
A psic�loga Marli Amaral estreou no papel de av� h� pouco mais de dois anos, quando nasceu a neta Isabella. Para ela, os pais de primeira viagem est�o t�o preparados quanto as m�es, mas para assumir o papel sozinhos � preciso, ao menos, se sentirem seguros. N�o foi o que aconteceu com o genro dela no nascimento de Isabella. Segundo a psic�loga, at� cair o umbiguinho, s� ela deu banho na beb�. "Era muito assumido por ele que ele n�o sabia lidar com ela. Ent�o ele se entregava �s minhas orienta��es e, aos poucos, foi aprendendo a cuidar da filha. Hoje ele j� tem mais firmeza, questiona ou faz do jeito dele, mas ainda me pergunta quando tem d�vida", garante.
Sobre a rela��o com a filha dela diante do nascimento de Isabella, Marli conta que os primeiros meses foram um pouco conturbados, justamente porque ela aparentava mais seguran�a para cuidar da beb�, enquanto a m�e – vulner�vel por conta de tantas mudan�as e inundada pelas emo��es desordenadas do puerp�rio – agia com alguma hesita��o. "Ela ficava um pouco intimidada, enciumada, apesar de n�o expressar isso verbalmente. Eu percebia nos olhares, no jeito de se comportar comigo", conta, acrescentando que conseguiram resolver essas diferen�as � base de muito di�logo. Ela considera que, neste caso, o primeiro passo deve ser dado pela av�.
"Depende muito mais da av� do que da filha. Porque a av� tem mais experi�ncia. Ela sabe o que foi isso pra ela. � um momento muito delicado, um ser que depende inteiramente da gente, t�o pequenininho. Ent�o acho que � poss�vel driblar as diferen�as com muita conversa entre as partes", garante a psic�loga, acrescentando que a aus�ncia de di�logo pode at� romper uma rela��o entre m�e e filha.
LEITE DE VACA PRETA
Se existe desconforto em lidar com os conselhos, repreens�es e, �s vezes, intrometimentos da m�e, que dir� atravessar os primeiros dias com seu beb� ao lado da sua sogra. No caso de Maria*, a rela��o ficou t�o insustent�vel, que ela preferiu n�o se identificar nesta reportagem e aceitou somente contar sua hist�ria. Ela tem duas filhas, sendo a primog�nita do primeiro casamento e a ca�ula, do segundo. Mesmo n�o sendo m�e de primeira viagem, afirma ter sofrido com a insist�ncia da sogra em opinar sobre como criar as meninas. "Quando comecei a dar Aptamil pra minha filha, meu peito estava empedrando. Nesse dia eu fiquei muito fraca, mas minha filha aceitou superbem", conta. Apesar disso, a m�e do marido n�o aceitou a introdu��o de f�rmula na alimenta��o da neta.
"Ah, voc� tem que dar leite pra ela � leite de vaca. Eu criei meus filhos todos com leite de vaca. E tem que ser de vaca preta. Tem que procurar uma vaca preta pra dar o leite pra ela", dizia a sogra. Maria conta que na regi�o onde vive realmente existem pessoas que vendem "leite de vaca preta", mas que ela n�o confia. Considera o leite de vaca muito forte, por isso decidiu n�o dar. Dias depois ap�s a introdu��o da f�rmula, a filha teve um curto epis�dio de diarreia. N�o demorou at� que a sogra culpasse o leite. "Ela dizia que n�o precisava levar minha filha ao m�dico, que pediatra n�o sabe de nada. Que era s� dar leite de vaca, ado�ado ou com Mucilon, por conta e risco dela", conta.
De fato, beb�s nascidos h� mais tempo eram nutridos com leite de vaca nos primeiros meses de vida. Algumas m�es colocavam um pouco de a��car, mel ou outros complementos, como aveia e outras farinhas engrossantes. A pr�tica ainda � comum em determinadas fam�lias e especialmente em cidades do interior e zonas rurais. Mas segundo os pediatras, deve ser evitada. "No geral, a redu��o da ingest�o de a��cares tem sido preconizada em todas as idades, inclusive entre os adultos. A grande oferta cal�rica na alimenta��o industrializada nos traz alguns problemas que antes n�o eram t�o frequentes, e tamb�m porque n�o eram investigados", explica o pediatra Mateus Coutinho.
quatro perguntas para...
amanda coelho goulart
pediatra e educadora parental em disciplina positiva
Muita coisa mudou nos cuidados com o rec�m-nascido de 30 anos para c�. O que voc� considera mais importante em rela��o a essas mudan�as?
