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O 'tigre de papel' e o novo coronav�rus desnudam a nossa hist�ria

O presidente Bolsonaro parece possu�do por um v�rus vindo das trevas, uma cepa que sobrevive em ambiente de produ��o e de ca�a incessante a inimigo interno


postado em 19/04/2020 04:00 / atualizado em 18/04/2020 22:43

Pesquisador manipula teste do novo coronavírus na UFMG. Humanidade vive tempo sombrio com pandemia da COVID-19 (foto: Gladston Rodrigues/EM/D.A Press )
Pesquisador manipula teste do novo coronav�rus na UFMG. Humanidade vive tempo sombrio com pandemia da COVID-19 (foto: Gladston Rodrigues/EM/D.A Press )

Tigre de papel � uma express�o chinesa. Tamb�m � chinesa a origem do novo coronav�rus. Contudo, v�rus n�o tem territorialidade, nacionalidade. � planet�rio. Portanto, n�o h� um “v�rus chin�s”. Exemplo disso � a t�o impropriamente denominada “gripe espanhola”, de 1918, que matou de 50 a 100 milh�es de pessoas. Ela irrompeu nos Estados Unidos, at� tomar conta do planeta. Era o final da 1ª Grande Guerra. Foi avassaladora e devastadora entre os soldados de regresso aos seus pa�ses de origem. Expandiu-se mortalmente entre as popula��es nacionais.

Com a diferen�a de quase dois s�culos, Estados Unidos e China fizeram duas revolu��es. A primeira, a Revolu��o Americana de 1776, fundou a democracia moderna, como at� hoje a conhecemos. Consolidou-se. Hoje, a democracia � um modo de viver e de resolver tens�es que, al�m do Ocidente desenvolvido, encontrou solo f�rtil nas Am�ricas, na �frica e na �sia. � um valor universal.

Na China, a Revolu��o de 1949, liderada por Mao Ts�-Tung e pelo Partido Comunista, de in�cio anti-imperialista e de luta pela independ�ncia nacional, uma vez no poder, passou ao socialismo. Em nome da igualdade, dispensou a liberdade. Em nome do socialismo, proibiu a iniciativa privada. Em seus escritos o l�der chin�s muito utilizou a express�o “tigre de papel” para indicar ao povo que o imperialismo neocolonial de ocupa��o territorial, o japon�s e o praticado por cinco pot�ncias capitalistas ocidentais, n�o era invenc�vel.

Tr�s d�cadas adiante, a China tornou-se, al�m de uma grande na��o, uma pot�ncia econ�mica industrial, tecnol�gica, comercial e financeira. No ano de 1970, o PIB da China e do Brasil eram id�nticos. Cinquenta anos mais tarde, o PIB chin�s � de US$ 10 trilh�es e o do Brasil, US$ 1,8 trilh�o. Destino? N�o: escolhas!

No ano de 1800, o PIB dos Estados Unidos era id�ntico ao do Brasil. Hoje, supera os US$ 20 trilh�es, o dobro do chin�s. Destino? No s�culo 19 os Estados Unidos fizeram em seu pa�s uma revolu��o na revolu��o. Aboliram a escravid�o ao pre�o de um Guerra Civil e realizaram a maior reforma agr�ria da hist�ria humana. Os americanos fundaram seu pa�s ap�s vencerem o colonialismo ingl�s. Para ocuparem o gigantesco territ�rio, abriram as terras aos imigrantes e dela fizeram uma esp�cie de “terra prometida”. Da� a not�vel expans�o do capitalismo no pa�s e o maior mercado econ�mico interno.

No S�culo 20, durante a 2ª Grande Guerra, os chineses livraram-se da domina��o japonesa, que ocupou parte do seu territ�rio por mais de 30 anos. Antes, haviam se livrado da chamada domina��o estrangeira das cinco pot�ncias ocidentais europeias. De certa forma os chineses tiveram raz�o ao comparar as pot�ncias imperialistas com um tigre de papel. Fixaram-se como na��o independente. Venceram e gradualmente passaram do socialismo com pobreza e fome a um tipo bem singular de capitalismo globalizado combinado com capitalismo de Estado e uma poderosa burocracia e tecnocracia, t�cnica, hier�rquica, disciplinada, coletivista, de matriz cultural e filos�fica confuciana, uma cultura proveniente da China imperial antiga. O partido �nico na China abriga, de fato, uma elite governamental confuciana, autorit�ria e pragm�tica.

