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Estado de Minas MAIS TEMPO COM O BEB�

Licen�a-maternidade: o pa�s rico onde as mulheres n�o t�m direito ao afastamento remunerado

Os Estados Unidos s�o a �nica na��o rica que n�o oferece um programa nacional de licen�a parental remunerada


22/07/2021 08:28 - atualizado 22/07/2021 09:39


(foto: Getty Images)

Os Estados Unidos podem ser uma das na��es mais ricas do mundo, mas em um quesito importante aparece em �ltimo: � o �nico pa�s rico que n�o oferece um programa nacional de licen�a parental remunerada.

Hoje, apenas 21% dos trabalhadores americanos t�m acesso � licen�a familiar remunerada por meio de seus empregadores — embora, de acordo com uma pesquisa do Pew Research Center, de 2015, em quase metade de todas as fam�lias biparentais o pai e a m�e trabalham em tempo integral.

Essa falta de provis�o contrasta fortemente com as na��es europeias, onde a licen�a parental subsidiada � padr�o.

Pesquisas mostram que a licen�a parental remunerada oferece benef�cios indiscut�veis para pais, filhos e as sociedades dos pa�ses que a oferecem.

H� tamb�m um amplo apoio para isso nos EUA; de acordo com um estudo acad�mico publicado em abril, cerca de 82% dos americanos apoiam o acesso � licen�a parental remunerada. Percentual que se mant�m praticamente o mesmo h� anos — e inclui o apoio de todo o espectro pol�tico.

Os motivos pelos quais os EUA permanecem um caso isolado no que se refere � licen�a parental remunerada s�o complexos, combinando as necessidades do p�s-guerra com uma complicada identidade cultural nacional baseada no individualismo e na autodetermina��o.

Agora, no entanto, h� uma press�o significativa para a mudan�a.

Em abril, o presidente dos EUA, Joe Biden, prop�s um pacote de benef�cios de US$ 225 bilh�es para fornecer licen�a m�dica e familiar paga, que permitiria aos trabalhadores tirar at� 12 semanas de licen�a remunerada para cuidar de um rec�m-nascido ou membro da fam�lia.

Em um pa�s que se encontra mais polarizado do que nunca, dados mostram que a licen�a parental remunerada � uma das raras quest�es que pode contar com o apoio de eleitores de todos os tipos.

Ent�o, por que nada foi promulgado a n�vel nacional at� agora — e como o plano de Biden, que precisa ser aprovado pelo Congresso, pode se tornar realidade desta vez?

Dois caminhos diferentes

Globalmente, a base para a licen�a parental remunerada nacional foi lan�ada pelo Congresso Internacional de Mulheres Trabalhadoras em 1919, um grupo que inclu�a muitas mulheres americanas, escreveu Mona Siegel, professora de hist�ria na Universidade do Estado da Calif�rnia, nos EUA, autora de Peace on Our Terms: The Global Battle for Women's Rights After the First World War.

As demandas desse grupo por modelos de trabalho mais justos ap�s a Primeira Guerra Mundial inclu�am 12 semanas de licen�a maternidade remunerada como "uma necessidade m�dica e um direito social", pol�tica adotada pela Organiza��o Internacional do Trabalho (OIT) em novembro de 1919.

Nas duas d�cadas seguintes, pa�ses europeus e latino-americanos come�aram a consagrar essas pol�ticas em lei, mas foi o fim da Segunda Guerra Mundial que consolidou esse processo, sobretudo na Europa.

"Parte disso tinha a ver com os temores de decl�nio demogr�fico — com a perda populacional durante a Segunda Guerra Mundial e o que parecia ser a necessidade de se recuperar daqueles anos e garantir que houvesse uma for�a de trabalho forte no futuro", explica Siegel.

Resumindo, a Europa precisava de beb�s para ajudar a repovoar suas na��es devastadas pela guerra — e de uma for�a de trabalho forte para reconstruir as economias enquanto isso.

Na era do p�s-guerra, diz Siegel, os argumentos europeus para a licen�a maternidade remunerada nacional foram formulados principalmente em termos econ�micos, e n�o em torno dos benef�cios sociais em que nos concentramos hoje.

