No momento em que escrevo a coluna desta semana, estou me preparando para voltar ao Brasil 24 dias ap�s chegar no Malawi, no continente africano. Desde 2019, me esfor�o para vir at� aqui ao menos uma vez por ano para rever amigos e acompanhar a evolu��o da oficina de costura que montamos no projeto Na��o Ubuntu da ONG Fraternidade Sem Fronteiras.
Fazemos um trabalho junto a refugiados que vivem no campo de Dzaleka. Atualmente s�o cerca de 55 mil pessoas vindas principalmente da Rep�blica Democr�tica do Congo, Burundi e Ruanda. Conflitos tribais, persegui��es pol�ticas e familiares s�o as maiores raz�es que as trouxeram para c� e o medo de serem mortas � o que as impede de retornar �s suas p�trias.
Desta vez os refugiados estavam ainda mais tensos. Isso porque o governo do Malawi apertou o cerco contra aqueles que escolheram viver fora de Dzaleka. A grande maioria tem permiss�o de circular, viver, trabalhar e estudar apenas nos limites do campo.
Como s�o muito pequenas as oportunidades l� dentro, alguns se aventuram e v�o ganhar a vida na capital. Montam pequenos neg�cios, conseguem colocar os filhos na escola, se permitem sonhar novamente. H� cerca de dez dias 450 deles, idosos, adultos e crian�as foram arrancados de suas casas e jogados na pris�o.
O grande problema � a forma como s�o tratados quando presos. Sobre eles recaem todos os problemas que o pa�s enfrenta, como se fossem os grandes culpados de o Malawi ocupar o posto de quarto pa�s mais pobre do mundo, onde o sal�rio-m�nimo � de 35 d�lares, o n�vel de desemprego elevado e a renda per capita de 1,66 d�lares.
Ficaram amontoados por tr�s dias e depois trazidos de volta para Dzaleka. Mais uma vez perderam tudo. Apenas com a roupa do corpo, partiram a procura de um novo lugar para se instalar nos limites do campo que foi criado em 1994 para receber at� dez mil pessoas.
Antes disso Dzaleka funcionava como uma pris�o para onde eram encaminhados os condenados pelos piores crimes. Dzaleka em chichewa, l�ngua da maioria dos nativos do Malawi, significa: fim da linha.
Em meio a uma mis�ria material incalcul�vel e a traumas psicol�gicos capazes de sucumbir a maioria de n�s, eles resistem. Levantam antes do sol de cada dia, louvam a Deus e seguem com a f� de que chegar� o tempo em que a fome, a falta de ocupa��o e o abandono, estes sim, chegar�o ao fim.