
A not�cia que li em um jornal de grande circula��o, no dia 4 de outubro, me chamou a aten��o. Circula na internet a mesma mat�ria: “Estudo analisa como o ecstasy pode melhorar a psicoterapia”. Ele tamb�m � conhecido como MDMA, droga considerada est�mulo � empatia, cujo efeito pode ser �til para a psican�lise. Estranhei...
Nunca neguei os efeitos das drogas l�citas ou il�citas sobre o corpo e a psiqu�. Drogas s�o poderosas. Produzem gozo no corpo e alteram a percep��o. As l�citas, que s�o os rem�dios, vieram ajudar sobremaneira todos os ramos da medicina, promovendo al�vio de dores e desconfortos do corpo.
No tratamento de depress�es, ansiedade e psicoses com neurol�pticos ou antipsic�ticos, conseguimos reduzir surtos, abandonar camisas de for�a e derrubar os muros na luta antimanicomial. Maravilha da ci�ncia, devemos admitir e agradecer. E h� muitas outras.
A psican�lise, no entanto, est� fora tanto do campo cient�fico quanto do filos�fico, religioso, da magia ou das ci�ncias ocultas. Embora tenha vindo da concep��o cartesiana do sujeito sem qualidade e da� surge o sujeito do inconsciente, logo se afasta dela e de outras linguagens dos saberes constitu�dos formalmente, pois se trata de um outro saber.
Trata-se do saber que n�o se sabe. Um saber que n�o sabemos que est� em n�s a n�o ser indiretamente, por sonhos, associa��o livre escutada, atos falhos e lapsos de linguagem. A psican�lise n�o � ci�ncia, mas funciona em sua extraterritorialidade. Imprescind�vel estar fora dos campos do saber por dedicar-se a um Real diferente da realidade. O Real � o ido, o que � como �, o que n�o muda.
Buscamos o �nico em cada indiv�duo pelo al�vio do sintoma e das repeti��es que o fazem girar em torno do mesmo e trope�ar, como vinil arranhado na vitrola. Trabalhamos com a escuta da palavra livre, espont�nea, sem ju�zo de valor, sem pretender ensinar, treinar comportamentos, corrigir pessoas, ganhar simpatia. Na escuta, nos deparamos com a conting�ncia do inconsciente se o escutamos nas palavras, na sonoridade delas, para al�m do enciclop�dico.
Nas psicoses, escutamos o del�rio, que � uma tentativa de cura. Aprendemos a deixar os loucos falarem e se escutarem, com o m�nimo de medica��o e sem seda��o, que nos rouba o principal que ele traz.
Na psican�lise, somos sempre contr�rios ao medicamento desnecess�rio, aquele da pessoa que n�o quer sentir. Fica ansiosa, toma Alprazolan (Frontal); fica triste, toma antidepressivo; est� dispersa, Ritalina ou Venvanse, que � pura anfetamina e vicia. Est�o banalizados pelos que n�o querem sentir o que h� para sentir. Alegria, tristeza, ansiedade e ang�stia fazem parte da vida.
Voltando ao que aqui nos trouxe, MDMA, droga psicod�lica usada em festas para animar, encorajar conex�es, provocar empatia artificialmente, agora muda de status. Pode ser que a ci�ncia a eleve a droga l�cita, como os EUA fizeram com a oxicodona, levando milhares de pessoas � ru�na e � morte. Para entender esse processo, assistam � s�rie “O imp�rio da dor”.
Jamais a psican�lise se beneficiar� desse recurso, pois sua �tica n�o � a da empatia, � a da transfer�ncia. Entre analista e paciente existe um que escuta como operador l�gico aquilo que o outro fala, para traduzir o que do inconsciente surge ali. O analista n�o est� ali com sua pessoa para trocas afetivas e de opini�es.
Se � de psican�lise que se trata, n�o cabe incluir droga da felicidade, estimulante sexual ou qualquer outro produto para levar o paciente ao trabalho. Trabalho �rduo, que lida com a dor existencial que n�o pode ser negada ou anestesiada – e, sim, atravessada. N�o desejamos facilitar, porque sabemos que n�o � f�cil. N�o precisamos negar limites nem extrapolar barreiras �ticas, pois nosso foco � aceitar a vida como ela �.