No palco e na plateia, estudantes da Escola Municipal Professora Maria Mazarello, em BH, dão exemplo de respeito aos colegas e dedicação aos estudos - (crédito: LEANDRO COURI/EM/D,A PRESS)
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Eles desenham, pintam, interpretam, cantam, dançam, brincam, numa conjugação permanente de todos os verbos que só a infância sabe acolher. Em tom de alegria, a energia preenche todos os espaços – do ambiente familiar, no aconchego do quarto, à coletividade da escola, entre colegas e professores. Neste Dia das Crianças, meninos e meninas mostram que a arte anda sempre ao lado e se torna aliada dos estudos para melhorar o aprendizado, fortalecer amizades, abrir caminhos para o futuro.
Na Escola Municipal Professora Maria Mazarello, no Bairro Nazaré, na Região Nordeste de Belo Horizonte, fica evidente o porquê de “criança e criatividade” serem frutos preciosos da mesma semente, de uma única raiz. Durante o ensaio da peça “Chapeuzinho Vermelho”, o elenco, na faixa de 8 anos e 9 anos, se reveza nos papéis com talento e ganha aplausos dos colegas maiores que acabavam de participar do coral da escola sob regência de Lucas Duarte Correa, monitor de informática e coral do Programa Escola Integrada.
“Fico treinando o tempo todo... em casa, no recreio e até na rua. Aí, não esqueço o texto”, revela sua técnica o aluno Raphael Fernandes Andrade, narrador da história da menina “que vai pela estrada afora, bem sozinha, levar os doces para a vovozinha”, conforme diz a música que acompanha gerações.
No ensaio da última quarta-feira, sob a direção do monitor de teatro do Escola Integrada, Geronídio Silvestre de Souza, a aluna Helena Cecília Oliveira de Moura interpretou a garotinha que, na floresta, dá de cara com o lobo: “É a primeira vez que faço teatro, gostei e quero fazer mais”.
O cenário da peça, a ser apresentada na última semana do mês, figura como espetáculo à parte no auditório-teatro da escola. Com painéis no formato de quadrinhos, foi criado pela aluna Beatriz Paulista, de 13, e pintado com tinta guache de forma coletiva: “Desenhei no papel e depois foi reproduzido no tecido de americano cru”.
Estão lá a menina, a vovozinha, a mãe de Chapeuzinho Vermelho, o lenhador, os caçadores, policiais e, para dar mais atualidade à adaptação da célebre fábula, uma repórter. Ainda falta ele, o lobo, que vem na pele de Daniel Corrêa Rodrigues. Fazendo cara de mau, mostra as garras e “ganha” a plateia. “Que medo!”, uma pré-adolescente comenta. Daniel está satisfeito com o papel de destaque, e seguindo a orientação do professor e diretor, repete a cena.
No ato seguinte, estão no palco Nicole Emanuelle Soares Lima, a “mamãezinha” de Chapeuzinho Vermelho, Victor Tayrone Santos Cruz, o lenhador, Helena Beatriz Rodrigues Alves, a repórter, e Júlia Rodrigues Ferreira, a vovozinha.
Na conversa nos bastidores, Nicole confessa que desde “bem pequena” gosta desse tipo de atividade, enquanto Victor Tayrone sorri quando o repórter “real” lembra que ele tem nome de um famoso ator de cinema (o norte-americano Tyrone Power – 1914-1958). “Eu sei, viu?”, brinca na resposta.
Helena Beatriz confessa que era um pouco tímida e, agora, se encontra mais à vontade no papel da repórter. Da turma, quem já decidiu a profissão é Júlia: “Quero ser artista”, avisa.
Atento aos movimentos dos alunos em cena, Geronídio vê muitos benefícios nas aulas de teatro, tanto para a vida escolar como familiar, além de auxiliar em outras matérias curriculares. “Melhora a leitura, a dicção, o comportamento, fortalece o companheirismo e auxilia nos trabalhos de pesquisa, entre outros aspectos”, ressalta o monitor de teatro do Programa Escola Integrada.
