A mineração voltou ao centro das atenções em audiência pública realizada nesta terça-feira (23/9) pela Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados. Conduzido pelo deputado Keniston Braga (MDB-PA), o debate discutiu o papel e os desafios dos órgãos responsáveis pela regulação e fiscalização do setor, em um momento de crescente pressão por novas regras, mais transparência e fortalecimento institucional.

Participaram representantes do Serviço Geológico do Brasil (SGB), da Agência Nacional de Mineração (ANM), do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) e da Associação Brasileira de Municípios Mineradores (Amig).

O tom mais contundente veio de Minas Gerais. Marco Antônio Lage, presidente da Amig e prefeito de Itabira, destacou a necessidade de uma política mineral robusta, capaz de conciliar exploração econômica e desenvolvimento local. “Nós precisamos conhecer o território, precisamos fiscalizar, regulamentar e, finalmente, garantir os legados para os territórios”, afirmou.

Ele criticou a histórica insuficiência dos repasses à ANM e alertou para o avanço da mineração clandestina e da sonegação fiscal por parte de empresas formais.

Em entrevista ao Estado de Minas, Marco Antônio reforçou três pontos defendidos pela Amig em carta aberta divulgada neste mês: a estruturação definitiva da ANM, criada em 2017, mas ainda sem condições adequadas de atuação; a atualização do Código de Mineração, em vigor desde 1967, para garantir maior autonomia fiscalizatória aos municípios; e o aumento da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM).

Hoje, em 3,5%, a alíquota é considerada insuficiente pelos municípios. “A mineração não paga ICMS nem imposto de exportação. A única receita é a CFEM, e ela não cobre as demandas de saúde, infraestrutura e desenvolvimento sustentável dos territórios minerados”, criticou.

O prefeito de Itabira também apontou desequilíbrios no comércio internacional, destacando que a China importa quase todo o minério brasileiro sem pagar impostos, enquanto exporta ao Brasil produtos industrializados de alto valor agregado. Para ele, o país deveria estimular a industrialização interna de minerais estratégicos e críticos, como as terras raras.

O diretor da ANM, Tasso Mendonça Júnior, reconheceu os gargalos e defendeu que o país precisa reduzir a burocracia e integrar melhor os diferentes órgãos ligados à mineração e ao meio ambiente. Segundo ele, a agência deve focar em “menos outorga e mais fiscalização”, confiando nos dados técnicos fornecidos pelas empresas, mas responsabilizando seus gestores em caso de irregularidades.

Mendonça também lembrou a limitação orçamentária da ANM. Apesar de o setor mineral movimentar bilhões, a agência trabalha com cerca de R$ 110 milhões por ano, valor, segundo ele, inferior ao contrato de aluguel de aeronaves do Ibama. Ele propôs que uma fatia maior da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM) seja destinada à ANM, com contratos de gestão que garantam retorno em arrecadação e eficiência.

Ele ressaltou que a mineração no Brasil ainda sofre com perda de informações e processos lentos. Como exemplo, citou modelos internacionais de maior integração entre Estado, empresas e universidades. “A sociedade brasileira precisa realmente discutir o que quer para o seu futuro”, disse. Mendonça defendeu ainda a criação de um sistema único de licenciamento ambiental, nos moldes do SUS, para evitar sobreposição de competências entre órgãos federais, estaduais e municipais.

Na audiência, Francisco Valdir Silveira, do SGB, ressaltou que o país conhece apenas 30% de seu território em escala adequada para investimentos. Ele criticou a perda de dados geológicos ao longo dos anos, apontou fragilidades na regulação e no acesso a informações estratégicas. Lembrando que, em países como Canadá e Austrália, as informações coletadas pelas empresas ficam sob domínio do Estado. “No Brasil, muitas vezes, esses dados se perderam pelo caminho”, disse.

Já Homero Melo Júnior, da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais, apresentou um panorama da produção mineral no país. Segundo ele, a atividade representa 4% do PIB nacional e 10% do PIB industrial, com 11,2 mil minas em operação e 266 mil empregos diretos. Só em 2024, a produção mineral movimentou R$ 279,2 bilhões, com destaque para o ferro, responsável por mais da metade do valor.

Ele comparou a mineração à agropecuária, afirmando que, embora ocupe uma área muito menor, gera retorno econômico proporcionalmente mais elevado. “Se a agropecuária já é considerada estratégica para o Brasil, precisamos reconhecer que a mineração, mesmo com impacto territorial reduzido, tem capacidade de gerar riquezas e transformar regiões inteiras“, afirmou.

Homero também detalhou o complexo ciclo de vida de um empreendimento mineral, que pode levar décadas desde a pesquisa até o início da lavra. Apontou gargalos regulatórios e defendeu melhorias na estrutura da Agência Nacional de Mineração (ANM), criada há oito anos. Entre os desafios citados estão a digitalização de processos, a necessidade de reforço no quadro de servidores e a criação de regras mais claras para reduzir a judicialização e estimular investimentos.

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