
O que voc� quer dizer com ‘combate � obesidade’? Do dicion�rio, combate significa ‘militar, luta entre grupos pouco numerosos de for�as militares, de extens�o menor que a batalha; luta entre gente, armada ou n�o’.
De acordo com a World Obesity Federation (Federa��o Internacional da Obesidade), a data antes em 11 de outubro foi alterada para 04 de mar�o desde 2020. Aqui, chamo a aten��o que, ter um dia ‘contra a obesidade’ � uma pr�tica bastante gordof�bica.
Disfar�ado de preocupa��o com a sa�de, o ‘combate � obesidade’, � na verdade, uma guerra contra os corpos gordos e suas exist�ncias. Normalmente, combatemos guerras, endemias, pandemias, comportamentos abusivos e degradantes. Corpos est�o a� para viver, existir e celebrar.
A exist�ncia da data j� mostra como a sociedade e a medicina operam para n�o s� nos fazer deixar de existir, mas, caso teimemos em seguir por aqui, como vamos ser penalizados, hostilizados e exclu�dos. A desumaniza��o da pessoa gorda � real.
� importante lembrarmos que a gordofobia � um sistema de opress�o estrutural que n�o s� coloca as pessoas gordas em situa��o de injusta desvantagem diante do mundo. Para que ela exista, � preciso que haja mantenimento atrav�s da sociedade liberal e capitalista, que preza por corpos normativos e inseridos dentro de um contexto de compra, venda e desejo, que exclui pessoas gordas e/ou que desobedecem as normas postas.
Al�m disso, essa mesma opress�o estabelece erroneamente o conceito de meritocracia para os corpos, entendendo e vendendo a ideia de que, para ser magro, basta querer e que, pessoas gordas possuem corpos maiores em raz�o de um desvio de car�ter, um fracasso f�sico e moral, uma inabilidade de ‘comer menos’, entre outros fatores, cuja vis�o � sistematizada em pr�ticas coloniais e pouco humanas e sociol�gicas no que diz respeito aos corpos.
J� obesidade, como j� falei aqui nesta coluna
, � um termo criado pela medicina exclusivamente para designar os corpos gordos com alguma comorbidade, mas empregado erroneamente a todos os corpos gordos. Enquanto o �ndice de Massa Corporal (IMC) criado em 1832 pelo matem�tico Lambert Adolphe Jacques Quetelet for o �nico indicador de corporeidade, viveremos numa sociedade que atua no preterimento das pessoas gordas.
Sabemos que o termo obesidade foi constru�do a partir de um paradigma cient�fico patriarcal e mercadol�gico e, por conseguinte, tratar destes corpos em lugar de combate �, essencialmente, querer exterminar as pessoas gordas do mundo.
Pode parecer absurdo, mas, a grande quest�o �: por que voc� quer exterminar corpos gordos?

Antes que os defensores de ‘mas � uma quest�o de sa�de’ apare�am, vamos pensar: ningu�m aqui est� negando que todos os corpos, de todas as pessoas precisam de sa�de, inclusive, parte da proposta � que esta seja acess�vel a todes e n�o apenas a pessoas magras.
Que tal se aproveitarmos a data para refletir sobre como a gordofobia afeta gravemente nossa sa�de f�sica e mental e nos trata como doentes que n�o merecem sequer tratamento humano e digno, distorcendo a vis�o da medicina acerca dos nossos corpos e nos trazendo consequ�ncias graves.
E, se de tudo, for uma quest�o de sa�de, me diga: voc� hostiliza e maltrata uma pessoa doente? Pois �. Ent�o por que faz isso com pessoas gordas?
Minha proposta - e de outras pessoas que s�o atividades na pauta - � que o dia de hoje seja ressignificado e, ao inv�s de t�ticas absurdas para emagrecimento (ch�s que provocam a morte, express�es como ‘estupro alimentar’, dietas restritivas e proibitivas, cirurgias mutiladoras, etc) sejam pensadas formas de humaniza��o dos corpos dissidentes, deixando de lado a patologiza��o.
A ideia � que este dia seja para celebrarmos nossas exist�ncias em nossos corpos gordos - sem que sejamos for�ades a mudar, a emagrecer, a deixar de ser quem somos - a, literalmente, desaparecer , em nome de uma sociedade gordof�bica, patologizante e eugenista.
Que esta data, ao inv�s de combater nossas exist�ncias, seja para reivindicarmos nossa autonomia e liberdade corporal de forma individual e tamb�m coletiva. Que nos seja resguardado o direito de habitar o mundo do tamanho que somos e que haja sa�de e dignidade para isso.
A sugest�o � que nesta data, as pautas sobre procedimentos est�ticos, cir�rgicos e disfar�ados de preocupa��o com a sa�de sejam substitu�dos por acolhimento e pelo fim da discrimina��o, �dio e rejei��o dedicados aos corpos que n�o est�o no que � chamado e lido como padr�o.
Se nosso desejo � realmente buscar a sa�de, que comecemos a combater, de fato, quem nos tira ela: a gordofobia.
Que o �nico combate aceit�vel seja aquele contra a viol�ncia que massacra nossas exist�ncias.
Vamos?