
Bras�lia – A luz do sol s� est� presente durante o dia, e o vento pode perder a for�a. Mas h� uma fonte de energia renov�vel em potencial que pode ser usada em qualquer lugar, a qualquer hora: a umidade do ar. Cientistas norte-americanos descobriram uma forma de gerar for�a a partir da evapora��o natural da �gua, usando apenas um recipiente do l�quido ou simplesmente papel molhado. A t�cnica, usada para mover um pequeno carrinho de brinquedo e acender uma l�mpada de LED, � relativamente barata e foi descrita na revista Nature Communications.
O m�todo � baseado em um sistema que os cientistas chamam de m�sculos artificiais movidos a hidroscopia (Hydra, na sigla em ingl�s), que tira proveito da capacidade de alguns micro-organismos de absorver umidade do ambiente. Quando entra num tipo de estado dormente, a bact�ria Bacillus subtilis assume o formato de um esporo, que � muito sens�vel � presen�a de �gua. Se colocados em um ambiente �mido, esses esporos rapidamente acumulam o l�quido em nanocavidades e seu volume aumenta em at� 6%.
Na nova t�cnica, esses seres min�sculos s�o colocados estrategicamente sobre a tira curva de um pol�mero com apenas oito nan�metros de espessura. Gra�as aos micro-organismos, a tira pl�stica sofre uma grande press�o na presen�a de umidade e acaba mudando de forma. Colocando-se v�rias dessas tiras em sequ�ncia, � poss�vel criar o m�sculo artificial que pode ser contra�do ou relaxado com a simples aproxima��o de um copo d’�gua, sem o uso de qualquer combust�vel. Uma simples mudan�a da umidade de 30% para 80% � suficiente para quadruplicar o comprimento das tiras de pl�stico, e at� mesmo levantar objetos com massa at� 50 vezes superior � dos pr�prios m�sculos.
A din�mica foi testada em alguns mecanismos que tiram proveito da propriedade absorvente dos esporos. O potencial do sistema Hydra pode ser visto em um pequeno moinho de pl�stico, cujas p�s s�o feitas do pol�mero encurvado coberto dos micro-organismos. Enquanto metade dos esporos fica pr�xima a um papel toalha molhado, a outra metade fica exposta ao ar. A resposta dos m�sculos artificiais � umidade do papel faz com que eles se abram, criando uma leve diferen�a de equil�brio do sistema, e fazendo a roda girar. Isso coloca os outros esporos pr�ximos ao papel molhado, que acabam reagindo e mantendo um ciclo que mant�m o moinho se movendo enquanto a toalha estiver �mida. Quando combinado a uma estrutura com rodas, o sistema foi capaz de mover um pequeno carro de pl�stico de 100g.
Cada tira usa uma camada muito fina de bact�ria, de apenas cinco esporos de espessura. Esse design torna os m�sculos artificiais mais sens�veis � mudan�a de umidade e pode reduzir o tempo de resposta do mecanismo para at� tr�s segundos. Os pesquisadores ainda usaram o pol�mero coberto de bact�rias para produzir um pequeno gerador que pode acender uma l�mpadade LED e um sistema de persianas que se abrem e se fecham, controlando a evapora��o de uma tigela cheia d’�gua. Nos experimentos, uma superf�cie de 8cm² de �gua produziu uma m�dia de 2 microwatts de energia, com picos de at� 60 microwatts.
Ineditismo
Esse � um dos primeiros experimentos a mostrar que a umidade pode ser usada para gerar energia. “A evapora��o est� indiretamente envolvida em v�rios processos de energia. Usinas usam a evapora��o para resfriamento, o que aumenta a efici�ncia. No entanto, at� onde eu sei, n�o houve tentativas deliberadas na comunidade cient�fica para dominar a evapora��o no ambiente”, acredita Ozgur Sahin, pesquisador da Universidade de Columbia e principal autor do trabalho.
Por ser bastante resistente e benigna � sa�de, essa bact�ria j� � usada h� muito tempo pelos cientistas como um modelo para estudar o comportamento de c�lulas. Os esporos s�o a forma mais dur�vel desse micro-organismo. “A esporula��o � a situa��o em que essa bact�ria se encontra em um ambiente onde n�o h� tantos nutrientes. � a forma de ela se proteger. Quando ela faz isso, ela muda o divisomo da regi�o central para um dos polos da c�lula, a� ela fica protegida, quase dormente”, explica Jos� Roberto Tavares, professor de bioqu�mica na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).
Os esporos da Bacillus subtilis podem durar v�rios meses, uma situa��o ideal para a constru��o de um sistema gerador de energia. Bastaria manter o mecanismo pr�ximo � �gua para que ele funcionasse por um longo per�odo, sem a necessidade de reabastec�-lo. O processo j� foi testado pelos criadores por mais de 1 milh�o de ciclos, com praticamente nenhuma perda da performance. “Essa � uma bact�ria fant�stica, e seu uso como fonte de energia � bem promissor. Com certeza, h� a necessidade de mais estudos, mas � um potencial bem grande”, acredita Tavares.
Aplica��es
Os autores ressaltam que a t�cnica ainda � experimental, mas que ela poderia ser usada, futuramente, na cria��o de pr�teses, baterias, geradores ou at� mesmo roupas inteligentes feitas de tecidos que sejam movidos a suor. Os pesquisadores estimam que fitas feitas a partir de diferentes materiais podem gerar mais energia por �rea do que uma fazenda e�lica. A tecnologia poderia ser aplicada, ainda, em comunidades sem acesso � energia el�trica ou qualquer tipo de infraestrutura tradicional. “A umidade relativa � uma coisa boa para sistemas de energia baseados na evapora��o. Isso aumentaria a pot�ncia. No entanto, isso ainda funcionaria em S�o Paulo, por exemplo, ou em outros lugares �midos, com um bom custo/benef�cio”, compara Sahin.
A maior vantagem do sistema � que ele praticamente n�o consome a �gua e n�o exige que o l�quido passe por qualquer tipo de tratamento. “A evapora��o � t�o especial porque est� em toda parte. Temos 70% da superf�cie da terra coberta com �gua, e cada superf�cie est� evaporando para o ar”, ressalta, em um v�deo, Davis Goodnight, estudante do laborat�rio coordenado por Sahin na Universidade de Columbia. “Para mim, esse projeto abriu formas completamente novas de se pensar sobre a biologia. Voc� pode levar isso para muitas dire��es e pensar em v�rias ideias novas.”