Com a queda do muro de Berlim e o colapso mundial do chamado “socialismo real”, em 1989, a China manteve-se e deu curso a uma das mais interessantes transforma��es econ�micas e sociais contempor�neas, de tipo p�s-comunista. Isso, ap�s a morte de Mao Ts�-Tung. Os l�deres chineses j� n�o s�o comunistas h� tempos. O pa�s possui uma classe empresarial poderosa e uma vast�ssima e crescente classe m�dia urbana, uma classe oper�ria urbano-industrial e um vasto campesinato. Eliminou a mis�ria e a pobreza absoluta, que o anterior regime comunista de Mao Ts�-Tung s� fizera expandir. Na China, ap�s a morte de Mao, Conf�cio e o capitalismo sepultaram o comunismo mao�sta, sem ruptura aparente.

Na d�cada de 1960 e em especial no ano de 1968, o socialismo cubano e o chin�s desfrutaram de grande prest�gio, por sua grande atratividade discursiva e ideol�gica, entre grande parte dos jovens universit�rios da Am�rica Latina. A sintaxe ou a linguagem das duas revolu��es foi por eles assimilada, junto com os respectivos “modelos” de revolu��o. No ano de 1968, a esquerda revolucion�ria brasileira dividia-se basicamente entre o guevarismo e o mao�smo.

Guevaristas eram os seguidores da vis�o de Ernesto Che Guevara sobre a Revolu��o Cubana. Segundo Guevara, uma vanguarda armada guerrilheira tudo podia, pois, estabelecera, a guerrilha faz a vanguarda e a vanguarda faz a revolu��o. Seria at� mesmo capaz de derrotar as ditaduras civil-militares latino-americanas e, com elas, o “imperialismo” norte-americano. O sonho da imagina��o dava, ent�o, como certo que o “imperialismo” era a �ltima etapa do capitalismo e que se aproximava a chamada crise catastr�fica e global do sistema. A estrat�gia revolucion�ria a ser adotada era o cerco revolucion�rio do capitalismo central pela revolu��o permanente no Terceiro Mundo, o elo mais fr�gil da cadeia de domina��o.
Por sua vez, o mao�smo sustentava a tese da pr�via organiza��o de uma alian�a oper�rio-camponesa sob a dire��o do partido comunista. Propunha a revolu��o como um cerco da cidade pelo campo, em uma revolu��o por etapas, envolvendo a��o pol�tica e alian�as, mais hegemonia. O guevarismo defendia o “comando da pol�tica pelo fuzil”; o mao�smo, o “comando do fuzil pela pol�tica”. Foram derrotados ao mesmo tempo em toda Am�rica Latina. O “imperialismo” e as suas “ditaduras funcion�rias” eram, para ambos, um “tigre de papel”, que os liquidou militarmente em combate t�o desigual.

O colapso do “socialismo real” e suas proverbiais ditaduras, em 1989, e a queda da URSS, em 1991, evidenciaram que, o “tigre de papel”, na ocasi�o, o capitalismo com democracia, triunfara globalmente sobre a revolu��o permanente de Guevara e o mao�smo. A democracia, a grande vitoriosa, triunfara em toda Am�rica Latina ao p�r abaixo, em uma d�cada, de 1980 a 1990, o ciclo das ditaduras militares e seu del�rio de uma contrarrevolu��o permanente.

Hoje, em tempo sombrio da pandemia do novo coronav�rus, essa cr�nica sobre utopias que se transformaram em distopias autorit�rias e sobre os usos da express�o “tigre de papel” parece adequada para retirar do esquecimento a c�lebre express�o chinesa. Pois enquanto o mundo converge no combate � pandemia como um inimigo devastador, invis�vel, altamente contagioso e de alta letalidade, al�m de ainda t�o desconhecido, decidido a aplicar, em larga escala, ou o “lockdown” (Alemanha, por exemplo) ou o isolamento social prolongado e sucessivamente renovado como estrat�gias eficazes de conten��o da velocidade de expans�o do cont�gio, aqui, no Brasil, o presidente Jair Messias Bolsonaro insiste e persiste em afirmar e reafirmar que a Covid 19, uma “gripezinha” (fevereiro), “j� est� indo embora” (abril), precisamente quando a epidemia est� no meio de n�s em situa��o de crescimento quase exponencial.

Provavelmente assim ser� at� junho. Como se comprova, o novo coronav�rus ou, como quer Bolsonaro, o novo “tigre de papel” n�o poderia encontrar em todo o mundo um aliado preferencial t�o solid�rio. Como se v�, o v�rus guarda forte semelhan�a com as ditaduras: arrebata ou assalta o poder “pelo alto” para melhor exercer a sua pot�ncia destrutiva ao espalhar dor, ang�stia, sofrimento e morte. O presidente parece possu�do por um v�rus vindo das trevas, uma cepa que somente sobrevive em um ambiente de produ��o e de ca�a incessante a inimigos internos: o �dio, que move a contrarrevolu��o permanente do bolsonarismo no poder. Ah, esse v�rus n�o � brasileiro! Vacina: mais democracia.

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