O cen�rio do p�s-guerra parecia um pouco diferente nos EUA, no entanto.

"N�o t�nhamos o mesmo tipo de medo sobre a necessidade de aumentar a popula��o", explica Joya Misra, professora de sociologia e pol�ticas p�blicas da Universidade de Massachusetts, nos EUA.

O pa�s n�o havia sofrido perdas populacionais t�o grandes na guerra, a economia estava indo bem e a imigra��o estava fortalecendo o mercado de trabalho.

Isso significava que as mulheres que eram m�es nos Estados Unidos estavam "sendo encorajadas a voltar para casa, a liberar os empregos para os homens que estavam voltando do conflito e a se tornar donas de casa tomando conta da fam�lia", afirma Terri Boyer, diretora fundadora do Instituto Anne Welsh McNulty de Lideran�a Feminina da Universidade Villanova, nos EUA.

Trauma p�s-guerra — e estrat�gias divergentes

As ideologias pol�ticas extremas que surgiram globalmente influenciaram o modo como as na��es elaboraram pol�ticas de bem-estar no per�odo p�s-guerra.

Tanto os Estados Unidos quanto as na��es da Europa Ocidental queriam refor�ar as tradi��es democr�ticas ap�s o trauma da Segunda Guerra Mundial, mas adotaram abordagens diferentes.

Os pa�ses europeus, explica Siegel, sentiram os efeitos do fascismo diretamente, e desse trauma veio a sensa��o de que a filosofia social de "cada um por si" era "alienante demais e deixava as pessoas vulner�veis %u200B%u200Ba ideologias extremistas".

Isso levou a um amplo apoio pol�tico a um estado de bem-estar social como uma ferramenta para gerar estabilidade social e econ�mica — e a solidariedade necess�ria para respaldar a democracia.

A licen�a-maternidade no Reino Unido, por exemplo, surgiu junto com as reformas voltadas para sa�de p�blica e aposentadoria dos trabalhadores.

Os Estados Unidos, no entanto, refor�aram sua mentalidade cultural individualista, particularmente � medida que seu relacionamento com a ent�o Uni�o Sovi�tica se deteriorou depois da guerra.

Na esteira disso, uma "forte antipatia" por qualquer coisa que pudesse ser rotulada de socialista, ou pior, comunista, tornava muito mais dif�cil angariar apoio para criar pol�ticas de bem-estar social de benef�cio universal, diz Siegel.

Ela observa que "qualquer tipo de assist�ncia m�dica para m�es ou beb�s que frequentemente acompanham a licen�a-maternidade remunerada era considerada medicina social".

Qual trabalho — e de quem — � valorizado?

O individualismo americano alimentou as percep��es do valor social e econ�mico da licen�a-maternidade.

Na Europa, a licen�a parental remunerada costumava andar de m�os dadas com a sa�de p�blica e a educa��o infantil patrocinada pelo estado — uma trinca por meio da qual os pais podiam formar um v�nculo com os filhos e depois voltar ao mercado de trabalho enquanto seus filhos recebiam uma s�lida forma��o educacional.

O imposto a pagar por esses programas universais plantava as sementes para uma futura for�a de trabalho forte e uma sociedade educada e saud�vel, o pensamento era esse.


Os trabalhadores operários têm menos chance de obter licença remunerada do que aqueles com empregos corporativos
Os trabalhadores oper�rios t�m menos chance de obter licen�a remunerada do que aqueles com empregos corporativos (foto: Getty Images)

Mas nos Estados Unidos, a licen�a parental paga foi vista com mais desconfian�a; em vez de uma maneira de manter as pessoas na for�a de trabalho, muitos viam como "um direito do qual as pessoas v�o tirar vantagem para obter dinheiro do governo financiado por empresas e contribuintes", diz Boyer.

Essa vis�o estava enraizada na maneira como os diferentes tipos de trabalho e, na verdade, as pessoas foram valorizadas nos anos p�s-guerra, e na ideia de que a licen�a parental universal remunerada poderia encorajar as fam�lias "erradas" a se reproduzir.

