
N�o h� como condescender com o colapso do atendimento do INSS por alegada falta de funcion�rios. Foi descaso, isso � certo, e tamb�m prova factual do atraso da gest�o e da governan�a do setor p�blico frente a complexidade de demandas agravadas pelo longo tempo sem a aten��o devida. Falta de pujan�a econ�mica e sucateamento da gest�o do Estado n�o s�o acontecimentos que passam sem deixar sequelas.
Os programas de saneamento fiscal, iniciados no segundo mandato de Dilma Rousseff e aprofundados no governo Temer em diante, tinham de caminhar juntos com mudan�as estruturais conectadas aos avan�os tecnol�gicos. N�o s�o temas de economistas, mas de administradores com larga experi�ncia em gest�o p�blica, planejamento e tecnologia.
Sabia-se desde 2015, por exemplo, que a maior parte dos servidores federais se aproximava da idade de aposentaria, com o processo se estendendo at� 2022 ou pouco mais. O evento foi compreendido como oportunidade para reformar os sistemas de gest�o, investindo-se mais em processos e tecnologia da informa��o, com contrapartida de menos funcion�rios, mas com maior qualifica��o profissional.
E o que aconteceu? A fila de 1,3 milh�o de pessoas � espera de ter analisado o pedido de aposentadoria, de abono-maternidade, aux�lio-doen�a, assim como o an�ncio da contrata��o emergencial de 7 mil militares da reserva para refor�ar o atendimento do INSS, revela o que se fez. Ou seja: nada. E n�o por falta de avisos nem de estudos de consultorias prestigiadas indicando o que estava a caminho.
J� dissemos aqui que n�o h� mais margem para solu��es gradualistas contra problemas do s�culo passado, como os conflitos da partilha fiscal, a disfuncionalidade da governan�a p�blica, as desigualdades sociais e inter-regionais, a desmotiva��o do esp�rito empreendedor, a falta de coes�o social pelo objetivo de prosperidade individual e coletiva. Nada disso est� nem sequer formulado.
Foi-se o tempo em que bastavam a��es t�picas que tudo se acertava. As ideias pol�ticas e econ�micas ultrapassadas tiram o foco sobre o que � priorit�rio, enquanto as oportunidades passam ao largo. H� setores no governo atual e no Congresso, em especial na C�mara, com tal vis�o. Mas falta consenso, sobretudo, por onde come�ar. Talvez o setor privado devesse colaborar, ainda que n�o chamado para tal.
Mudan�a est� bem mapeada
Os exemplos sobre o que fazer para dotar a administra��o p�blica de alguma compet�ncia s�o bastante conhecidos, como destaca estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID): “Os novos modelos de neg�cios e as solu��es digitais disruptivas em plataformas abertas constituem uma grande oportunidade para os pa�ses, ao mesmo tempo em que exigem adaptar os atuais mecanismos de gest�o fiscal e tribut�ria ao uso intensivo de dados na nuvem, data analytics, big data, sistemas on-demand, blockchain, intelig�ncia artificial e machine learning” (uso de modelos matem�ticos e algoritmos).
Tais instrumentos est�o sendo aplicados em v�rias �reas do governo em diferentes est�gios. Mas sem configurar uma mudan�a de regime de gest�o. Espera-se dos programas digitais, quando muito, redu��o de custo e dos tempos de processamento das demandas – por exemplo, de emiss�o de passaporte, cujo prazo de entrega � satisfat�rio, e dos pedidos de benef�cios sociais, colapsados, como se sabe.
S� que a governan�a digital � muito mais que melhorar indicadores de produtividade. � outra forma de gerir o pa�s, com implica��es que v�o do jeito de ensinar � formula��o do crescimento econ�mico.
�ndia merece muita aten��o
A experi�ncia da digitaliza��o em massa em curso na �ndia merece a maior das aten��es. Trata-se da maior democracia do mundo, com 1,2 bilh�o de habitantes, muita mis�ria, mas a caminho de se tornar a terceira maior pot�ncia global econ�mica, tecnol�gica e militar at� o fim da d�cada, depois de China e EUA. H� um fio condutor.
O grande salto come�ou com o cadastramento biom�trico obrigat�rio, lan�ado em 2009. Mais de 80% dos indianos adultos j� t�m pelo menos uma conta banc�ria digital, a maioria vinculada a aplicativos de pagamentos instalados em celulares. Come�ou em 2016 e em novembro passado registrou 1,2 bilh�o de opera��es. Gra�as a tal estrutura, o Imposto de Bens e Servi�os, implantado h� dois anos, semelhante ao projeto em discuss�o na C�mara, integrou 60 milh�es de pequenas, m�dias e grandes empresas numa �nica plataforma, segundo um estudo recente da escola de neg�cios francesa Insead.
Fato: n�o temos estrat�gia
As diferen�as de compreens�o sobre o efeito das inova��es digitais sobre a economia, a pol�tica, a sociedade, a cultura, o progresso, enfim, ficam claras ao se comparar nossos objetivos aos da �ndia.
Aqui, o TSE vai para o oitavo ano com o recadastramento biom�trico eleitoral. Tamb�m h� a iniciativa de unificar na CNH os documentos de identidade. Na �ndia, tudo isso se fez em escala do bilh�o com um modelo �nico, em menos de 10 anos e com resultados palp�veis.
Como indica o estudo do Insead, a �ndia subiu do 142º para o 63º lugar no Doing Business, o �ndice de facilidade de fazer neg�cios do Banco Mundial, em cinco anos, e, em quatro anos, do 81º ao 52º no ranking global de inova��o. E j� � o terceiro maior ecossistema de startups do mundo. Temos um programa remotamente parecido? N�o.
Em compensa��o, duvidamos da quest�o clim�tica, ignoramos a razia das florestas, porte de armas � tema priorit�rio, na economia s� se fala em crise fiscal, titular da cultura faz prega��o nazistoide, e por a� vai. Bolsonaro tem viagem agendada � �ndia. Quem sabe...?