Os homens e as institui��es pol�ticas no Brasil

A Assembleia reunida a partir de 1987 para escrever a nova Constitui��o do Brasil tinha o prop�sito de criar institui��es que assegurassem a soberania da vontade popular na forma��o do Governo e do Parlamento e garantissem de modo duradouro a liberdade de todos.

Afinal, a hist�ria pol�tica de nosso pa�s no s�culo 20 esteve marcada por muitas convuls�es pol�ticas e longos per�odos de ditaduras e governos autorit�rios. A pretens�o era come�ar de novo nossa vida pol�tica depois de tantos traumas.

Passados mais de 30 anos de sua promulga��o, temos o distanciamento necess�rio para avaliar se aqueles prop�sitos foram realizados. A nova Constitui��o trouxe muitas inova��es no campo dos direitos individuais e criou prote��es sociais que t�m sido de grande import�ncia para manter a estabilidade do pa�s.

N�o fossem essas prote��es como a Previd�ncia Social, o SUS e os benef�cios de assist�ncia social, o pa�s n�o teria como sobreviver ao baixo crescimento econ�mico que tem nos acompanhado quase todo o tempo. Quem hoje lamenta a expans�o dos gastos p�blicos ap�s a Constitui��o n�o leva em conta este lado da realidade.

Onde a Constitui��o falhou foi na constru��o das institui��es pol�ticas, pois manteve, com poucas altera��es, o sistema eleitoral, a organiza��o partid�ria e a forma de governo que vinham desde a Constitui��o de 1946, com mudan�as pontuais introduzidas pelos governos militares.

Estas institui��es j� haviam demonstrado suas imperfei��es. Criaram o ambiente de crise que levou � tomada do poder pelos militares em 1964 e, antes disso, haviam mantido o pa�s num clima de inquieta��o e de permanentes amea�as de golpe.

A �nica explica��o que eu vislumbro para esse apego a uma ordem imperfeita � o fato de que os constituintes haviam sido eleitos por esse mesmo sistema e sentiam-se confort�veis nele. Estavam ali as sementes das crises futuras.

Em pouco tempo dois presidentes foram afastados por impeachment e, hoje, vivemos novamente num clima de incertezas e amea�as que nos remetem a um passado que t�nhamos a ilus�o de estar sepultado. O mais grave � que, com duas exce��es, o Brasil n�o tem sido capaz de constituir governos � altura dos nossos problemas e das nossas imensas possibilidades.

O que temos com mais frequ�ncia, como agora, s�o governos inteiramente perdidos, usando os recursos do poder apenas para se manter no posto e nada mais. Em meio � desola��o geral, as vozes da modera��o insistem em que, apesar de tudo, as institui��es est�o funcionando. A pergunta �: est�o funcionando mesmo?

Um dos pensadores mais clarividentes da ordem pol�tica no mundo atual, Francis Fukuyama, nos ajuda a compreender melhor o que se passa conosco. Ele descreve as institui��es como padr�es de comportamento criados para responder �s necessidades de um momento hist�rico particular. As sociedades, no entanto, n�o ficam paradas. Elas criam novas classes sociais, educam seus cidad�os e empregam novas tecnologias que desorganizam o ambiente social.

As mudan�as sociais deixam para tr�s as institui��es pol�ticas existentes. Quando elas falham em acomodar as mudan�as sociais, entram em decad�ncia e precisam ser tamb�m mudadas.

O Brasil de 2021 � completamente diferente do pa�s que existia em 1945 e do que viveu durante os governos militares. O mundo mudou muito e, gra�as �s novas tecnologias, as mudan�as ocorreram em todos os aspectos da vida humana e das rela��es sociais.

As velhas institui��es pol�ticas que a Constitui��o de 88 teve a ilus�o de congelar para sempre est�o inviabilizando o pa�s, atrasando seu progresso e acabar�o por arruinar seu destino.

A quest�o da governabilidade e de nossa capacidade de colocar o Estado a servi�o do crescimento econ�mico e da elimina��o da pobreza, n�o � simplesmente uma quest�o de mudar os homens. � preciso muito mais do que isto. � preciso mudar a organiza��o dos partidos, mudar o sistema de elei��o dos parlamentares e, muito provavelmente, mudar o regime de governo. Sem estas mudan�as os Lulas e Bolsonaros continuar�o a vender a alma ao Centr�o.