
� chocante que as pessoas n�o tenham percebido a brutal deteriora��o nas contas p�blicas causada pela forte subida dos gastos com a Previd�ncia dos servidores de 2011 para c�, diante do r�pido envelhecimento do contingente de ativos e outros motivos relevantes. Isso aconteceu tanto na Uni�o como nos estados e munic�pios. E, na verdade, essa situa��o continuar� se deteriorando at� quando se tomar alguma provid�ncia efetiva para corrigir a raiz do problema.
As estat�sticas oficiais est�o a� para comprovar esse resultado indesej�vel. Primeiro, os d�ficits correntes dos Regimes Pr�prios (RPPS) explodiram. Nos estados, entre 2006 e 2011, oscilavam entre R$ 22 e R$ 25 bilh�es. Dali em diante, s� cresceram, atingindo R$ 101,9 bilh�es em 2018, em estimativa preliminar. Por conta disso, os d�ficits or�ament�rios estaduais totais (maiores que os calculados pelo Banco Central, por serem apurados ainda com gastos autorizados e n�o com os transitados no Caixa), que oscilavam em torno de zero, subiram para a m�dia anual de R$ 18 bilh�es nos mandatos precedentes (2015-18). Da�, mesmo contrariando a Lei de Responsabilidade Fiscal, foram deixados atrasados cerca de R$ 100 bilh�es, para os atuais mandat�rios administrarem. Sem apoio da Uni�o, calotes s�o impetrados em fornecedores, e dirigentes se sujeitam a puni��es severas. � puro caos.
J� na Uni�o, que tem a vantagem de poder emitir moeda para financiar seus d�ficits totais, o d�ficit anual do RPPS acaba de se mostrar de magnitude compar�vel ao do conjunto dos estados: R$ 78,8 bilh�es em 2019. Da� a r�pida reviravolta dos resultados prim�rios superavit�rios (excedentes de receitas sobre gastos n�o-financeiros), observados at� 2013 e que haviam atingido o pico de R$ 93 bilh�es em 2011, para d�ficits acima de R$ 100 bilh�es desde ent�o. Ou seja, os chamados gastos obrigat�rios da Uni�o (que incluem os d�ficits dos RPPS) v�m, aos poucos, imprensando os gastos discricion�rios na parede, a ponto de estes, dado o famoso “teto dos gastos”, se situarem em n�veis incapazes de assegurar investimentos p�blicos m�nimos e gastos m�nimos tamb�m com o chamado custeio da m�quina.
� duplamente chocante, ent�o, que tantas autoridades e personagens ilustres se posicionem sem entrar nos detalhes de qualquer coisa, em uma defesa pura, simples e exacerbada da manuten��o do rec�m-criado teto de gastos (crescimento m�ximo dos gastos totais igual � infla��o anual, hoje ao redor de 2,3% ao ano), que poderia fazer sentido no apagar das luzes de um mandato conturbado como o de Temer, mas que hoje, lembrando que a reforma da Previd�ncia j� aconteceu e que n�o h� qualquer disposi��o do governo de enfrentar o desgaste de uma super morosa e inimagin�vel reforma administrativa no auge de uma pandemia t�o violenta e sem solu��o clara � vista como a atual.
No outro extremo, na linha do que disse Andr� Lara Resende em seu brilhante artigo na Folha de SP, de 17/05/20, para garantir que a raz�o d�vida/PIB n�o exploda em circunst�ncias como a atual, basta garantir, ap�s atingido o n�vel m�ximo p�s-pandemia, que o crescimento da economia exceda o da taxa de juros real (hoje, pr�xima de zero), o que requer que um m�nimo de investimento aconte�a. S� que, n�o apenas existe um forte vi�s anti-investimento privado em infraestrutura h� muito impregnado em nosso pa�s, que precisa, como tenho salientado aqui e ali, ser combatido, como agora, num momento em que a invers�o p�blica se torna fundamental, surgem os temores de que sejamos incapazes de estruturar projetos com come�o, meio e fim na �rea p�blica.
Trata-se, em ess�ncia, de aumentar contribui��es e aportar ativos e receb�veis em geral a fundos de Previd�ncia criados para os RPPS, a fim de zerar esses passivos, garantindo o pagamento das aposentadorias (que alguns podem n�o querer viabilizar por ojeriza aos servidores) e eliminando a forte dentada que os d�ficits anuais v�m dando �s contas p�blicas.
Como isso poderia aliviar a restri��o da Pec do Teto? Bastaria interpretar, jur�dica e formalmente, que a parcela do d�ficit total que fosse reduzida em decorr�ncia dessas novas medidas pudesse ser gasta em investimentos rent�veis socialmente por fora da apura��o do teto.
Para aplicar essa regra a curt�ssimo prazo e incorporar os novos gastos ao esfor�o de recupera��o econ�mica antipandemia, bastar� aprovar lei prevendo a monetiza��o dos ativos mobilizados via opera��es nos moldes das de relaxamento monet�rio (do ingl�s “quantitative easing-QE”), a cargo do Banco Central.
Enfim, se nada for feito, o governo atual ser� o primeiro governo com tintas militares em que o setor p�blico investir� zero, mesmo se sabendo que algo de alto retorno para a sociedade haveria por fazer. Triplamente chocante... Rog�rio Marinho, ministro do Desenvolvimento Regional, estava cert�ssimo quando abriu o verbo no Globo de sexta-feira passada.
(Convido os leitores desta coluna a assistirem � live especial do F�rum Nacional no seu canal no YouTube, dia 15, ao meio-dia, sobre esses temas, com a presen�a ilustre do pr�prio Andr� e dos colegas Monica de Bolle e Jos� Oreiro.)