Houve, segundo Siegel, uma "forte press�o" para estabelecer que as mulheres afro-americanas que realizavam trabalho dom�stico ou agr�cola estavam de alguma forma "fora do reino do trabalho" e exclu�-las.

"Havia um medo real de que, se voc� aprovasse qualquer tipo de pol�tica federal abrangente de licen�a maternidade, isso incluiria mulheres afro-americanas e, mais recentemente, mulheres imigrantes."

Parte do mercado de trabalho dos EUA ainda segue fortemente as linhas raciais, com muito mais servi�os de baixa remunera��o e empregos agr�colas sendo realizados por minorias.

Apenas 8% dos trabalhadores no quartil salarial inferior (que geralmente ganham menos de US$ 14 por hora) tiveram acesso � licen�a parental remunerada em 2020, em compara��o com cargos administrativos que s�o preenchidos com mais frequ�ncia por candidatos brancos mais abastados e oferecem benef�cios mais abrangentes.

Hoje, n�o � incomum ouvir coment�rios sobre a ideia de que as fam�lias pobres n�o deveriam receber apoio do governo porque "� culpa delas mesmo serem pobres".

Isso "remete a um certo n�vel de percep��o racista de que se voc� est� ajudando a todos, significa que est� ajudando pessoas que n�o merecem", diz Misra.

"E aquelas pessoas que s�o definidas como n�o merecedoras tendem a ser pessoas de cor."

"O racismo desempenhou um papel fundamental na forma como estruturamos isso", ela acrescenta.

"E uma vez estruturado, � muito dif�cil de desconstruir."

Deixar nas m�os do mercado

Esses fatores ajudam a explicar por que em grande parte foi deixado nas m�os das empresas privadas determinar a licen�a parental para os funcion�rios, refor�ando um sistema que privilegia alguns acima de outros e deixa 80% da popula��o ativa para tr�s.

Parte da raz�o pela qual nenhum avan�o foi feito na pol�tica a n�vel federal � que os legisladores est�o divididos sobre como ela deve ser financiada.

"Os formuladores de pol�ticas p�blicas discordam sobre como estrutur�-la e como pagar por isso", diz Angela Rachidi, pesquisadora em estudos da pobreza do American Enterprise Institute.

"As pesquisas de opini�o p�blica mostram que o povo americano n�o quer que o governo federal financie um programa de licen�a remunerada, preferindo que os empregadores paguem por isso. Mas as licen�as pagas aumentariam os custos para os empregadores e reduziriam o emprego em geral."


A pandemia revelou uma sobrecarga ingerenciável sobre as mães que trabalham %u2014 mas será que isso levará a mudanças?
A pandemia revelou uma sobrecarga ingerenci�vel sobre as m�es que trabalham %u2014 mas ser� que isso levar� a mudan�as? (foto: Getty Images)

Os americanos s�o realmente hesitantes quando se trata de um programa de financiamento p�blico.

A mesma pesquisa que mostrou que 82% dos americanos apoiam a licen�a parental remunerada tamb�m revelou que apenas 47% apoiam o financiamento do governo para a mesma.

Os autores do estudo escrevem que essa relut�ncia reflete "uma ideologia dominante do fundamentalismo de mercado", que envolve "uma prefer�ncia por mercados autorregulados e livres de interfer�ncia governamental".

Essa hesita��o levou alguns l�deres empresariais a presumir que teriam de arcar com os encargos financeiros de qualquer programa de licen�a parental obrigat�rio em �mbito nacional — algo que alguns relutam em fazer.

Em 2016, um n�mero significativo de grandes empresas nos Estados Unidos ainda n�o oferecia licen�a parental remunerada para trabalhadores n�o assalariados, pais n�o biol�gicos ou pais adotivos.

Quanto �s pequenas empresas, muitas simplesmente n�o t�m fluxo de caixa para viabilizar o investimento de longo prazo em seus funcion�rios.

De acordo com a proposta de Biden, no entanto, o financiamento n�o vir� dos empregadores, mas dos que ganham mais.

