
Dependendo do tamanho do bloqueio e do setor atingido, � natural que surjam reclama��es e, n�o raro, interpreta��es nem sempre corretas e �s vezes desonestas sobre os prop�sitos do contingenciamento. Afinal, muita gente pensa que o dinheiro dos impostos � inesgot�vel, al�m daqueles que s� aceitam cortes no or�amento dos outros.
Todo esse pre�mbulo � para dizer o que representa o bloqueio de R$ 35 bilh�es de verbas do Or�amento da Uni�o para este ano, anunciado na sexta-feira. � mais do que o dobro do contingenciamento divulgado no in�cio do ano passado, de R$ 16,2 bilh�es, mas fica abaixo dos R$ 42,1 bilh�es contingenciados em 2017, no auge da recess�o econ�mica.
No bloqueio de 2019, os destaques s�o os cortes transit�rios nos or�amentos da Educa��o (R$ 5,83 bilh�es), da Defesa (R$ 5,10 bilh�es) e da Infraestrutura (R$ 4,30 bilh�es), al�m da destina��o de R$ 5,3 bilh�es para a reserva. O or�amento da sa�de ficou praticamente intacto porque suas dota��es j� estavam muito perto do m�nimo legal obrigat�rio, enquanto o da educa��o estava bem acima do piso legal.
O contingenciamento de verbas no in�cio de cada exerc�cio � uma medida prevista na Constitui��o de 1988. Ela se deve ao fato de que, ao contr�rio do que ocorre na maioria dos pa�ses civilizados, a legisla��o or�ament�ria brasileira n�o obriga o Executivo a realizar os gastos autorizados pelo Legislativo, mesmo que haja receita sobrando. Mas, de outra parte, veda a contrata��o de despesas al�m do or�amento aprovado.
Risco de impeachment
A Lei (Complementar) de Responsabilidade Fiscal, avan�o civilizat�rio que s� viria 22 anos ap�s a promulga��o da Carta Magna, define com clareza que o presidente, governadores e prefeitos n�o podem ir al�m do que foi autorizado, sem a pr�via comprova��o da exist�ncia de fundos. Desde 2014, ante o desarranjo das contas p�blicas, o Congresso Nacional tem aprovado or�amentos anuais com d�ficits previamente definidos, os quais tamb�m n�o podem ser ultrapassados, sob pena de condena��o por crime de responsabilidade fiscal.
Foi, ali�s, sob a acusa��o de haver cometido esse tipo de crime que a presidente Dilma Rousseff teve seu impeachment aprovado pelo Congresso Nacional em agosto de 2016. Depois disso, nenhum governante se disp�s a correr esse risco. Ante a perda de receitas tribut�rias provocada pela recess�o e o crescimento vegetativo das despesas, o bloqueio de verbas tornou-se frequente e at� mesmo inevit�vel para garantir o cumprimento das metas fiscais.
Esse bloqueio n�o � ilimitado. Pelo contr�rio, tem sido cada vez mais apertado. Isso porque, temendo a n�o realiza��o das despesas aprovadas, corpora��es ligadas aos setores da administra��o com maior poder de press�o, como sa�de e educa��o, for�am os pol�ticos a votarem pisos obrigat�rios para os minist�rios dessas �reas. Aos poucos, mais e mais pisos (percentuais m�nimos) foram engessando o Or�amento, num processo de vincula��es or�ament�rias que, somadas aos gastos inevit�veis com pessoal e aposentadorias, j� ultrapassam os 92% dos desembolsos totais do Tesouro.
Lentid�o permanece
Portanto, � muito pequena a margem de manobra de que disp�e hoje a administra��o para manter a m�quina funcionando com o custeio de R$ 34 bilh�es por ano e realizar algum investimento sem provocar d�ficit prim�rio maior do que os R$ 132 bilh�es autorizados pelo Congresso para 2019.
Al�m da urgente necessidade de estancar ou pelo menos reduzir a velocidade de expans�o do d�ficit previdenci�rio, o tamanho do contingenciamento atual sinaliza que o governo baixou suas expectativas quanto a um aumento expressivo da arrecada��o de impostos. J� n�o se espera crescimento da economia superior a 2,4% em 2019, devendo continuar lenta a recupera��o do mercado de trabalho. Algum al�vio poder� vir das privatiza��es e concess�es de servi�os p�blicos, mas tamb�m esse programa n�o deve ganhar tra��o este ano.
A economia, vale lembrar, n�o � uma ci�ncia exata (se fosse, seria mais f�cil). Ela trabalha com tend�ncias e, hoje, a soma da maioria delas indica que n�o voltaremos � recess�o, mas a supera��o de pesadas heran�as como o desemprego e a baixa confian�a dos agentes econ�micos ter� mais um ano de lentid�o. � nesse contexto que o rem�dio amargo do contingenciamento de verbas p�blicas faz todo o sentido. � uma quest�o de responsabilidade.