
“S� na v�spera do Natal, depois de fechar a loja, tinha o costume de subir para a sala de chocolates e pensar nos presentes, que gosto de bolar na hora, refletindo sobre meus afetos. Mas, no ano passado, foi diferente. Levei um choque e, por algum tempo, pensei na morte e em quanto a vida � breve e pode escapar em um segundo.”
O depoimento da designer e empres�ria Paula Bondan, propriet�ria da marca Frau Bondan, � forte. E se ali, naquela ocasi�o, ela j� se considerava uma pessoa que sempre procurou distribuir afeto de forma personalizada, “um presente que � a cara da pessoa, at� mesmo sem me prender a datas”, o tra�o ficou ainda mais forte. “Pensei em como temos o h�bito de acumular coisas. E tamb�m na urg�ncia de falar com pessoas queridas sobre o quanto as amo, o quanto s�o importantes pra mim. Quando fui pra casa, decidi selecionar objetos que faziam parte da minha vida, da minha mem�ria afetiva, coisas com significado, para presentear cada um dos meus sobrinhos. Coloquei a alma ali e quis que cada um tivesse uma lembran�a da personalidade da tia, do meu olhar sobre o mundo e as coisas, daquilo que me encanta. Escrevi dedicat�ria e um bilhete para cada um, mesmo para o mais novinho, de apenas 3 anos.”
E aquele foi um Natal feliz, repleto de emo��o, conta Paula. Tanto que os pequenos Gabriel, de 11 anos, Manuela, de 10, Clara, de 6, e Miguel, de 3, guardam com o maior carinho os presentes daquele dia, que deve ser relembrado ainda durante muito tempo. “Sou mesmo de comprar s� o que me encanta, n�o me obrigo a dar presentes nas datas, mas algo que, quando vejo, me faz lembrar aquela pessoa. Sem clich�s e com muito afeto, energia de cura at�. Assim penso o presente ideal. E nem precisa ser uma coisa, mas uma experi�ncia, um momento. O importante � tocar o cora��o do outro e, para isso, acredito que a escolha � imbu�da do sentimento que vem da alma, que tenha sentido e se identifique com o outro”, descreve.
COSTUME MILENAR
Maur�cio Paz, professor de hist�ria da Universidade Federal do Paran� e de outras institui��es, conta que a data comemorativa crist� do Natal, comemorado em dezembro, foi definida apenas no s�culo 4. “Antes disso, os crist�os primitivos n�o tinham o h�bito da celebra��o do Natal como conhecemos. Existia, nessa data, uma festa anterior � era crist�, chamada de Natalis Solis Invicti.”
Ele fala sobre a popularidade da festa no Imp�rio Romano, a celebra��o de Solst�cio de inverno, quando as noites passam a ficar cada vez mais curtas, com o sol predominando por mais tempo e derrotando, assim, o inverno e a escurid�o da noite. E destaca que essa mesma festa tem sua origem h� mais de 5 mil anos, na P�rsia, com a divindade Mitra, uma deidade relacionada ao Sol.
Trata-se de uma hist�ria talhada ao longo de mil�nios, continua. “Embora o Imp�rio Romano fosse oficialmente crist�o desde o imperador Constantino e o Edito de Mil�o, em 313, � preciso entender que as religi�es da Antiguidade, consideradas pag�s, n�o desapareceram e a melhor forma de evitar conflitos religiosos era com as autoridades promovendo a sincretiza��o das cren�as. Pois bem, a troca de presentes e decora��o de �rvores com velas e fitas j� era uma pr�tica das celebra��es do Natalis Solis Invicti, que acabaram assimiladas pela cristandade.”
OS REIS MAGOS
O professor diz, ainda, ser imposs�vel afirmar se os tr�s reis magos, por exemplo, existiram de fato. “E isso n�o tem o prop�sito de se contrapor � f� ou � cultura das pessoas. Na realidade, culturalmente, a festa dos reis magos � o momento de troca de presentes em alguns pa�ses, como na Fran�a. Embora o costume de presentear os rec�m-nascidos seja, de fato, milenar, � dif�cil afirmar com precis�o hist�rica a exist�ncia real desses fatos.”
Assim, conclui ele, o h�bito de presentear no Natal, t�o corrente na cultura ocidental e entre a comunidade cat�lica, atravessou o tempo e varia em cada pa�s (veja quadro). “No Brasil, fomos influenciados pela tradi��o americana, que movimenta imensamente muito dinheiro nas festas de fim de ano. No entanto, certamente, o Natal nos aproxima, nos acalenta, faz com que antigas m�goas sejam resolvidas, une fam�lias e amigos, promove um sentimento de perd�o, renova esperan�as. Por esses motivos, as festas natalinas ainda est�o na cultura, elas ajudam cada sujeito a lidar e a resolver esses problemas. Ao longo da hist�ria, o Natal representou momentos de ruptura em muitos acontecimentos. Na Idade M�dia, Moderna e Contempor�nea, existem in�meros relatos de Armist�cios em guerra durante o Natal. Mais uma evid�ncia da for�a desse fen�meno, mesmo no s�culo 21: a sociedade de consumo tende a tornar todas as rela��es e significados mais ef�meros e pouco importantes diante do consumo. Mas acredito que ainda assim o Natal resguarda o sentido de promover a uni�o familiar e de amigos. De reatar la�os e nos reconectar �s nossas origens.”
"O importante � tocar o cora��o do outro e, para isso, acredito que a escolha � imbu�da do sentimento que vem da alma, que tenha sentido e se identifique com
o outro”
. Paula Bondan, empres�ria, com os sobrinhos Gabriel, Miguel, Clara e Manuela