
Novamente estamos discutindo a descriminaliza��o do aborto no Brasil. Lembrando que descriminalizar � diferente de legalizar. Descriminalizar � tirar o aborto do rol de crimes, n�o significa que a conduta passar� a ser considerada livre para ser plenamente praticada.
� �bvio que o ideal � que nenhuma mulher engravide sem planejar, que todas as pessoas tenham acesso a m�todos contraceptivos. Lembrando que, enquanto uma mulher est� gestando um �nico beb� durante 40 semanas, um homem pode estar engravidando outras 200 mulheres no mesmo per�odo. Portanto, seria mais do que justo que, em vez de ficar debatendo o aborto, estiv�ssemos debatendo a vasectomia, que evitaria gravidez indesejada e o abandono paterno.
Dever�amos estar debatendo a criminaliza��o do abandono paterno! 78% dos pais abandonam filhos menores de 5 anos com doen�as raras e defici�ncias. Mais de 100 mil crian�as foram registradas sem o nome do pai na certid�o de nascimento s� em 2023. E ainda temos os pais que abdicaram da fun��o paterna em algum momento da vida dos filhos j� nascidos. Antes de uma mulher decidir fazer um aborto, um homem j� decidiu que n�o iria assumir suas responsabilidades para com ela. Que eu saiba, mulheres ainda n�o conseguem fazer filhos sem precisar de fecunda��o.
As m�es ficam com toda a responsabilidade afetiva e financeira. N�o por acaso, as not�cias de m�es que moravam sozinhas com seus filhos em casa e foram encontradas mortas dias depois n�o s�o raras. Nunca vi um pr�-vida lutando pela vida delas. Ser m�e �, no sistema patriarcal, uma obriga��o de toda mulher. Ser m�e � compuls�rio. Mulher sem filhos � vista como mulher incompleta. O sistema patriarcal � tamb�m um sistema maternalista. Ou seja, todo o �nus da maternidade recai �nica e exclusivamente sobre a mulher. N�o existe uma divis�o do trabalho de cuidado.
Imagine uma mulher que j� tem quatro filhos, e engravida do quinto sem querer. Sim, nenhum m�todo contraceptivo � 100% eficiente. Ela pode engravidar usando DIU, camisinha, tomando p�lula anticoncepcional e at� tendo feito laqueadura. Ao se ver gr�vida, ela entra em desespero porque vive um relacionamento abusivo, ou porque a situa��o financeira j� est� muito dif�cil, ou por qualquer outro motivo. Nesse momento, ela resolve recorrer a um aborto ilegal. Ao fazer um aborto clandestino, improvisado, com poucos recursos, se ela n�o morrer, ela pode ser presa. Ent�o, quem vai cuidar dos quatro filhos que ela j� tinha enquanto ela est� na pris�o?
Com o aborto descriminalizado essa mesma mulher iria recorrer ao SUS, onde receberia orienta��es e apoio, podendo inclusive desistir do procedimento por se sentir acolhida. Al�m disso, ela teria orienta��es sobre planejamento familiar e m�todos contraceptivos para evitar uma nova gravidez. Quando a gente fala em descriminaliza��o do aborto, a gente fala em salvar vidas, vidas que hoje s�o perdidas por causa da criminaliza��o.
Mulheres n�o deixam de fazer aborto porque � ilegal, a Pesquisa Nacional de Aborto (PNA) de 2021 mostrou que uma em cada sete mulheres, em torno de 40 anos, j� fez pelo menos um aborto no Brasil. Metade delas tinha 19 anos ou menos quando fez seu primeiro aborto. 6% delas eram meninas com idades entre 12 e 14 anos, lembrando que, por lei, ter rela��o sexual com menores de 14 anos � crime de estupro de vulner�vel, n�o importando se a crian�a consentiu. A educa��o sexual nas escolas � fundamental para reduzir o n�mero de meninas e adolescentes gr�vidas, lembrando que a maior parte dos abusos sexuais contra menores acontece dentro de casa.
O aborto � o quinto maior causador de mortes maternas no Brasil. Cerca de 800 mil mulheres praticam abortos todos os anos no pa�s. Quem tem dinheiro, paga por um procedimento seguro, quem n�o tem, se arrisca e morre. Morre m�e, morre feto. A pessoa que se diz "pr�-vida" acha justo que uma mulher morra em consequ�ncia de um aborto. Mas afinal, isso � ser pr�-vida ou � ser pr�-nascimento?
