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Estado de Minas SA�DE

Por que o ap�ndice n�o � t�o in�til quanto se acreditava

Descartado durante muito tempo como parte dispens�vel do corpo, ele est� na mira da ci�ncia de vanguarda e � enxergado como reposit�rio de bact�rias ben�ficas


18/04/2022 06:48 - atualizado 18/04/2022 08:09

Apêndice no corpo humano, em ilustração
S� recentemente a ci�ncia come�ou a compreender o real papel do ap�ndice (foto: Getty Images)

Durante s�culos, o ap�ndice - esse �rg�o de forma cil�ndrica que mede cerca de 10cm e est� conectado � primeira parte do intestino grosso - foi um enigma.

Jacopo Berengario da Carpi, m�dico italiano, publicou a primeira descri��o do ap�ndice em 1521, em seu Commentaria, e o descreveu como uma pequena cavidade vazia.

 

 

 

Leonardo da Vinci teorizou que era um lugar para reter o excesso de g�s e evitar que os intestinos e o c�lon explodissem durante crises de pris�o de ventre.

A palavra "ap�ndice" foi usada pela primeira vez por Andreas Vesalius, em 1953, comparando o �rg�o a uma minhoca.

O bot�nico su��o Caspar Bauhin especulou em 1579 que era um recept�culo para as fezes do feto durante a gesta��o.

Sem uma teoria muito convincente, em seu livro sobre a teoria da evolu��o, em 1871, Charles Darwin prop�s a hip�tese de que o ap�ndice na realidade n�o tinha nenhuma fun��o: era um �rg�o remanescente que havia perdido sua raz�o de ser "como consequ�ncia de mudan�as na dieta ou nos h�bitos".

Foi provavelmente isso o que voc� aprendeu na escola.


Appendix
A palavra em latim para ap�ndice; em vez de apenas significar algo em excesso, o �rg�o parece servir como um reposit�rio de boas bact�rias (foto: Getty Images)

Mas, em meados do s�culo 20, com o desenvolvimento de ferramentas para observar nossos �rg�os mais de perto, come�ou a se dissipar a ideia de que o ap�ndice n�o servia mais do que para se inflamar e colocar vidas em risco (por meio da apendicite).

E, no s�culo 21, os cientistas t�m descoberto que esse �rg�o est� longe de ser apenas um peda�o em excesso.

Santu�rio

Em 2007, uma equipe do Centro M�dico da Universidade Duke fez um grande avan�o quando descobriu que o ap�ndice tinha uma rica biopel�cula.

Trata-se de uma capa de bact�rias ben�ficas, das que vivem em nosso intestino, formam nossa flora e ajudam a extrair energia e nutrientes dos alimentos. Al�m disso, quando elas digerem fibra, produzem �cidos graxos de cadeia curta que podem cruzar para a corrente sangu�nea e proteger o c�rebro.

O misterioso e desdenhado �rg�o passou ent�o a ser visto como um reservat�rio dessas bact�rias, prontas para repovoar o intestino quando as perdemos - por exemplo, em epis�dios de diarreia ou de ingest�o de antibi�ticos.

Isso era algo que Darwin nunca poderia ter adivinhado, j� que viveu muito antes que a ci�ncia reconhecesse a exist�ncia do microbioma humano.

E havia algo mais.


Microbioma
O papel da microbioma do c�rebro tem sido cada vez mais investigado pela ci�ncia (foto: Getty Images)

Algumas d�cadas antes, se havia descoberto que o ap�ndice tinha uma alta concentra��o de tecido linfoide associado ao intestino (GALT, na sigla em ingl�s), mas at� ent�o n�o se sabia que isso ajudava a estimular o sistema imunol�gico no caso de um pat�geno invasor.

Ou seja, al�m de servir de armaz�m de bact�rias, est� envolvido em compreender quando o intestino est� amea�ado e em como responder ao perigo.

Mal-entendido

Seis anos mais tarde, outro estudo do centro m�dico de Duke identificou que as pessoas sem ap�ndice tendem a ter risco maior de uma infec��o bacteriana desagrad�vel e perigosa: Clostridium difficile, ou C diff.

Mas os cientistas tamb�m descobriram algo que lhes pegou de surpresa: os anti-evolucionistas haviam se aproveitado de suas pesquisas.

Isso porque, inadvertidamente, haviam negado algo dito por Darwin - e justamente em um dos exemplos mais comuns e populares citados como evid�ncia da sele��o natural das esp�cies.

