CINEMA

‘Légua tirana’ apresenta Luiz Gonzaga como o sertão em pessoa

Segunda cinebiografia do rei do baião mostra o artista como produto e tradução do ambiente geográfico e cultural da região do Nordeste onde nasceu e cresceu

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Em “Légua tirana”, nova cinebiografia de Luiz Gonzaga em cartaz nos cinemas, praticamente não se ouvem músicas do rei do baião. Há duas delas – “Vira e mexe”, o primeiro sucesso do artista, e a faixa que dá nome ao filme, já nos créditos. Em vez do ronco do fole, ouvem-se os sons que emergem da terra no sertão nordestino.


“A gente carregou esse filme de silêncio para que as pessoas pudessem escutar o silêncio do sertão – que não é silêncio, é o carro de boi que aparece de repente, um passarinho, o chocalho. Quando você para de ouvir o que está em primeiro plano, começa a ouvir todo o resto”, diz Diogo Fontes, codiretor da obra, ao lado de Marcos Carvalho. “A escuta do sertão está presente na obra de Gonzaga, é a matriz de sua criação.”


É justamente dessa matriz – no caso, a infância – que trata “Légua tirana”. A maior parte do filme acompanha o jovem Luiz Gonzaga, interpretado por Kayro Oliveira, e sua interação com os pais, amigos, desafetos, desconhecidos, a geografia e até figuras míticas do sertão. É a imaginação do ambiente que forjou o artista, nascido na cidade de Exu, no Sertão de Araripe, na divisa de Pernambuco com o Ceará.


O espaço e seus habitantes foram incluídos na pesquisa para o filme tanto quanto as fontes bibliográficas usuais de uma cinebiografia – pessoas que conviveram com Gonzaga, livros e pesquisadores. É uma visão do sertão de dentro para fora, diz Carvalho, ele próprio nascido na região, filho de agricultores de Serra Talhada, em Pernambuco. Fontes também é nordestino, de Alagoas.


Seleção do elenco

Boa parte da equipe do filme, ressalta o diretor, foi formada por moradores da região de Exu que passaram por um processo de formação e preparação de elenco. Isso inclui Wellington Lugo, que interpreta Luiz Gonzaga em sua versão adolescente.


“É um filme que nasce e brota do sertão”, afirma Carvalho. “Sou muito conectado com essa questão da natureza, de ver o sertão em sua exuberância – na geografia, na flora, na fauna… Isso é muito importante para a gente que nasce e que vive no sertão.”


Até por isso, Kayro Oliveira caiu como uma luva no papel. Descendente do povo indígena Anacé, de Caucaia, no Ceará, ele tinha apenas 11 anos quando filmou como o pequeno Gonzaga. Sanfoneiro que ganhou fama no programa “The voice” (Globo), o ator, hoje com 18 anos, é fã do rei do baião desde a infância.


O filme mira sua câmera para a relação do menino com o espaço – que nesse caso, não se trata de uma caatinga resumida à seca e ao sofrimento. “A miséria não é presente no filme como um atalho fácil”, afirma Diogo Fontes.


“Légua tirana” retrata cenas verídicas, como o trabalho de Gonzaga como ajudante de tropeiro, em que sofre maus-tratos, situações em que o racismo se fez presente e a paixão pela sanfona herdada do pai. Mas há também o que os diretores chamam de núcleo de encantados, ou personagens lúdicos que dão à obra ares de realismo mágico. Entre essas figuras está uma cigana interpretada por Cláudia Ohana e um cangaceiro vivido por Luiz Carlos Vasconcelos.


Ator repete papel de Gonzagão

Chambinho do Acordeon, que interpretou Gonzagão na cinebiografia anterior do artista, “De pai para filho” (2012), de Breno Silveira, volta ao papel em “Légua tirana”, desta vez para incorporar um rei do baião mais velho.


Chambinho conheceu Marcos Carvalho em Exu, no centenário de Gonzaga, quando o diretor fez a proposta a ele. “Confesso que fiquei com um pé atrás por já ter interpretado Luiz Gonzaga anteriormente”, diz. “Mas quando ele me mandou o roteiro, me apaixonei.”


O ator ficou seduzido pela ideia de ver na tela uma “criança vivendo no sertão e absorvendo aquele universo”, que inclui “bandas de pífanos, repentistas, emboladores, o coco, os aboios”. “Consegui visualizar um gênio da música popular brasileira nascendo no sertão de Pernambuco e levando consigo todas as suas origens. Tudo isso ele aplica no seu instrumento e na sua voz.”


Ele conta que apenas tranquilizou o jovem Kayro Oliveira nas filmagens, mas afirma que, para viver o artista, um mito nordestino, é preciso se esquecer um pouco do Gonzaga gênio. “A gente teve que se atrelar ao ser humano Luiz Gonzaga. O filho de Januário e dona Santana. Com toda sua vontade de vencer, mas todas as preocupações – de um matuto, sertanejo, nas brenhas do sertão. E no século passado.”


Há outra forma de dizer que o filme busca no humano os elementos que fizeram dele um mito – “Légua tirana” busca o que há de sertão no rei do baião. “Em época de São João, você olha para o céu e vê uma bandeira tremulando com a imagem de Luiz Gonzaga estampando o infinito”, diz Carvalho. “Nasci no sertão, sou apaixonado por ele. E Gonzaga o representa de uma forma poética, bonita – é a tradução do sertão.” (Lucas Brêda)


“LÉGUA TIRANA”
(Brasil, 2025, 1h54’). Direção: Marcos Carvalho e Diogo Fontes. Com Kayro Oliveira, Chambinho do Acordeon, Luiz Carlos Vasconcelos e Claudia Ohana. Classificação: 14 anos. Em cartaz no BH Shopping, Diamond Mall Diamond Mall, Pátio Savassi, Shopping Boulevard, Shopping Cidade, Via Shopping, Shopping Monte Carmo, Shopping Contagem, UNA Cine Belas Artes.

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