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Estado de Minas FILOSOFIA EXPLICADINHA

Urg�ncia? S� no amor

Urg�ncia? S� no amor. Mas cuidado! A burocracia do indiv�duo-empresa vai tentar lhe convencer, a todo tempo, do contr�rio


19/08/2023 04:00 - atualizado 19/08/2023 07:08
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Saturno (ou Cronos, na mitologia grega) devora um dos seus filhos. A obra é uma alegoria da passagem inexorável do tempo
Saturno (ou Cronos, na mitologia grega) devora um dos seus filhos. A obra � uma alegoria da passagem inexor�vel do tempo (foto: Saturno Devorando um Filho (1819-1823), de Francisco de Goya Fonte: PALIMPSESTO � www.palimpsesto.online )

 

Cronos � a divindade da mitologia grega identificada com a temporalidade das coisas. Ela � conhecida por devorar os pr�prios filhos, limitando-os � vida dentro de si. A met�fora � bela e triste: nada resiste � fome do tempo, o Deus que devora mortais, os pr�prios deuses e, tamb�m, as pedras. O apetite crono-l�gico � insaci�vel.

 

Precisamos resgatar a narrativa mitol�gica, pois vivemos uma doen�a silenciosa: a acelera��o. O mal do s�culo, talvez do mil�nio. Ingenuidade acreditar que a mudan�a dos meios de comunica��o, das revolu��es tecnol�gicas e da ind�stria 4.0 n�o alterariam a estrutura social do tempo.

 

 

Vivemos apressados. Corremos o tempo todo acelerando vozes, negando privacidades, alterando espa�os, pulando faixas e visualizando v�deos. Nossa melhor imagem: sujeitos correndo em esteiras, em uma escada rolante de um shopping qualquer, subindo e descendo sem sair do lugar.

 

O fil�sofo Foucault, em seus estudos sobre biopol�tica, j� apontava para uma importante transforma��o contempor�nea: a decad�ncia do sujeito de desejo e sua transforma��o em indiv�duo-empresa.

 

A modernidade tardia, �poca estranha em que vivemos, acelerou as estruturas sociais de uma forma t�o intensa que moldou cada pessoa como um empres�rio de si mesmo. � f�cil nos encontrar, bastar correr do nosso lado, quantificando e pulando entre urg�ncias e emerg�ncias, tratando os contornos vitais como um verdadeiro neg�cio (o negar o �cio), a forma materializada de microempresas Individuais.

 

A acelera��o afasta o amor. Ele, ao contr�rio da pressa, exige paci�ncia, sobriedade, sabedoria e disposi��o para se organizar de uma forma oposta � l�gica da meta-custo-lucro-retorno. � preciso ter cuidado, pois o modo como gastamos o nosso tempo diz muito de quem somos.

 

Educar os filhos? Se tornou mera quest�o de investimento. Depositamos neles as cifras que um dia esperamos, de alguma forma, receber no futuro. A vida entre casais? Cada vez mais “planilhada” e, quando tomam lugar � mesa, � apenas para conversar sobre as finan�as do lar, d�vidas e organiza��es financeiras.

 

Idosos? Analisados por meio do “custo-benef�cio” (termo que invade as dimens�es existenciais), v�rias fam�lias acham melhor deposit�-los em asilos. Afinal, todos em casa est�o trabalhando, sem tempo para o cuidado daqueles que nos antecederam. Ainda assumimos o argumento canalha: melhor para eles. No entanto, a verdade pulsa diante de n�s: n�o temos tempo para doar para aqueles que gastaram, gratuitamente, seus momentos apoiando-nos a ser quem somos. E fizeram isso justamente em uma fase que s� d�vamos preju�zo, sem produzir nada.

 

A desgra�a da acelera��o do tempo invadiu, inclusive, o futebol. A celeridade dos jogos beira � precipita��o. T�cnicos com suas telinhas e seus marcadores de desempenho, controlando jogadores a partir de condicionamentos rob�ticos e desapaixonados. Saudade de um jogo cadenciado. O futebol-veloz � o oposto do futebol-arte.

 

O que �, pois, o tempo? Reflete Agostinho de Hipona em suas Confiss�es, rastreando o tema ao longo de p�ginas dotadas de grande profundidade est�tica. � pena ele n�o ser mais motivo de reflex�o filos�fica. Ausentes da filosofia agostiniana, lidamos com ele a partir de uma l�gica de inimizade. Ora querendo domin�-lo, ora querendo venc�-lo. �poca triste em que o tempo deixa de ser professor.

 

 

Urg�ncia? S� no amor. Mas cuidado! A burocracia do indiv�duo-empresa ir� tentar lhe convencer, a todo tempo, do contr�rio. Eles s�o velozes para isso. 

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