Os pesquisadores, afirmam os criacionistas, haviam demonstrado que a teoria da evolu��o era inv�lida.


Retrato de Charles Darwin (1809) pintado por John Collier (1850-1934).
Retrato de Charles Darwin (1809) pintado por John Collier (1850-1934); 'erro' quanto a ap�ndice foi usado por cr�ticos para desacreditar teoria da evolu��o, mas cientistas dizem que o ap�ndice, na verdade, serve para provar a teoria darwiniana (foto: Getty Images)

"Darwin estava errado (ao supor) que o ap�ndice fosse vestigial", explicou � BBC Heather Smith, professora de anatomia na Universidade Midwestern, no Arizona (EUA), que esclarece com veem�ncia: "Isso n�o significa que ele estivesse errado quanto �s teorias da sele��o natural e da nossa compreens�o da adapta��o."

De fato, as pr�prias pesquisas de Smith demonstraram que, longe de solapar a teoria da evolu��o, o ap�ndice a confirma.

Milh�es de anos

Em 2017, Smith e seus colegas decidiram comparar o ap�ndice humano com o de 533 esp�cies de mam�feros.

Revelando uma hist�ria de mais de 80 milh�es de anos, constru�ram uma esp�cie de grande �rvore geneal�gica dos mam�feros, com a qual � poss�vel mapear dados e estimar quantas vezes as esp�cies evolu�ram em uma caracter�stica em particular - neste caso, no ap�ndice.

"Determinamos que o ap�ndice evoluiu ao redor de 30 vezes ao longo da evolu��o dos mam�feros, e isso implica que ele cumpre uma fun��o importante, caso contr�rio n�o seguiria aparecendo na evolu��o."

Em termos evolutivos, se um �rg�o aparece, permanece e n�o desaparece, trata-se de um bom indicador de que ele � �til de alguma maneira. Mais ainda se isso acontece em v�rias linhagens de mam�feros diferentes.

Eixo intestino-c�rebro

Agora, o ap�ndice � foco de estudos que tentam compreender melhor sua fun��o. Um deles, publicado em julho de 2021 por pesquisadores do Inserm e do Museu Franc�s de Hist�ria Natural e inspirado pela grande �rvore geneal�gica da equipe de Smith, analisou dados em 258 esp�cies de mam�feros e viu que a presen�a do ap�ndice pode estar relacionada a uma maior longevidade.

Ao mesmo tempo, algumas pesquisas sugerem uma conex�o - ou eixo - entre o intestino e o c�rebro.


Intestino feito de feltro
Algumas pesquisas sugerem uma conex�o - ou eixo - entre o intestino e o c�rebro (foto: Getty Images)

"Uma das �reas mais empolgantes da ci�ncia do c�rebro e da neurologia no momento � a crescente percep��o dos intestinos e da microbiota intestinal nas doen�as neurodegenerativas", diz � BBC o professor John Cryan, da Universidade de Cork (Irlanda), especialista no tema.

As pesquisas ainda s�o amb�guas, mas segundo ele "uma coisa � clara: n�o podemos ignorar o ap�ndice no que diz respeito � sinaliza��o entre c�rebro e intestino".

Apendicite

Mas existem casos em que realmente n�o podemos manter nosso ap�ndice.

Embora um n�mero crescente de estudos (entre eles uma meta-an�lise de pesquisas com 404 pacientes pedi�tricos) tenha apontado que, em casos de apendicite n�o grave, seja poss�vel tratar a infec��o com antibi�ticos (na tentativa de evitar uma cirurgia para a extra��o do ap�ndice), essa ainda n�o � considerada uma op��o segura.

Um ap�ndice perfurado, canceroso ou gravemente machucado � uma emerg�ncia m�dica grave com consequ�ncias potencialmente fatais, por isso precisa ser extirpado.

E n�o s� est� comprovado que podemos viver uma vida plena e feliz sem ele, como tamb�m nada das descobertas cient�ficas indica que a cirurgia de remo��o do ap�ndice tenha um efeito sobre a longevidade.

A apendicite na juventude - tratada com a cirurgia de remo��o - � tida como ben�fica, por fortalecer uma educa��o do sistema imunol�gico que o permita combater infec��es posteriores com efici�ncia.

O que a hist�ria recente desse pequeno peda�o da nossa anatomia nos ensina � que o corpo humano � extremamente complexo - e ainda nos resta muito a compreender.

* Esta reportagem reproduz trechos do epis�dio (ou�a em ingl�s) "The Appendix" da s�rie BBC "Made of Stronger Stuff"

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