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A empregada dom�stica, o racismo e o machismo estrutural

N�s, mulheres brancas, conquistamos nossa liberdade e autonomia �s custas das mulheres pretas que fizeram os servi�os que n�o quer�amos mais fazer


(foto: Andrey Popov/depositphotos)
(foto: Andrey Popov/depositphotos)

“As mulheres pretas n�o podem ficar em casa porque as mulheres brancas n�o podem ficar sem as mulheres pretas em suas casas” – Debora Mar�

Essa frase da Debora, postada em um grupo de m�es, nos levou a uma maravilhosa reflex�o que n�o poderia ficar restrita �quele grupo. Essa frase nos trouxe duas quest�es, o racismo estrutural e o machismo estrutural.

Mulheres precisam de outras mulheres em casa porque os homens n�o participam ativamente das atividades e resolu��es de problemas dom�sticos. E n�o adianta vir com um discurso meritocr�tico, a mulher que trabalha como empregada dom�stica n�o teve escolhas, esse n�o � o trabalho dos sonhos de ningu�m.

N�o pense na sua casa, na sua vida, essa � uma quest�o que tem que ser pensada de forma mais ampla, uma forma de evoluirmos como sociedade e, para isso, voc� n�o pode ficar na defensiva.

� preciso estar disposta a desconstruir conceitos e questionar. Lembre-se, � um problema estrutural! O mundo n�o muda, se a gente n�o mudar. Esse despertar d�i, d�i mesmo.

� nosso papel, ou deveria ser, romper esse ciclo. E esse conflito interno, essa desconstru��o � o primeiro passo.

A maioria das mulheres brancas n�o conseguem se desapegar do trabalho das empregadas dom�sticas (em sua maioria mulheres negras) porque isso impactaria diretamente em seus casamentos, por in�meros motivos que n�o s� a divis�o de tarefas entre homens e mulheres na casa, nos cuidados com os filhos. Grande parte das vezes, � pela explora��o das mulheres negras que os casamentos se sustentam.

A�, as fotos de fam�lia Doriana v�o por �gua abaixo. � f�cil falar que as fam�lias pobres s�o desestruturadas se as nossas se estruturam baseadas no sacrif�cio delas, das fam�lias delas, dos filhos delas. A vida deles � sacrificada o tempo todo para nossa fam�lia aparecer bonita na foto (pelo menos nas apar�ncias).

Enquanto essas mulheres est�o nas nossas casas, cuidando da nossa fam�lia, dos nossos filhos, onde est�o os filhos delas, quem est� cuidado da casa e da fam�lia delas? Quem est� dando suporte para que os filhos delas estudem e possam ter um futuro melhor do que o delas?

Num pa�s com tradi��o patriarcal e escravocrata como o nosso, a discuss�o n�o � simples, pois o trabalho de dom�stica ainda tem ran�o de escravid�o, e n�o de uma rela��o trabalhista como outra qualquer – com direitos, com objetividade, com boa remunera��o. Precisamos melhorar muito como sociedade para construirmos rela��es mais saud�veis com esse tipo de fun��o.

Num universo ideal, homens e mulheres compartilhariam todas as fun��es da casa e, na impossibilidade de conseguirem manter tudo em dia, poderiam contar com a ajuda de outros profissionais – que poderiam ser homens ou mulheres, com remunera��o que permita ao profissional ter seus direitos b�sicos garantidos. Nesse contexto, mais pessoas poderiam se dedicar a fun��es de limpeza e cuidado por escolha e n�o por falta de escolha.

Sem essa hist�ria de que '� praticamente da fam�lia', que ao fim e ao cabo � sempre usada para tirar direitos da empregada, n�o pagar FGTS, explorar. "� praticamente da fam�lia," mas n�o entra na divis�o da heran�a, geralmente � isso que acontece. "� praticamente da fam�lia," mas precisa priorizar as demandas da minha fam�lia e n�o da dela, e assim por diante.

O problema estrutural � que as mulheres sozinhas t�m que dar conta de tudo, dos filhos, das contas (principalmente as m�es solo), da casa, da educa��o e de si mesmas.

A estrutura na maioria das vezes n�o nos d� escolha, ela vem de forma esmagadora e te imp�e condi��es e voc� que se vire pra lidar com elas, seja voc� preta, pobre, seja voc� privilegiada financeiramente e branca. Quem tem escolhas livres hoje s�o os homens brancos ricos e todo o resto tem escolhas condicionadas ou nenhuma escolha.

Lembrando que nossos “white people problems”, n�o se comparam ao que enfrentam as mulheres negras. Enquanto temos a preocupa��o de ter filhos bem cuidados, estudando em boas escolas, a preocupa��o da maioria delas � do filho ser morto por ser confundido com bandido apenas por ser negro.

� morar em comunidade e lutar para que o filho n�o v� para o caminho do crime. � sentir fome e ver seus filhos sentindo fome tamb�m. � saber que n�o vai ter o dinheiro para o rem�dio que o m�dico do posto de sa�de receitou para o filho.

� ser hiperssexualizada, mas ao mesmo tempo n�o ser aquela mulheque se leva pra apresentar os pais (vide leituras sobre a solid�o da mulher negra).

� n�o ser vista como mulher 'fr�gil' como n�s somos – mas sim fortes para o trabalho bra�al. � ver a m�e dom�stica ser assediada impunemente pelo patr�o. � constatar na pele a realidade de receber a menor renda m�dia de todas as camadas da popula��o, � se ver v�tima preferencial de aviltamentos e �dio gratuitos no twitter. � ser a maior parte das mulheres que criam seus filhos sem os pais. E uma infinidade de coisas que ignoramos.

Sabemos que muitas mulheres ainda precisam trabalhar como empregadas dom�sticas para pagar as contas, sobreviver. E com a pandemia tudo isso tende a piorar, j� que estamos completamente desassistidos.

Ent�o, enquanto tantas mulheres precisam desse tipo de trabalho, precisamos tamb�m nos unir � luta delas por condi��es mais dignas.

Seja na nossa esfera individual – pagando todos os direitos, respeitando hor�rios, folga, como na social, fazendo coro �s reivindica��es delas, em vez de fazer vista grossa ou achar que s�o menos dignas de direitos "porque sempre foi assim e tem pa�ses onde � pior" ou porque "est� faltando trabalho, ela que agrade�a a oportunidade".

Em um pa�s mais justo, com melhores investimentos em educa��o, maior equidade no mercado entre homens e mulheres, melhor distribui��o de renda, que n�o enxergue nossas crian�as como um empecilho nas rela��es trabalhistas, ela poderia estar desempenhando outro tipo de atividade.

Essas rela��es estruturais s�o percebidas diariamente por nossos filhos. Se voc� n�o pratica uma educa��o antirracista com seu filho, ele crescer� como a nossa gera��o: naturalizando essa nefasta desumaniza��o do preto. A nega��o, minimiza��o e silenciamento do racismo pelo branco s� contribui para sua perpetua��o.

N�s, mulheres brancas, conquistamos nossa liberdade e autonomia �s custas das mulheres pretas que fizeram os servi�os que n�o quer�amos mais fazer.

Ningu�m tem culpa de ser privilegiada, temos a responsabilidade de assumir esse privil�gio e fazer algo com ele. � tempo de sair da zona do medo, entrar na zona do aprendizado e evoluir para a zona do crescimento.


* Contribu�ram com esse texto: Ana Flavia Figueiroa, B�rbara Guimar�es, Caroline Rady, Debora Mar�, D�bora Vieira, Fernanda Bdz, Gabriela Ayres, Juliana Freire

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