
A religi�o me foi apresentada pela minha m�e. Cat�lica fervorosa, me levava � missa invariavelmente todos os finais de semana. � bem verdade que meu comportamento na igreja n�o era dos mais louv�veis. Como n�o existiam celulares, iPads, fones de ouvido e outros subterf�gios modernos que usamos para entorpecer nossos filhos em restaurantes, a sa�da era levar o brinquedo da �poca. O pe�o n�o deu muito certo. Fazia barulho e precisava de espa�o. Missa de Domingo � sempre lotada de gente pedindo perd�o pelos pecados da semana, os quais invariavelmente se repetir�o nas semanas seguintes.
O rev�lver foi uma solu��o n�o muito apropriada ao local, mas a que me deixou mais control�vel. Passava boa parte da missa matando os Santos. A cada Santo morto eu contava para a minha m�e:
- M�e, matei S�o Sebasti�o.
- M�e, matei S�o Sebasti�o.
Para todos, ela tinha uma indulg�ncia.
-Meu filho, este � seu Santo padroeiro! N�o pode!
Al�m disso, ele j� est� todo flechado. Nunca mais matei S�o Sebasti�o. N�o valia a pena, ele j� iria morrer mesmo.
Al�m disso, ele j� est� todo flechado. Nunca mais matei S�o Sebasti�o. N�o valia a pena, ele j� iria morrer mesmo.
- Mas, e Santo Ant�nio, pode?
- Claro que n�o! Quer ficar solteiro o resto da vida?!
Como eu n�o sabia bem o que era isso. Matei Santo Ant�nio diversas vezes. O efeito foi exatamente o oposto...
De vez em quando eu matava o padre. At� que um dia, Padre Agostinho, um alem�o de sotaque marcante, me retribuiu o tiro. Tive que encenar uma queda de �ndio em filme do John Wayne. Acharam que eu estivesse tendo um ataque epil�ptico. Foi um esc�ndalo. Nunca mais pude levar meu revolver para a igreja.
Minha m�e dava belisc�es fininhos que do�am muito. Nesse dia levei v�rios! Assim, aprendi em um �nico dia o significado do n�o matar�s e principalmente, do n�o morrer�s!
Na semana Santa sempre fui um dos ap�stolos na cerimonia do lava-p�s. Me vinguei do tiro levado do padre. Fiquei v�rios dias antes usando meu terr�vel sapato de borracha. O chul� impregnava no p� de tal maneira, que n�o saia nem com ladainha de quaresma.
Para quem n�o sabe, nesta cerimonia o padre tem que simular um beijo no p� do ap�stolo. Padre Agostinho olhou para mim, com a certeza de que a vingan�a havia chegado.
- Menino, voc� deve ser Judas! Com este chul�, nem Cristo lavaria o seu p�!
Mais uma vez, senti a virul�ncia dos belisc�es fininhos.
Apesar destes pequenos percal�os, acabei me interessando profundamente por temas religiosos e todos os rituais que envolvem os diferentes cultos nas mais diversas cren�as. Os s�mbolos, particularmente, sempre me fascinaram.
Nessa pandemia, ao ver o comportamento humano em diferentes cen�rios, salta aos olhos os Sete Pecados Capitais.
Os sete pecados capitais s�o uma classifica��o de condi��es humanas que correspondem a v�cios, os quais precedem o surgimento do cristianismo, mas que foram usadas pelo catolicismo com o intuito de educar os seguidores, de forma a compreender e controlar os instintos b�sicos e assim, aproximarem-se de Deus.
Curiosamente, a lista final foi apresentada no s�culo XIII, em plena epidemia de Peste, numa condi��o desesperadora semelhante a que estamos vivendo atualmente.
Desta forma, para fazer frente as adversidades epid�micas, � fundamental termos protocolos que balizem o comportamento humano e permita a sa�da deste momento com menos dano pessoal e coletivo.
A Gula, certamente foi um dos pecados mais cometidos nessa pandemia. A angustia e as incertezas fizeram da geladeira e do fog�o, grandes aliados. O desejo insaci�vel por comida e bebida certamente levaram os bot�es da camisa e das cal�as a fazerem distanciamento social, fora de suas respectivas casas.
