manot poderia ser um h�brido, resultante do cruzamento entre as esp�cies.
Contudo, essa � uma hip�tese dif�cil de constatar, pois seria necess�rio coletar o DNA do cr�nio para tentar encontrar tra�os neandertais nele e h� pouco material dispon�vel. “As chances de conseguirmos coletar uma amostra de DNA nessa caveira s�o muito baixas. A regi�o em que ela se encontrava n�o � boa para a preserva��o devido a aspectos clim�ticos. Mas n�o vamos desistir, porque, ao longo do tempo, a tecnologia est� se aprimorando. Ent�o, pode ser que, nos pr�ximos anos, isso seja poss�vel”, palpita.