CINEMA

Comédia italiana traz 'viagem' a Paris e lição sobre afeto

Paris vira cenário imaginário para trama sobre amor e reconciliação; filme estreia em BH nesta quinta (14/8)

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Quando um pai doente, à beira da morte, pede para os filhos realizarem o sonho há muito alimentado e incentivado pela família de viajar à Paris, o que fazer? A solução que os irmãos Cannistraci encontraram foi simular a viagem, aproveitando a cegueira quase total do velho para fingir que Toscana é a capital francesa.

O argumento de “Faz de conta que é Paris”, filme do italiano Leonardo Pieraccioni, que chega aos cinemas nesta quinta-feira (14/8), soa absurdo, mas de fato aconteceu.

Em 1982, os irmãos Michele e Gianni Bugli colocaram o pai moribundo dentro de uma van e passaram horas circulando pela fazenda da família sem nunca sair da propriedade. Contaram ao pai que estavam viajando e, em determinado momento, o levaram até uma colina, mostraram-lhe as luzes distantes da cidade, dizendo que era Paris.

Ninguém nunca soube se o pai percebeu a farsa e resolveu embarcar na fantasia como gesto de ternura com os filhos ou se realmente acreditou estar diante da Cidade Luz.

Leonardo Pieraccioni aproveitou este fato para construir uma história original, que, em linhas gerais, trata sobre perda e despedida.

“Trata-se daquele momento do ‘agora ou nunca’. Aquela decisão que salva e transforma um rancor antigo em algo menos absoluto”, diz o diretor ao Estado de Minas.

“É universal o fato de que muitos anos de incompreensão podem ser varridos por um abraço sincero que, mesmo que chegue no último minuto da partida, recoloca os jogadores em seus devidos lugares”, afirma.

No filme, Bernardo (papel de Pieraccioni), Giovanna (Chiara Francini) e Ivanna (Giulia Bevilacqua) são filhos do severo professor Arnaldo Cannistraci (Nino Frassica). Desde a morte da mãe, há cinco anos, eles não mantêm contato. As personalidades opostas e o distanciamento afetivo do pai ajudaram a aprofundar o afastamento.

Bernardo é dono de um campo equestre e vive para cuidar dos cavalos. Ivanna é arquiteta perfeccionista. Giovanna leva vida ociosa, cercada de relacionamentos passageiros com homens mais jovens. Já Arnaldo, insensível e ausente, acumula mágoas nos filhos.

Comédia italiana traz 'viagem' a Paris e

“Quando eu era criança e jogava futebol, você nunca foi. Quando Giovanna se acidentou com a motoneta, você não foi ao hospital. Aos nossos aniversários, você nunca foi. Nem nas peças da escola. Olhando por esse ponto de vista, você sempre foi muito coerente”, diz Bernardo ao pai num momento de sinceridade cortante.

O reencontro acontece depois que Arnaldo sofre um ataque cardíaco. No hospital, os filhos descobrem que ele tem poucos meses de vida e ouvem dele o pedido pela viagem a Paris.

A princípio resistentes, acabam cedendo. Ivanna aluga um motorhome e Bernardo aproveita o fim de semana em que o campo equestre estará fechado para circular com o pai e a irmã. “Vamos subir as colinas de Scandicci (região da Toscana), ‘ver Paris’ e voltar pra casa. Desejo realizado”, diz Ivanna, sem muita paciência.

Mentiras sinceras interessam

De maneira rápida e sutil, “Faz de conta que é Paris” até chega a discutir se a mentira pode ser justificada em determinados contextos. “O comportamento dos filhos, tão terno, faz com que seja um momento catártico também – sobretudo para o pai, que, assim, pode abraçá-los novamente. Ele os havia perdido, mas esta mentira com fim positivo faz com que os reencontre”, afirma o diretor.

O foco do longa, no entanto, não é a discussão a respeito de moral ou ética, e sim a viagem dos Cannistraci – não apenas a geográfica, mas também a simbólica.

A odisseia que a família enfrenta nas 12 horas em que ficam andando pelo campo equestre de Bernardo oferece cenas divertidas, como Arnaldo perguntando o motivo do cheiro de cavalos nunca acabar e a polícia sendo chamada pelo comportamento atípico dos filhos.

Mais do que ir de um ponto a outro, a viagem é a encenação de um desejo que nunca pôde ser concretizado. Ela não é só deslocamento no espaço, mas a tentativa de deslocar a vida da protagonista para um terreno mais doce, ainda que ilusório.

Ao deslocar a vida para o terreno ilusório, os personagens não estão apenas fugindo da realidade, mas também tentando encontrar uma forma de reconciliação emocional.

Esse espaço de fantasia é um terreno fértil onde antigas mágoas, distanciamentos e silêncios podem se dissolver, ainda que temporariamente. É a possibilidade de dialogar e se perdoar quando as durezas da vida são suavizadas.

A fantasia, afinal, é um bem preciosíssimo, defende o cineasta. “Deveríamos alimentá-la todos os dias com o espanto, a felicidade e o entusiasmo. Muitas vezes, a realidade é adoçada pela fantasia e, quando ela se transmite e se transforma também em ironia, é um salva-vidas excepcional”, afirmai.

Amadurecendo a ideia

Leonardo Pieraccioni conheceu a história dos irmãos Bugli há 12 anos. No entanto, “ainda não me parecia o momento certo para contá-la”, revela.

“Na Itália, ainda funcionavam os filmes puramente cômicos. Depois, um dia, pensei que seria bonito falar sobre a desagregação que muitas vezes existe nas famílias. Impressionava-me o fato de tantos irmãos ou irmãs não se falarem há anos e de não terem nem mesmo boa relação com os pais. Acredito que, na vida, sempre exista um momento para poder aplanar certas incompreensões, aqueles momentos em que se perdeu o contato”, conclui.

“FAZ DE CONTA QUE É PARIS”

(Itália, 2024, 90 min. De Leonardo Pieraccioni. Com Nino Frassica, Leonardo Pieraccioni, Chiara Francini e Giulia Bevilacqua. 16 anos). Em cartaz na Sala 1 do UNA Cine Belas Artes, às 18h50; e no Cineart Ponteio, às 18h50.

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