
H� um jarg�o no Congresso sobre as comiss�es de inqu�rito sem exce��o � regra: todos sabem como come�a, mas ningu�m sabe como vai acabar. H� casos de CPI que tiveram grande repercuss�o pol�tica, inclusive com cassa��o de mandatos de parlamentares, como a dos Correios, que revelou o chamado mensal�o; h� outras que viraram pizza, como a do Banestado, que n�o aprovou seu relat�rio, que pretendia indiciar 91 pessoas que fizeram transfer�ncias de recursos para o exterior por aquele banco estadual. A Comiss�o Parlamentar Mista de Inqu�rito (CPMI) dos atos golpistas de 8 de janeiro est� limbo das incertezas quanto ao seu final, mas n�o deve ser subestimada. H� muita �gua para passar sob a ponte.
As contradi��es da CPI t�m origem germinal: foi proposta pela oposi��o, por iniciativa de um deputado de perfil golpista. O governo tentou por todos os meios evitar que fosse instalada, mas havia um requerimento com n�mero suficiente de assinaturas e o presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), instalou a CPMI. Diante do fato consumado, o Pal�cio do Planalto finalmente se mobilizou para formar maioria na comiss�o, que � um instrumento de oposi��o das minorias. Conseguiu.
Maia chegou a ter uma conversa com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, respons�vel pelo inqu�rito que investiga os atos golpistas de 8 de janeiro, em 14 de junho do m�s passado, para solicitar o compartilhamento de dados das investiga��es da Pol�cia federal com a CPMI. “Tive uma longa reuni�o com o ministro, e ele se comprometeu a compartilhar dados assim que chegar a nossa requisi��o, para que os membros da CPMI tenham acesso para inquirir esses presos”, anunciou na ocasi�o.
N�o rolou at� agora. Na ter�a-feira, a relatora Eliziane Gama queixou-se de que estava trabalhando apenas com as “not�cias de jornal”, porque ainda n�o havia recebido os dados nem do STF nem da Pol�cia Federal. Na oitiva do ex-diretor-geral da Pol�cia Rodovi�ria Federal (PRF) Silvinei Vasques, por exemplo, logo no in�cio da CPMI, ficou evidente que a relatora n�o tinha informa��es suficientes para p�r em xeque o seu depoente, que falou pelos cotovelos, enquanto a oposi��o exultava.
J� no seu depoimento, o tenente-coronel Mauro C�sar Barbosa Cid, que foi ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, suspeito de articular uma interven��o militar contra o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ap�s as elei��es do ano passado, teve comportamento radicalmente contr�rio: n�o disse uma palavra, exceto que permaneceria em sil�ncio, por responder a oito inqu�ritos no STF. Eliziane s� n�o estava de m�os vazias porque havia recebido a lista dos 72 amigos de Mauro Cid, a maioria militares, que o haviam visitado na pris�o.
Como se sabe, uma per�cia da Pol�cia Federal (PF) no telefone celular do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro revelou trocas de mensagens com outros militares, tratando de a��es que configurariam um golpe de Estado. As mensagens foram vazadas para a imprensa quando tudo parecia que a CPMI viraria pizza e, depois, tornadas p�blicas pela Justi�a. Um dos seus interlocutores, o coronel Jean Lawand Junior, j� dep�s � CPMI. Ele negou as alega��es, mas teve sua vers�o contestada pelos parlamentares e pode ser indiciado por falso testemunho.
Mauro Cid fora obrigado a depor na CPMI pela ministra C�rmen L�cia, do Supremo Tribunal Federal (STF), por�m acompanhado por advogados e com o direito de ficar em sil�ncio para n�o responder perguntas que o incriminassem. Como est� sob cust�dia da Justi�a, tamb�m recebeu escolta policial. Compareceu fardado, com o cord�o de ajudante de ordens, o que n�o havia ocorrido com Lawand. Mauro Cid tamb�m teve conversas com outro auxiliar do ex-presidente, Ailton Barros, advogado e ex-major do Ex�rcito, nas quais fica evidente a trama golpista. Numa das conversas, o ex-militar disse saber quem mandou matar a vereadora carioca Marielle Franco (PSol).
Dois fatos relevantes podem ter desdobramentos futuros. O primeiro � a romaria ao quartel onde Mauro Cid est� preso, por v�rios oficiais de sua corpora��o, entre os quais o general ex-comandante do Ex�rcito J�lio C�sar de Arruda, demitido pelo presidente Lula ap�s o 8 de janeiro. Outro, a quebra de sigilo fiscal de quase 70 envolvidos nos acontecimentos, entre os quais bolsonaristas-raiz, al�m de algumas empresas suspeitas de financiar os atos golpistas. Seguindo o dinheiro, sempre se chega ao n�cleo principal da conspira��o.
A expectativa de Eliziane Gama � que esses requerimentos subsidiem a atua��o da equipe que a assessora, que re�ne t�cnicos do Senado, da Receita e dois delegados federais, durante o recesso. Entretanto, os dados dos inqu�ritos sob sigilo n�o ser�o fornecidos pela Pol�cia Federal. O ministro do STF Alexandre de Moraes, que poderia faz�-lo, tem sido muito cauteloso. Empenhado na aprova��o de sua agenda econ�mica pelo Congresso, o governo tamb�m puxou o freio de m�o na CPMI. A radicaliza��o atrapalha a alian�a com o Centr�o.