MPT está em alerta contra o assédio eleitoral no trabalho
Com mais de 800 denúncias em quatro anos, o estado é o segundo maior em registros de assédio eleitoral no país; órgão reforça campanhas e investigações
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A um ano da volta dos brasileiros às urnas, o Ministério Público do Trabalho (MPT) em Minas Gerais acende o alerta para o assédio eleitoral, tentativa de influenciar o voto de trabalhadores por meio de coação, intimidação ou ameaças. Desde 2022, quando as denúncias revelaram uma prática até então pouco discutida no mundo do trabalho, o órgão já recebeu 815 denúncias e abriu 561 investigações no estado, que está entre os líderes no ranking nacional de casos.
Neste ano, já são 65 denúncias e 51 investigações abertas, o que indica que, mesmo fora do período eleitoral, o tema continua presente no ambiente de trabalho.
Em todo o país, foram mais de 5 mil denúncias nos últimos quatro anos, com 4.225 investigações e mais de 700 termos de ajustamento de conduta (TACs) firmados entre o MPT e empregadores. Em Minas, foram cerca de 150 acordos desse tipo, que vão desde ameaças de demissão a pressões veladas sobre o voto de empregados.
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Os números mostram que o assédio eleitoral, antes visto como pontual, se consolidou como um problema estrutural, que mistura relações de poder e disputas políticas em um campo especialmente sensível.
Em entrevista exclusiva ao Estado de Minas, o procurador-chefe do MPT em Minas, Max Emiliano da Silva Sena, lembra que a eleição de 2022 foi um ponto de inflexão. “Até então, nós não tínhamos notícia da dimensão de assédio eleitoral que ouvimos naquele ano”, afirma.
Desde então, o MPT passou a integrar o Grupo Nacional de Combate ao Assédio Eleitoral, em articulação com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e ampliou ações de conscientização, firmando parcerias com instituições públicas, sindicatos e entidades empresariais.
“Na eleição de 2022, se o assédio eleitoral não fosse combatido, o processo democrático seria viciado, porque ele não refletiria a vontade genuína do eleitor”, explica Sena.
O órgão já recebeu denúncias de convites pelas redes sociais para eventos partidários, orientações sobre “em quem votar” vindas de gestores públicos e até demissões motivadas por divergências políticas.
“Às vezes, é uma ameaça velada, outras vezes é ostensiva. Um empresário leva um candidato à empresa, e o simples fato de o trabalhador estar ali, em posição subordinada, já o coloca sob pressão. Isso acaba gerando medo no trabalhador de perder o emprego se não votar conforme a vontade do patrão”, alerta.
Cidadania sob disputa
Max Emiliano ressalta que a relação de trabalho é, por natureza, uma relação de poder, e é justamente por isso que o MPT vê o combate ao assédio eleitoral como uma questão de cidadania.
“O trabalhador depende do emprego, mas o empregador detém o poder da dispensa. Hoje, salvo as garantias previstas na lei, se o empregador quiser, ele dispensa. O trabalhador acaba tendo a sua cidadania violada quando ele não pode votar naquele candidato que ele acha que é o melhor, segundo seus valores, seus projetos”, explica.
Para o procurador-chefe do MPT, o envolvimento do órgão no combate ao assédio eleitoral é uma forma de frear “o abuso do mais forte contra o mais fraco”. “Eu costumo dizer que tudo o que nos cerca é fruto do trabalho, e é justamente aí que o trabalhador é mais vulnerável. Se ele não tiver autonomia, não vai ser cidadão, vai ser cooptado, vai fazer o que o outro quer. E não é isso que a Constituição garante para todos nós. O direito do trabalho, ao garantir um mínimo de proteção, materializa a cidadania e fortalece a democracia”, pontua.
Às vésperas de mais uma disputa eleitoral, o MPT já prepara nova fase de atuação para fortalecer ações preventivas antes da disputa e evitar que o aumento da tensão política se traduza em novas violações.
Os resultados das ações judiciais reforçam a mudança de postura do MPT. Em Barbacena, no Campo das Vertentes, uma indústria de alimentos foi condenada a pagar R$ 1,1 milhão em danos morais coletivos após denúncias de coação política nas eleições de 2022. Em Lavras, no Sul de Minas, uma loja de móveis firmou acordo judicial e pagará R$ 40 mil pelo mesmo tipo de violação.
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Em nível nacional, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) lançou, em parceria com o MPT, uma cartilha nacional que orienta trabalhadores e empregadores sobre como identificar e denunciar a prática. Cidadãos que se sintam pressionados ou coagidos em razão de suas preferências políticas podem registrar denúncia diretamente no site do MPT, sob anonimato. Também é possível recorrer aos Tribunais Regionais do Trabalho, ao Ministério Público Federal, a sindicatos e à Ouvidoria do TRT da 3ª Região.