A temperan�a � a virtude oposta. Por�m, muita gente entendeu errado e carregou a m�o no tempero, aumentando a clientela dos colegas proctologistas.
A Avareza, ou Gan�ncia, desfilou de forma travestida de lei da oferta e procura. Sumiram as m�scaras e os insumos para produ��o dos testes diagn�sticos necess�rios ao manejo adequado da epidemia.
Surgiram testes r�pidos nas farm�cias de Norte a Sul, juntamente com o mantra testar, testar, testar. Mais uma armadilha da gan�ncia. Os testes, em sua maioria n�o testavam nada, mas enganavam os aflitos que, sedentos de um IGG positivo, se contentavam com um enganador IGM. A avareza levou muitas almas deste planeta, que ao se julgarem imunes, se expuseram e ca�ram nas garras do Corona.
Por outro lado, o que n�o faltou foi a virtude oposta, a generosidade. Surgiram doadores de tudo. Banqueiros filantropos, traficantes solid�rios, pol�ticos honestos distribuindo cloroquina e propondo tratamentos retais espetaculares. Como cavalo dado n�o se olha os dentes, tudo foi bem vindo e pand�micamente justificado e perdoado.
A Lux�ria, se fez presente como nunca em lives pornogr�ficas, por vezes, envolvendo crian�as, presas f�ceis expostas �s tenta��es da internet. Apesar de combatida de forma severa pela Pol�cia Federal, ainda temos um longo caminho pela frente.
A Castidade, virtude oposta, encontra-se de quarentena no continente gelado, incomunic�vel.
J� a Ira, deu um espet�culo no gabinete do �dio. N�o faltaram fakenews e agress�es a quem fosse contra os desejos messi�nicos do planalto. At� o STJ foi iluminado com chuva de fogos de artif�cio. Posteriormente, foi infectado por um super-spreader(disseminador viral de elite), o qual infectou quase metade da corte suprema.
Paci�ncia foi o que muita gente teve que exercitar com o vizinhos fazendo obra no apartamento ao lado. Virtude testada ao extremo com os negativistas que insistem em propor tratamentos fakes. A paci�ncia foi aos poucos se transformando novamente em Ira ao perceberem que o v�rus n�o veio passar f�rias. Gostou do poso e desembarcou de mala e cuia.
A Inveja, por sua vez, apresentou-se atrav�s do desejo insano por protagonismo. Quantos milhares de v�deos de WhatsApp surgiram com ilustres especialistas em coisa nenhuma, mas experts em COVID.
Neuro-epidemiologistas, ultrassonografistas especialistas em coronav�rus. Todos falando com sapi�ncia de quem, por d�cadas, lida com doen�as infecciosas virais inusitadas, sem jamais terem atendido pacientes com COVID 19, ou publicado sobre o assunto.
Somente por caridade, e bondade divina, estes indiv�duos escapar�o das garras do c�o.
A pregui�a dominou milhares de ambientes dom�sticos, tendo sido motivo de muita separa��o de casais. Lavar as lou�as na pia virou um cabo de batalha, assim como, fazer o dever de casa com as crian�as. A pregui�a alimenta o home–office, que por sua vez, alimenta a pregui�a, que se escora num fator de risco, que jamais foi motivo para um controle m�dico s�rio antes da pandemia. Ou seja, a epidemia serviu como uma t�bua de salva��o para pregui�osos cr�nicos. Agora, todos tem uma boa justificativa: - o v�rus!
Logo ele, que de forma diligente viajou o planeta inteiro em poucos meses, serve de amparo aos pregui�osos do mundo.
Por fim, a Soberba, irm� siamesa da arrog�ncia e da vaidade. A soberba esteve presente o tempo todo na nega��o dos mortos que se amontoaram em covas coletivas. Foi ela que fez L�cifer se sentir mais alto que o pr�prio Deus.
Curioso, foi em nome de Deus que algu�m se elegeu presidente...
O antidoto para a arrog�ncia e a vaidade � a humildade. Estamos aprendendo com o ineditismo do desconhecido a enxergar a n�s mesmos...nossos sentimentos, imperfei��es e vis�o estreita do mundo.