
Quando me perguntam, 'de onde voc� �?', respondo:
-Tenho dupla cidadania! Nasci em Belo Horizonte, mas sequei o umbigo em Ibi�.
A pergunta seguinte � a prova cabal da ignor�ncia geocultural do interlocutor:
- mas, onde fica Ibi�?!
-Tenho dupla cidadania! Nasci em Belo Horizonte, mas sequei o umbigo em Ibi�.
A pergunta seguinte � a prova cabal da ignor�ncia geocultural do interlocutor:
- mas, onde fica Ibi�?!
Princ�pios educacionais me impedem de dar a resposta desejada. Respiro fundo, seguro a l�ngua e respondo:
- Sabe Arax�?! Fica perto de Ibi�...
- Sabe Arax�?! Fica perto de Ibi�...
Segundo Dr. Ivo Mendes, meu dentista na inf�ncia, se Arax� p�e a mesa, Ibi� p�e tamb�m, mas bem antes.
Arax� fez parte da minha inf�ncia, de forma m�gica. Ir de Ibi� a Arax� era uma aventura. Estrada de terra, poeira que n�o acabava mais. Al�m disso, tinha ainda a ponte sobre o Rio Quebra Anzol. Voc�s podem imaginar os peixes que apareciam por l�!
Eu sempre dormia logo depois da ponte e acordava sem saber bem onde estava. Mas, sabia que em breve estaria na casa da Tia Manuelita. Ela morava num sobrado pr�ximo a cadeia p�blica, com um quintal fant�stico, repleto de �rvores frut�feras centen�rias de todo tipo.
Tia Manuelita era filha �nica de um prospero fazendeiro, Coronel Jos� Ferreira, do qual eu tinha um certo temor pela altura e fala potente, que intimidava at� quem ele queria agradar. Depois da morte dele, ela passou a viver no sobrado com sua empregada, Maria Chica, filha de escravos, surda e muda, cuja alegria, simpatia e carinho com as visitas contagiava meio mundo. Me lembro bem que o sonho dela era casar-se com um dos jovens soldados da cadeia ao lado da casa.
Tia Manuelita virou uma colecionadora de objetos antigos. A sensa��o que se tinha em seu enorme sobrado era que est�vamos num grande museu. In�meros rel�gios e lou�as de todo o mundo compunham o seu acervo, que rivalizava com o museu da Dona Beija.
Ir ao Barreiro e Grande Hotel era como estar em algum lugar da Europa. Sofistica��o, luxo e eleg�ncia eram marcas registradas deste local. Os ossos de dinossauro expostos no Barreiro me fascinavam. A �gua fedorenta, nem tanto.
Quando eu voltava para Ibi�, tinha hist�rias para contar por semanas. Que sorte, Arax� pertencer a grande Ibi�.
Motivo de orgulho para quem mora em Arax� � saber que Buenos Aires tamb�m pertence � grande Ibi�. Defendi essa tese recentemente, quando fui fazer uma confer�ncia no Congresso Argentino de Infectologia.
Mostrei nos primeiros slides que o Rio da Prata nascia do encontro do Rio S�o Jo�o, Quebra Anzol e Miseric�rdia, primordialmente em Ibi�. Mais especificamente, pr�ximo � Serra da Sobra, pertencente ao Sr. Juquinha Sobrado. Apesar de ser um homem de bem, se ele resolvesse, de uma hora para outra, fechar sua bica d’�gua e abrir de uma s� vez, inundaria Buenos Aires. Pertence ou n�o � grande Ibi�? Imaginem voc�s, os Argentinos n�o sabiam do risco que corriam!
H� cerca de 2 anos fui convidado pelo Governador para uma reuni�o. Ao saber da minha �ntima rela��o com Ibi�, n�o se acanhou em reclamar da sombra da chamin� de uma das principais f�bricas do vasto parque industrial da cidade em sua casa em Arax�. Claro, mesmo sem ter nada com isto, por educa��o, me desculpei.
Mas, todas estas recorda��es me vieram a cabe�a por uma mensagem que recebi da minha sogra, Isaura Pena, com um recorte de jornal da Folha de S�o Paulo de segunda-feira, 15/11/1993, Coluna Painel/Contraponto, de autor n�o mencionado, o qual reproduzo aqui, com discretas “licen�as po�ticas”.
O t�tulo era “Garbo n�o morreu em Arax�”. Nos idos dos anos 30, o Cine Gl�ria de Arax� (filial do Cine Brasil de Ibi�) anunciou a apresenta��o do filme “Dama das Cam�lias” - dividido em 2 partes, para aumentar a bilheteria.
A casa encheu e, antes da segunda sess�o no dia seguinte, Mafalda, a loura mais cobi�ada da cidade, confessou ao jovem operador do cinema, Mimilo Ara�jo, que seria a mulher mais feliz do mundo se a hero�na n�o morresse no final.
De olho na loura e comovido com seu desejo, Mimilo trancou-se na cabine munido de tesoura, fita durex e ousadia art�stica. N�o teve d�vidas, reeditou o filme. Cortou as cenas finais e as substituiu por outras do meio da fita em que Greta Garbo aparecia aos beijos com Robert Taylor. Exibido o filme, choveram protestos. O prefeito Villas Boas, futuro ministro do STF, estimulou a ira do promotor Christiano Barsante. Chamaram o projecionista:
- Semana passada, assisti a este mesmo filme em Ibi�. A atriz morria tuberculosa no final. E aqui n�o?, come�ou Barsante.
- Uai doutor, todo mundo sabe que o clima de Arax� � muito melhor que o de Ibi�, fulminou Mimilo.
A quem diga que, eventualmente, Greta Garbo passeia pelas noites de Arax�, linda e vivinha at� hoje. Em Ibi� ela vai de vez em quando, apenas a neg�cios, ou para sentir o gostinho de “Boi” nos Aires...