Advogados de Fraldas: A Infantiliza��o do Direito na Era Digital

Na coluna desta semana, "Direito Simples Assim", lan�amos um olhar reflexivo sobre um fen�meno que tem chamado a aten��o de muitos educadores e profissionais do direito: o perfil infantilizado dos estudantes de direito e jovens advogados no mercado atual. Este tema n�o � uma exclusividade do universo jur�dico; ele reflete tend�ncias comportamentais contempor�neas mais amplas, que t�m ra�zes profundas em aspectos sociais, culturais e tecnol�gicos. Inspirados pela an�lise de Felipe Daroit e outros pensadores contempor�neos, como Byung-Chul Han e Jean-Fran�ois Lyotard, buscamos compreender como essas mudan�as comportamentais impactam a forma��o e a pr�tica jur�dica.

Observa-se uma crescente infantiliza��o entre os estudantes de direito e jovens advogados, um reflexo do que Byung-Chul Han descreveu em "A Sociedade do Cansa�o": uma gera��o sobrecarregada por est�mulos constantes e uma busca incessante por valida��o imediata. Estes jovens, muitas vezes, apresentam dificuldades em lidar com frustra��es e em assumir responsabilidades plenas, comportando-se de maneira semelhante a crian�as que necessitam de constante aten��o e reafirma��o.

Como professor universit�rio que sou, j� perdi a conta de presenciar a rea��o indignada de um estudante diante de uma nota baixa ou cr�tica construtiva, esperando que o professor "desfa�a" o ocorrido, como se fosse poss�vel apagar erros com um simples "unfollow" ou "delete". Este comportamento reflete uma dificuldade em lidar com a frustra��o e a falta de resili�ncia, caracter�sticas que deveriam ser fundamentais na forma��o de futuros juristas.

A sociedade p�s-moderna, conforme Lyotard argumenta em "A Condi��o P�s-Moderna", fragmentou as grandes narrativas que antes guiavam nossas vidas. Hoje, essa fragmenta��o se manifesta nas redes sociais, onde a valida��o micro (likes, coment�rios) substitui o significado profundo e a busca por reconhecimento. Os jovens advogados, imersos neste ambiente digital, muitas vezes espelham essa din�mica em suas vidas profissionais. Eles buscam reconhecimento imediato por suas a��es e t�m dificuldade em aceitar cr�ticas ou em se engajar em di�logos que exijam maturidade e reflex�o.

Imagine, ou melhor, observe os v�rios  casos de jovens advogados que priorizam a autopromo��o nas redes sociais, compartilhando vit�rias processuais e opini�es pessoais, mas evitando debates profundos sobre justi�a social ou quest�es �ticas complexas. Este comportamento reflete a sociedade do espet�culo, onde a apar�ncia e a valida��o p�blica superam a subst�ncia e a reflex�o cr�tica.

A tecnologia, especialmente as redes sociais, desempenha um papel crucial nessa transforma��o. Como Daroit aponta, a sociedade digital se tornou um "grande jardim da inf�ncia", onde adultos, mimetizando comportamentos infantis, exigem empatia e valida��o constante. Este cen�rio � agravado pela superficialidade das intera��es online, onde o ego�smo se esconde atr�s de filtros e a hipersensibilidade se manifesta em legendas motivacionais.

A depend�ncia de likes e coment�rios positivos pode levar esses jovens a buscar solu��es jur�dicas "populares" em vez de tecnicamente corretas ou eticamente s�lidas. Por exemplo, a ado��o de teses jur�dicas midi�ticas sem uma an�lise cr�tica aprofundada, apenas para ganhar visibilidade e aceita��o social.

Na forma��o jur�dica, essa infantiliza��o se traduz em uma resist�ncia a cr�ticas construtivas e uma expectativa de gratifica��o instant�nea. Estudantes e jovens advogados, acostumados com a l�gica das redes sociais, podem ter dificuldade em compreender a import�ncia de limites e responsabilidades. A busca por "diplomas premium" e "carreiras gourmet" reflete essa mentalidade, onde o processo de aprendizado e a pr�tica do direito s�o vistos como meios para obter reconhecimento r�pido e superficial, em vez de uma jornada de crescimento e responsabilidade.

Neste ponto importante lembrar que na forma��o destes jovens as institui��es de ensino devem incluir disciplinas que desenvolvam a resili�ncia emocional e a capacidade cr�tica dos alunos, como �tica profissional, psicologia jur�dica e pr�tica simulada de situa��es de frustra��o.

Sempre interessante trazer o contato destes jovens com profissionais experientes, por exemplo, programas de mentoria podem ajudar os estudantes a navegar as press�es da carreira jur�dica, ensinando-os a lidar com cr�ticas e a construir uma carreira baseada em princ�pios s�lidos, n�o em gratifica��o instant�nea.

Tamb�m um programa de est�gio que exige a apresenta��o de casos perdidos e as li��es aprendidas com eles, em vez de apenas celebrar vit�rias, pode ser uma maneira eficaz de ensinar resili�ncia e responsabilidade.

Na semana passada, discutimos na columa Direito Simples Assim a fascina��o contempor�nea pelos "Beb�s Reborn", uma tend�ncia que simboliza o desejo de regressar a um estado de vulnerabilidade e cuidado constante. Este fen�meno cultural n�o est� distante da infantiliza��o observada nos jovens profissionais do direito. Ambos refletem uma sociedade onde os adultos buscam conforto e valida��o em formas que tradicionalmente pertencem � inf�ncia.

� essencial lan�ar luz sobre esses comportamentos para compreender e mitigar seus impactos na forma��o e pr�tica jur�dica. E aqui relembramos que o perfil tratado n�o se limita apenas ao mundo jur�dico, mas est� espalhado nos jovens desta gera��o.  A busca por uma carreira no direito deve ser pautada pela responsabilidade, maturidade e uma compreens�o profunda das implica��es sociais e �ticas da profiss�o. A infantiliza��o, se n�o abordada, pode comprometer a capacidade dos futuros advogados de enfrentar os desafios complexos que a sociedade moderna imp�e.

Para formar advogados capazes de enfrentar os desafios contempor�neos, � crucial que a educa��o jur�dica promova a maturidade emocional e a responsabilidade �tica. A pr�tica do direito exige uma compreens�o profunda das implica��es sociais e morais, algo que vai al�m da busca por valida��o instant�nea. 

A reflex�o proposta aqui � um convite para que estudantes e jovens advogados sejam incentivados a desenvolver uma mentalidade mais madura e respons�vel, capaz de transcender a busca por valida��o instant�nea e de abra�ar o verdadeiro esp�rito do direito: servir � justi�a e � sociedade com integridade e profundidade.

Fontes Inspiradoras:

• "A Sociedade do Cansa�o" de Byung-Chul Han

• "A Condi��o P�s-Moderna" de Jean-Fran�ois Lyotard

• Textos de Felipe Daroit sobre a infantiliza��o digital e moral

Vin�cius Ayala � advogado e professor de Direito Constitucional e Administrativo