O plano dele prev� aumentar a al�quota de imposto de renda para o 1% dos americanos mais ricos de 37% para 39,6%, al�m de aumentar os tributos sobre ganhos de capital e dividendos para aqueles que ganham mais de US$ 1 milh�o por ano.

Pode ajudar a ele o fato de j� existirem precedentes de sucesso dentro do pa�s — e que est�o funcionando.

V�rios estados j� promulgaram sua pr�pria legisla��o — um padr�o que costuma preceder a pol�tica nacional nos EUA.

Calif�rnia, Nova Jersey, Rhode Island, Nova York, Washington e Massachusetts, assim como Washington DC, estabeleceram licen�a parental remunerada por meio de um imposto sobre a folha de pagamento, e logo se juntar�o a eles Connecticut (2022), Oregon (2023) e Colorado (2024).

(At� o pr�prio governo federal concede 12 semanas de licen�a parental remunerada.)

"Vemos que os estados que adotaram foram realmente bem-sucedidos, que os donos de empresas disseram: 'Ei, isso est�, na verdade, ajudando meu neg�cio; n�o estou perdendo tantos trabalhadores; estou meio que arrecadando sobre o investimento que fiz'" na for�a de trabalho, diz Misra.

Mudan�a � vista?

No momento, diz Misra, os EUA t�m uma "janela pol�tica" para efetuar mudan�as devido � forma como a pandemia de covid-19 exp�s implacavelmente as desigualdades relacionadas ao g�nero, seguran�a no trabalho e cuidado infantil.

Desde a pandemia, mais de 3 milh�es de mulheres deixaram o mercado de trabalho americano.

Como resultado, as pessoas est�o acordando para os benef�cios econ�micos da assist�ncia social em larga escala para as fam�lias. A sa�de mental tamb�m est� sob os holofotes mais do que nunca.

Antes da covid-19, a incapacidade de "conciliar tudo" pode ter sido vista como um fracasso pessoal pelas m�es, em vez de um problema estrutural que deveria ser abordado pela pol�tica.

Mas h� uma compreens�o crescente — especialmente entre os profissionais mais jovens — de que � necess�rio mais apoio para ajudar os pais com uma carga imposs�vel de gerir.

A obrigatoriedade nacional da licen�a parental remunerada teria v�rios benef�cios.

"Quanto mais pessoas temos na for�a de trabalho assalariada, que tamb�m s�o capazes de ser produtivas (ou seja, n�o ter que se preocupar com responsabilidades concorrentes de tomar conta de crian�as etc.), quanto maior nossa produ��o econ�mica, mais r�pido nosso crescimento e melhor nossos resultados sociais", diz Boyer.

Se as mulheres n�o retornarem ao mercado de trabalho, ela acrescenta, isso for�ar� os formuladores de pol�ticas p�blicas a encarar o fato de que as empresas n�o conseguem encontrar pessoas para preencher as vagas, e oferecer melhores benef�cios para se manterem competitivas.

Mas isso n�o � um argumento para deixar o mercado seguir seu curso:

"A �nica maneira de fazer isso [promulgar uma pol�tica nacional] � ter algum tipo de assist�ncia a n�vel federal ou p�blico."

Resta saber se as iniciativas de Biden podem ser aprovadas — mas mesmo proponentes como Misra n�o est�o confiantes.

"Acho que minha hesita��o tem a ver com a maneira partid�ria como a pol�tica acontece", diz ela, citando o uso do obstrucionismo como �ltimo recurso, mas uma ferramenta eficaz para impedir a aprova��o da legisla��o.

H� maneiras de contornar isso — mas poderia levar � aprova��o do projeto de lei sem garantias vitais para os trabalhadores de que seus empregos seriam protegidos.

"A pandemia tem sido enormemente destrutiva de v�rias maneiras, mas com a destrui��o sempre vem a constru��o — porque voc� tem que descobrir como vamos recompor o sistema", ela acrescenta.

"E oferece, portanto, a oportunidade de repensarmos como estamos fazendo as coisas e considerar como estamos fazendo as coisas — eu s� queria estar mais confiante de que isso realmente vai acontecer."

Leia a vers�o original desta reportagem (em ingl�s) no site BBC Work Life.

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