Fora das telas
Com cerca de 700 alunos, a Escola Municipal Professora Maria Mazarello funciona em dois turnos: na parte da manhã, há turmas de terceiro ciclo (sexto ao nono ano), de crianças de 11 anos a 15 anos; e, à tarde (primeiro e segundo ciclos), estudam os de 6 anos a 10 anos. Segundo a diretora Chênia Guimarães, o Programa Escola Integrada oferece, além do teatro e coral, oficinas de circo, dança, artesanato, maculelê, capoeira e outras modalidades culturais e esportivas.
“Hoje, um dos maiores desafios é tirar as crianças e adolescentes das telas (celular, computador, tablets, tevê e outros), nas quais ficam por muito tempo. Nas oficinas, têm oportunidade de experimentar outras atividades, e o resultado é bom, pois se envolvem”, afirma a diretora.
Ao lado, a vice-diretora Rubinita de Oliveira Araújo destaca a importância das oficinas no estímulo à criatividade. “A escola é um espelho da sociedade, e há limitações quanto ao uso do celular. Mas tudo é um processo, e deve haver harmonia com a tecnologia”, diz Rubinita.
Já o coordenador do Programa Escola Integrada, Helvio Feliciano Moreira, vê a arte como forma de educar, integrar e desenvolver o potencial dos alunos. “As crianças, de forma especial, participam com muito entusiasmo.”
As atividades do programa Escola Integrada ocorrem no contraturno, quando os estudantes participam de atividades escolares fora do horário regular das aulas. Percorrendo os vários ambientes é possível ver a marca criativa das turmas. Na biblioteca, por exemplo, pode ser admirado um trabalho em desenhos com várias recriações de Mona Lisa (obra de Leonardo Da Vinci – 1452-1519), incluindo uma versão indígena.
Nas mãos da aluna, a educação que transforma o hoje e o amanhã
LEANDRO COURI/EM/D,A PRESS
Música e livros
Moradora de Pará de Minas, na Região Centro-Oeste do estado, Ana Beatriz Fonseca Braga, de 9, fez do seu quarto de estudo um universo de cadernos, livros, música, canetinhas e lápis de cor, brinquedos e muita imaginação. É nesse espaço do apartamento que ela estuda, escreve, desenha, canta e se diverte. “É o ‘mundinho’ dela. Gosta de escrever cartas...eu mesmo guardo todas as que já recebi”, conta, abrindo uma caixa com as mensagens da filha, o bancário Ronaldo Pereira Braga, casado com Cristiane Resende da Fonseca, servidora pública.
Uma boneca sentada no canto do quarto, o fogão perto da geladeira, uma bola e muitas canetinhas para desenhar, um dos passatempos preferidos. “Tenho 84”, conta Ana Beatriz, pouco antes de jogar todas para o alto e recolhê-las instantes depois. Em seguida, mostra um caderno com vários desenhos e uma folha separada com as tintas em tom forte escorrendo de um pincel.
A arte faz parte do cotidiano da menina, filha única, sempre estimulada pelos pais. “Estuda música, canto e piano”, orgulha-se Ronaldo, acrescentando que ela já fez teste no SBT, em São Paulo.
Com toda a vivacidade da infância, Ana Beatriz não mostra o menor sinal de timidez. Após apresentar, na parte superior da estante, os livros do pai, e logo abaixo, os seus, a garota abre um armário e tira uma caixa. Dentro, há microfone. Momento de soltar a voz, apresentar seu talento e afinação. Logo em seguida, chega mais perto do pai e o abraça.
O cotidiano da pequena moradora de Pará de Minas é feito de criatividade, estudos e fé. Aos sábados, na companhia da mãe, vai à catequese no Santuário Nossa Senhora da Piedade, no Centro da cidade. No encontro com dezenas de outras crianças e os catequistas, ouve os ensinamentos sobre a religião católica, a vida de Jesus e os mandamentos sagrados.
E o futuro? Pensativa, Ana Beatriz avisa que a cada hora quer “ser uma coisa”, mas tem certeza de que gosta de cantar e interpretar. Olhando a movimentação dela pelo quarto, com tanta alegria, o repórter vê que não há necessidade de resposta imediata. Neste Dia das Crianças e nos próximos, ela tem todo o tempo do mundo.