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Estado de Minas DA ARQUIBANCADA

A �rdua tarefa de escrever sobre o atual futebol do Cruzeiro

"Escrever � driblar os vazios. Um texto lindo surpreende o leitor como um drible desconcertante levanta o torcedor. Driblar � escrever os vazios"


26/07/2023 04:00 - atualizado 26/07/2023 10:28
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Lance do jogo do Cruzeiro com o Goiás
Cruzeiro joga mal, perde para o Goi�s por 1 a 0, domingo passado, no Horto, pelo Brasileir�o, e frustra a "China Azul" (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)


Ontem, 25 de julho, se comemorou o Dia Nacional do Escritor – e da Escritora. Justamente nessa data, c� estava eu a pensar sobre o que iria rabiscar nesta cr�nica. A ruindade do atual Cruzeiro e o sil�ncio dos diretores da SAF Cruzeiro quanto a isso s�o t�o irritantes que senti des�nimo. Raiva e falta de inspira��o me levaram a uma reflex�o: o que os grandes g�nios das cr�nicas esportivas – os dribladores de vazios – escreveriam sobre esse Cruzeiro t�o sem surpresas, lances desconcertantes e vibra��o?

Larguei a caneta e fui revisitar meus escritores prediletos. Reli trechos de livros emblem�ticos. Relembrei frases ic�nicas cunhadas por eles. Entre uma p�gina e outra, acabei por me recordar de uma prosa com o professor de cinema e santista Edwin Perez. Em 2020, quando eu escrevia o roteiro do filme oficial do centen�rio do Palestra/Cruzeiro (“Em Busca da hist�ria do Cruzeiro”), em meio ao desastre da S�rie B, ele me mandou essa: “Quando o nosso time est� ruim, o melhor a fazer � nos apegarmos � poesia da nossa hist�ria. � a forma de manter vivo o amor por ele.”
Pimba! Como falar do ap�tico Cruzeiro derrotado pelo Goi�s, domingo passado, n�o traria nenhuma poesia ou boa hist�ria, resolvi usar a passagem do Dia do Escritor para trazer dicas de livros e g�nios da cr�nica para quem tamb�m ama os dribles das letras no vazio do papel.

Come�o pelo maioral, o Pel� na arte de escrever sobre futebol: o pernambucano-carioca Nelson Rodrigues. Duas de suas obras s�o obrigat�rias. A primeira � “A p�tria de chuteiras”, que traz cr�nicas sobre a Sele��o Brasileira. Uma sequ�ncia que conta a hist�ria de supera��o da “s�ndrome de vira latas”, que, segundo o pr�prio Nelson, surge com o desastre da derrota para o Uruguai em pleno Maracan� em 1950, e vai at� a conquista do tri em 1970, no M�xico.

O segundo livro de Nelson Rodrigues � a “� sombra das chuteiras imortais”. Uma colet�nea das suas cr�nicas mais geniais, produzidas ap�s as rodadas de domingo. Essa � indiscutivelmente a verdadeira obra-prima da literatura brasileira sobre futebol.

Se Nelson Rodrigues foi o Rei, o Pr�ncipe das letras era cruzeirense: o magistral Pl�nio Barreto, maior pesquisador e escritor da hist�ria do Palestra/Cruzeiro. A ele devemos a nossa obra liter�ria definitiva: “De Palestra a Cruzeiro”, da qual tive a honra de editar sua releitura, a Edi��o do Centen�rio, lan�ada em 2021.

Apesar de ter sido torcedor do Atl�tico de Lourdes, o brilhante escritor Roberto Drummond � outro que tamb�m merece ser lembrado. Entre suas genialidades, coube a ele criar a mais perfeita defini��o da grandiosidade da torcida do Cruzeiro. Foi Drummond que nos batizou de “China Azul”.

Por fim, indico o livro “Futebol ao sol e � sombra”, do uruguaio Eduardo Galeano, um dos maiores pensadores e escritores da Am�rica Latina. Em meio a dezenas de cr�nicas que s�o verdadeiros Garrinchas a entortarem advers�rios com dribles, uma delas � �pica, a que conta a tr�gica hist�ria de “El Indio”, como era chamado o zagueiro Abd�n Porte, do Nacional do Uruguai.

El Indio era completamente apaixonado pelo clube de Montevid�u. Em 1911, realizou o sonho de jogar e ser campe�o pelo Nacional. Foi capit�o at� 1918, quando as les�es lhe colocaram frente a algo que o apavorava: a simples ideia de que poderia acabar na reserva ou ser obrigado a se transferir para outro clube.

No dia 5 de mar�o de 1918, j� sem qualquer condi��es t�cnicas e f�sicas, o pavor se transformou em realidade. Recebeu o comunicado de que iria para a reserva.

Na noite daquele dia, El Indio deixou uma carta para a fam�lia sobre a mesa de casa. Saiu com outra na m�o. Entrou no est�dio Parque Central vazio. Caminhou at� o centro do gramado e suicidou-se.

Na carta, um poema escrito por ele: “Nacional / ainda que em p� convertido / e em p� sempre amante / N�o esquecerei um instante / o quanto te amei / Adeus para sempre.”

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