
A data de hoje, 8 de maio, � significativa. Lembra o dia em que os sinos dobraram para comemorar o fim da carnificina da 2ª Guerra Mundial na Europa. Nesse dia, em 1945, muitas m�es, que amanh� homenageamos, choraram l�grimas de alegria pelo retorno de seus filhos, s�os e salvos do horror e da matan�a. Vivemos, no Brasil atual, uma matan�a silenciosa que nos consome por dentro porque estamos todos dentro de uma guerra de sobreviv�ncia individual e coletiva contra um ceifador de vidas cruel, o COVID 19. Passar�. Mas ficar� o aprendizado de respeito e sensibilidade � “pessoa da casa ao lado”? Pelo encaminhamento tortuoso das quest�es mais relevantes do nosso pa�s hoje, pelas atitudes sect�rias das principais lideran�as, pela estupidez de muitas “solu��es” apresentadas, temo que a escalada de conflitos est� longe de cessar no nosso teatro de guerra fratricida.
Por Quem os Sinos Dobram � o t�tulo de um cl�ssico americano, de Ernest Hemingway. Recomendo. O romance se passa na guerra civil espanhola, onde todos se matam entre irm�os, parentes e vizinhos. Visto em retrospectiva hist�rica, o conflito � de uma burrice in�til e sangrenta que, no entanto, arrastou milh�es de espanh�is a uma posi��o de total radicalismo, s� resolvido pelo sangue. No Brasil atual, sobram exemplos de atitudes radicais, mais perigosas e letais do que o pr�prio coronav�rus.
Onde falta a leitura correta da realidade, despontam as paix�es cegas, alimento dos conflitos e da destrui��o m�tua. N�o � sintoma exclusivo nosso, brasileiro, porque corresponde a um desdobramento mundial do v�rus sobre as economias e as sociedades: a explos�o das desigualdades e suas sequelas. Entre estas, a morte � a principal: por que se foi uma not�vel pessoa como Paulo Gustavo e n�o eu? As desigualdades s� come�am por ai. Avan�am por amplos campos de injusti�a social. Por que, nesse ano de crise extrema, o caixa e a liquidez das grandes empresas e bancos aumentou (dados de balan�os e das bolsas) enquanto pequenos e m�dios empres�rios s�o dizimados?
Por que uns poucos milh�es t�m empregos p�blicos e ganhos assegurados em casa, enquanto muitos milh�es penam a perda de emprego ou cortes salariais nos setores diretamente produtivos? Por que o inimigo comum – o COVID - vira guerra pol�tica e espet�culo de CPI, quando deveria ser o motivo de uni�o nacional e gerar programa de supera��o desta e de outras mazelas?
A vizinha Col�mbia, pa�s cheio de riquezas e grande povo, nos oferece pista para nossas indaga��es. Semana passada eclodiu violento conflito de rua, com 19 mortos entre agentes da ordem e manifestantes. Em v�rias cidades e na capital, Bogot�, o povo se insurgiu contra o que o governo chamava, ladinamente, de “reforma tribut�ria”. Aqui temos o mesmo problema: h� gente, dentro e fora do governo, que defende uma reforma tribut�ria com aspas, porque voltada – por mais est�pido que seja – a querer extrair uma renda extra dos MENOS capazes de pagar para favorecer os que podem mais na sociedade.
Em plena pandemia de desigualdades gritantes, na Col�mbia e no Brasil os pol�ticos se dedicam a debater projetos para agravar a vida dos mais pobres e para desonerar os que n�o perderam nada na crise. O contradit�rio j� se evidenciou de modo sangrento nas ruas da Col�mbia. Aqui, um relator da “reforma tribut�ria” dos ricos, chamada de PEC 45, insistia, ainda esta semana numa comiss�o da C�mara, em onerar as al�quotas de alimentos, de escolas, de assist�ncia m�dica. O presidente da C�mara sustou a iniciativa, mas haver� grupos de interesse tentando retomar a proposta dentro do pr�prio governo, com outro nome e outra sigla de tributo.
O Brasil j� fez reformas tribut�rias dignas desse nome pomposo. Antes de reformar sobre o bolso da popula��o, lideran�as pol�ticas deveriam olhar para o que elas mesmas autorizam os governos a gastar, pois � no controle do gasto que nasce qualquer boa reforma tribut�ria. A boa reforma atende a princ�pios de bom senso: vou pagar menos? Vai ser mais simples pagar? Ser� mais justo para os mais pobres? Tornar� nossas empresas mais fortes e o governo menos inchado? Se as respostas forem todas positivas, vamos em frente. Como n�o s�o, melhor n�o insistir, pois podemos parar na Col�mbia.