
A morte de tr�s m�dicos ortopedistas, assassinados a tiros Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, na madrugada de ontem, recolocou a quest�o da seguran�a p�blica naquele estado no centro das prioridades pol�ticas do pa�s. A execu��o, que durou menos de um minuto, ocorreu na Avenida L�cio Costa, o grande cal�ad�o � beira-mar do bairro preferido da classe m�dia emergente e dos novos ricos do Rio de Janeiro
Marcos de Andrade Corsato, de 62 anos, e Perseu Ribeiro Almeida, de 33, morreram no local. Diego Ralf Bonfim, de 35, foi socorrido e enviado ao hospital, mas n�o sobreviveu. Irm�o da deputada federal S�mia Bonfim (Psol-SP) e cunhado do tamb�m deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ), a morte de Bonfim deu mais repercuss�o pol�tica ao crime, porque os dois parlamentares j� foram amea�ados de morte. Daniel Sonnewend Proen�a � o �nico sobrevivente.
Os quatro profissionais estavam hospedados num hotel da rede Windsor, na Barra, com objetivo de participar do 6º Congresso Internacional de Cirurgia Minimamente Invasiva do P� e Tornozelo, que come�ou ontem. O turismo � uma atividade muito din�mica da economia carioca. Esse tipo de crime, defronte ao hotel, afasta turistas e dificulta a capta��o de eventos nacionais e internacionais.
Tudo indica que os m�dicos foram mortos por engano, porque um deles, Perseu Almeida, teria sido confundido com Taillon Barbosa, de 26 anos, acusado de liderar um grupo de milicianos que atua em Rio das Pedras e Muzema, que mora pr�ximo ao local e ali circula sem problemas. O miliciano, muito parecido com o m�dico morto, estaria num quiosque ao lado. O governador Cl�udio Castro (PL) e o ministro da Justi�a, Fl�vio Dino (PSB), anunciaram que tudo far�o para esclarecer o crime.
O Rio de Janeiro exporta o modelo de territorializa��o para explora��o de neg�cios mafiosos, al�m do tr�fico de drogas, para outros estados. Toda a sociedade sofre suas consequ�ncias, mas tamb�m n�o se deu conta de que � preciso mudar radicalmente a forma de combat�-lo. A viol�ncia policial n�o resolve o problema. A territorializa��o do crime organizado, que controla grandes �reas da cidade, entre as quais a Barra da Tijuca, passou para uma fase em que n�o h� mais fronteiras f�sicas.
O caso Marielle Franco, assassinada pelo chamado Escrit�rio do Crime, que teve muita repercuss�o e foi elucidado pela Pol�cia Federal, n�o provocou nenhuma mudan�a estrutural na forma como a seguran�a p�blica lida com o crime organizado e as �reas sob seu controle no Rio de janeiro. A �nica tentativa de combater a territorializa��o ocorreu durante o governo S�rgio Cabral, mas fracassou por causa do caso Amarildo e dos esc�ndalos de corrup��o que levaram � pris�o o ex-governador fluminense.
O ajudante de pedreiro Amarildo de Souza, no dia 14 de julho de 2013, foi sequestrado e morto por 12 policiais militares da Unidade de Pol�cia Pacificadora (UPP) da Rocinha, na Zona Sul do Rio. O corpo nunca foi localizado, mas todos foram condenados, inclusive o major da PM Edson Raimundo dos Santos, a 13 anos e 7 meses de pris�o, por ser considerado autor intelectual do crime. Era o comandante da UPP Rocinha desde a sua inaugura��o.
Naturaliza��o
Jogou-se fora a experi�ncia de ocupa��o dos territ�rios antes controlados pelo tr�fico, com a �gua da bacia; esse espa�o vem sendo ocupado pelas mil�cias, que praticam os mesmos crimes, em conluio com a banda podre da pol�cia. Explora-se o g�s, as vans, os motoboys, o com�rcio local, o “gatonet”, a distribui��o de �gua e a energia solar. � uma economia paralela controlada por organiza��es criminosas.
“Rio de ladeiras/ Civiliza��o encruzilhada/ Cada ribanceira � uma na��o/ � sua maneira/ Com ladr�o/ Lavadeiras, honra, tradi��o/ Fronteiras, muni��o pesada/ S�o Sebasti�o crivado/ Nublai minha vis�o/ Na noite da grande/ Fogueira desvairada”, a bela can��o Esta��o derradeira, de Chico Buarque, traduz a naturaliza��o da viol�ncia e a ocupa��o de territ�rios pelo crime organizado no Rio de Janeiro.
N�o faltam estudos sociol�gicos e criminol�gicos sobre o problema. Desde os anos 1980, o fen�meno � estudado. No plano internacional, o poder das empresas da economia il�cita dedicada � produ��o e distribui��o de drogas, conhecidas como carteis, ganhou propor��es gigantescas. No plano nacional, a venda de drogas no varejo era a principal fonte de renda das organiza��es criminais locais, que agora expandem seus neg�cios para controlar a produ��o e rotas de distribui��o de drogas no Norte e Nordeste, al�m de fronteiras, portos e aeroportos do Sul, Centro Oeste e Sudeste.
Comando Vermelho (CV) e Terceiro Comando, no Rio de Janeiro, e do Primeiro Comando da Capital (PCC), em S�o Paulo, hoje s�o organiza��es com m�ltiplos neg�cios, da venda de combust�vel no ABC a garimpos ilegais na Amaz�nia. Com o crescimento dos neg�cios, as disputas por territ�rio e a concorr�ncia da mil�cia, quase sempre associada � pol�cia, se tornaram mais frequentes e violentas.
�s vezes, as for�as policiais entram em a��o quando os milicianos est�o em apuros na guerra com o tr�fico de drogas, como vem acontecendo na Baixada Fluminense. O poder do crime organizado nas favelas e periferias das grandes cidades tamb�m se tornou uma for�a pol�tica. Se��es eleitorais inteiras s�o controladas por traficantes e milicianos, que passaram a ter influ�ncia decisiva na elei��o de vereadores, prefeitos e deputados.
