
Casa de eleitos pelo voto majorit�rio, o Senado trabalhou uma estrat�gia de redu��o de danos em raz�o da pol�mica sobre as regras de presta��o de contas dos partidos nas campanhas eleitorais. Como se sabe, a C�mara mudou essas regras para reduzir o controle do Tribunal Superior Eleitoral(TSE), abrandar as medidas punitivas e proteger os dirigentes partid�rios envolvidos em irregularidades, o que provocou forte rea��o da opini�o p�blica e de organiza��es n�o-governamentais que atuam no campo da transpar�ncia em rela��o ao uso de recursos p�blicos.
Relator do projeto, o senador Weverton Rocha (PDT-MA) chegou a fazer tr�s altera��es no texto com o objetivo de tentar aprovar a proposta a tempo de as mudan�as valerem para as elei��es de 2020. Mesmo assim, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), anunciou que a Casa rejeitaria, na �ntegra, o projeto de lei que prop�e a flexibiliza��o das regras eleitorais e partid�rias. O pr�prio Alcolumbre havia inclu�do a mudan�a como o primeiro item da pauta de vota��o de plen�rio, ontem, mas enfrentou forte rea��o de um grupo de parlamentares e de entidades da sociedade civil, que pressionaram os senadores pelas redes sociais e visitaram seus gabinetes.
'A cria��o de um fundo eleitoral com recursos p�blicos, al�m do fundo partid�rio, al�m de exigir mais controle e transpar�ncia, acirrou as contradi��es internas nos partidos'
Alcolumbre convocou uma sess�o extraordin�ria da Comiss�o de Constitui��o e Justi�a (CCJ) para definir o fundo eleitoral, o chamado “fund�o”, usado pelos partidos em ano de elei��es, mas sem mudan�a de regras. “O valor do financiamento de campanha ser� mantido e as demais regras ser�o rejeitadas”, garantiu o presidente do Senado. O financiamento dos partidos e das suas campanhas eleitorais � um assunto mal-resolvido pelos pol�ticos, porque a decis�o de proibir o financiamento por parte de empresas e exercer maior controle sobre as doa��es eleitorais foi do Supremo Tribunal Federal (STF) e n�o do Congresso.
At� ent�o, havia duas fontes diferentes de financiamento da pol�tica: o fundo partid�rio, com recursos p�blicos, que era gerenciado pelas dire��es dos partidos, e as doa��es eleitorais, que eram destinadas aos candidatos individualmente, por pessoas f�sicas e jur�dicas, via campanhas eleitorais. Esse sistema n�o eliminou a antiga pr�tica de caixa dois eleitoral, na qual empresas e empres�rios doavam recursos para as campanhas sem declar�-los � Justi�a Eleitoral. Esse tipo de pr�tica provocou duas grandes crises pol�ticas: em 1992, a CPI do PC Farias, alus�o ao tesoureiro da campanha de Fernando Collor de Mello � Presid�ncia da Rep�blica, que resultou no seu impeachment; e, em 2005, a crise do mensal�o, que quase derrubou o ent�o presidente Luiz Ign�cio Lula da Silva e provocou a pris�o de toda c�pula do PT, que foi condenada pelo Supremo, em decorr�ncia da CPI dos Correios.
Caixa dois
Ao contr�rio de fazer uma reforma eleitoral que mudasse radicalmente esse sistema de financiamento, os grandes partidos resolveram sofisticar ainda mais o esquema de caixa dois, utilizando as doa��es eleitorais para lavar o dinheiro desviado de obras e servi�os p�blicos por grandes empreiteiras e outras empresas. O colapso do sistema ocorreu ap�s o esc�ndalo da Petrobras, que passou a ser investigado pela for�a-tarefa da Lava-Jato, principalmente depois da dela��o premiada da Odebrecht, que entregou quase toda a documenta��o relativa ao seu caixa dois destinado � propina, denominado de "departamento de opera��es estruturadas". A investiga��o resultou na pris�o de centenas de executivos, servidores p�blicos e pol�ticos, entre os quais o ex-presidente Luiz In�cio Lula da Silva.
De certa forma, o sistema de financiamento favoreceu a prolifera��o dos partidos, porque a distribui��o do fundo partid�rio � proporcional ao n�mero de deputados eleitos por cada legenda. Criou-se no Congresso, principalmente na C�mara, uma esp�cie de "mercado” no qual o troca troca de partidos esteve fortemente associado � partilha dos recursos do fundo partid�rio entre os "donos”das legendas e suas bancadas. Em tese, os partidos passaram a funcionar como uma esp�cie de franquia, na qual sempre haveria lugar para um deputado federal em cada estado, que levaria o tempo de televis�o e seu quinh�o do fundo partid�rio.
Havia um pacto perverso entre a c�pula da maioria dos partidos e os candidatos. Os dirigentes gerenciavam o fundo partid�rio de acordo com seus interesses e prioridades; os candidatos corriam atr�s de seus financiadores de campanha, muitas vezes em troca de favorecimento na contrata��o de obras e servi�os ou na aprova��o de projetos de leis nas casas legislativas. Funcionava a Lei de Murici: cada um tratava de si. Com o fim das doa��es de empresas, por�m, esse pacto se tornou mais complexo, porque aumentou o poder dos caciques partid�rios, em especial dos "donos”de partido, sobre os candidatos.
A cria��o de um fundo eleitoral com recursos p�blicos, al�m do fundo partid�rio, por�m, al�m de exigir maior controle da Justi�a Eleitoral e transpar�ncia, acirrou as contradi��es internas nos partidos, por causa da caixa preta na gest�o financeira e na distribui��o dos recursos entre os candidatos, ainda mais porque a falta de crit�rios objetivos na distribui��o dos recursos sempre acaba revelada nas presta��es de contas. Por isso, o que antes era uma maneira de manter um r�gido controle sobre a estrutura partid�ria est� se tornando um fator desestabilizador para os "donos”de partido.