Essas mudan�as foram fruto de muito estudo. A evolu��o tecnol�gica e cient�fica na �rea da pediatria levou, principalmente, � redu��o da taxa de morbimortalidade neonatal e infantil e aumento da sobrevida dos prematuros.
Voc� pode listar ao menos tr�s m�todos que eram usados h� algum tempo e foram abandonados pela medicina?
H� mais tempo era recomendado que o beb� fosse colocado para dormir no ber�o em dec�bito lateral (de lado). Nos �ltimos anos, houve mudan�a dessa recomenda��o: agora todos os beb�s devem ser colocados para dormir de barriga para cima – isso contribuiu para a redu��o de mais de 50% dos casos de s�ndrome da morte s�bita dolactente. Outra mudan�a tamb�m ocorreu na introdu��o alimentar, que antes se iniciava antes dos 6 meses de vida, e que era feita em forma de sopinhas bem l�quidas. Al�m disso, o uso de sucos e leite de vaca com a��car nos primeiros meses de vida eram pr�ticas costumeiras e liberadas. Hoje em dia, a recomenda��o � iniciar a introdu��o alimentar ap�s 6 meses de vida, com alimentos separados e sem liquidificar; al�m disso, os sucos s� est�o indicados para maiores de 1 ano de idade. H� algum tempo tamb�m o uso de andadores era liberado e muitas crian�as o utilizaram, mas hoje em dia � proibido. O andador atinge uma velocidade elevada e pode virar facilmente ao esbarrar com objetos pelo ch�o – por isso, ele � uma das principais causas de traumatismo cranioencef�lico nos pequenos.
O que voc� considera proibid�ssimo hoje e que era comum na cria��o dos filhos h� 20 anos? E por qu�?
O pediatra tem o dever de informar aos pais e cuidadores o que � a recomenda��o mais correta e mais atualizada a ser seguida na cria��o dos seus filhos, como, por exemplo, a introdu��o de sucos ap�s 1 ano de idade, ou a introdu��o do a��car ap�s 2 anos de idade – estudos evidenciaram que a introdu��o precoce desses alimentos aumenta o risco de obesidade, por exemplo. Mas vamos a algumas pr�ticas que eram comuns h� alguns anos e que hoje em dia s�o proibidas:
– Uma delas � o uso de faixa ao redor do umbigo do rec�m-nascido para diminuir a chance de h�rnia umbilical (umbigo estufado para fora).
Essa pr�tica � proibida atualmente – al�m de n�o ter nenhuma evid�ncia cient�fica, o rec�m-nascido utiliza a musculatura abdominal para respirar e, portanto, quando o abdome � comprimido por faixas, os movimentos respirat�rios ficam prejudicados.
– Outra pr�tica costumeira era o uso de �lcool para reduzir a febre – tanto na �gua da banheira como em compressas. A quest�o � que o �lcool pode ser facilmente absorvido pela pele do beb�, podendo levar a uma toxicidade sist�mica, sendo tamb�m algo proibido hoje em dia.
– O uso de mel para menores de 1 ano, atualmente, tamb�m � proibido. Antes, essa pr�tica ocorria, mas hoje sabe-se do risco de adquirir botulismo nessa faixa et�ria por meio do mel.
Por fim, criar filhos hoje � mais f�cil ou mais dif�cil que antigamente?
Com todas as oportunidades de conhecimento e orienta��o f�cil via internet, produtos modernos que ajudam nos cuidados di�rios com o beb� (por exemplo: bab� eletr�nica, fraldas descart�veis), contato f�cil com o pediatra por meio do celular, grupos de m�es que se encontram na mesma fase do maternar – estamos mais sujeitos a pensar que criar filhos hoje em dia � mais f�cil, certo? Mas tenho minhas d�vidas! S�o tantas informa��es e orienta��es diferentes na internet, tantas sugest�es em grupos de m�es, tanta exposi��o de uma maternidade ideal nas m�dias digitais que acredito que est� cada dia mais dif�cil o maternar leve e saud�vel. Mas a busca desse maternar � poss�vel com as orienta��es pedi�tricas e com uma cria��o respeitosa e que atenda �s individualidades de cada crian�a e ao bem-estar da fam�lia.