
"O que custa juntar tr�s caras num laborat�rio e descobrir a cura da rinite?"
O que parecia ser um desabafo bem humorado de Jo�o Zastrow, um usu�rio do Twitter, virou uma d�vida real e instigante sobre uma doen�a que afeta at� 40% da popula��o mundial (ou cerca de 84 milh�es de brasileiros) — a postagem na m�dia social j� teve mais de 165 mil curtidas e 43 mil compartilhamentos.
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A rinite al�rgica, quadro marcado por nariz entupido, espirros repetidos, coceira no rosto e dificuldade para respirar, costuma piorar no outono ou no inverno e est� relacionada a alguns gatilhos do ambiente, como poeira, pelos de animais, �caros e p�len.
Embora o tratamento tenha evolu�do bastante nas �ltimas duas ou tr�s d�cadas, a verdade � que realmente n�o existe uma cura para a rinite — e muitos cientistas acreditam que nunca veremos uma solu��o definitiva para esse problema.
oq q custa juntar 3 cara num laborat�rio e descobrir a cura de rinite
— Jo�o Zastrow (@joaozastrow) April 19, 2022A seguir, voc� entende por que � t�o dif�cil falar em cura para essa doen�a e quais s�o as principais formas de controlar o quadro atualmente.
Narinas travadas
O nariz funciona como um verdadeiro filtro do nosso sistema respirat�rio. Ele conta com diversas estruturas e mecanismos para barrar a entrada de part�culas perigosas, que podem prejudicar o funcionamento dos pulm�es.
Vamos a um exemplo pr�tico: imagine que um v�rus tente invadir suas narinas. O organismo far� de tudo para expuls�-lo assim que poss�vel, de modo a evitar problemas maiores.
Nessa situa��o, o sistema de defesa desencadeia uma s�rie de a��es, chamadas genericamente de processo inflamat�rio, para aniquilar o invasor — � por isso que o nariz fica inchado, cheio de secre��o e n�o para de espirrar.
"O problema � que, na rinite al�rgica, essa rea��o acontece diante de subst�ncias que n�o s�o nocivas", diferencia o otorrinolaringologista M�rcio Salmito, do Hospital Alem�o Oswaldo Cruz, em S�o Paulo.
Ou seja: o indiv�duo com essa condi��o inala part�culas de um composto que causa uma alergia nele. Na rinite, os al�rgenos mais comuns s�o �caros (artr�podes microsc�picos que vivem no colch�o e no travesseiro), pelos de animais, p�len das plantas ou poeira.
Esses compostos s�o suficientes para disparar uma resposta exagerada do sistema de defesa, que engatilha aquela s�rie de rea��es t�picas que descrevemos acima.

"E todo esse processo costuma ser ainda pior no outono e no inverno, quando ficamos em ambientes fechados, em contato frequente com os al�rgenos", diz a alergista Jane da Silva, que integra o Departamento Cient�fico de Rinite da Associa��o Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai).
"Para completar, o pr�prio tempo seco dessas esta��es deixa a mucosa do nariz mais vulner�vel, o que interfere na capacidade de filtragem", aponta a m�dica, que tamb�m � professora do Departamento de Cl�nica M�dica da Universidade Federal de Santa Catarina.
Mas se a ci�ncia j� sabe em detalhes o que est� por tr�s da rinite, por que ainda n�o existe uma cura para ela?
Um caminho �rduo
O m�dico Antonio Condino, do Departamento de Imunologia do Instituto de Ci�ncias Biom�dicas da Universidade de S�o Paulo, explica que aquela rea��o imunol�gica por tr�s da rinite � muito complexa e recruta diferentes tipos de c�lulas.
"Um dos gl�bulos brancos que est� envolvido nesse processo � o mast�cito, que libera uma subst�ncia chamada histamina", exemplifica. A tal da histamina, ali�s, � uma das respons�veis por sintomas como a coceira e a vermelhid�o.
Ou seja: n�o h� um alvo �nico que, ao ser desligado ou inibido, vai evitar definitivamente a crise de espirros e a dificuldade de respirar.
Condino tamb�m ensina que a rinite � uma doen�a polig�nica, que est� relacionada com muta��es em diversas partes do c�digo gen�tico humano.
"Existem algumas enfermidades imunol�gicas que s�o monog�nicas, causadas por altera��es em um �nico gene. Nesses casos, fica mais f�cil pensar em terapias g�nicas capazes de lidar com o problema", diz.
Com o avan�o cient�fico e tecnol�gico do momento, por�m, n�o � poss�vel "consertar" tantos genes por tr�s da rinite de uma s� vez.
Al�m dos entraves t�cnicos, n�o podemos ignorar tamb�m como � dif�cil criar um novo medicamento. Para ter ideia, o processo de desenvolver um novo rem�dio demora 12 anos e envolve um investimento m�dio de 2,5 bilh�es de d�lares, Como se n�o bastasse tudo isso, 90% das mol�culas avaliadas pelos farmac�uticos n�o passam nos testes cl�nicos e nem chegam �s farm�cias.
Ainda nessa seara, tamb�m devemos ter em mente que a rinite n�o costuma ser prioridade nos investimentos para as pesquisas, j� que falamos de uma doen�a que n�o costuma levar a quadros graves ou com risco de morte.
Mas o fato de a cura da rinite al�rgica ser algo praticamente ut�pico nos dias de hoje n�o significa que os pacientes est�o largados ao l�u.
Os tratamentos dispon�veis, que avan�aram significativamente nas �ltimas d�cadas, podem manter as crises sob controle na maioria das vezes, como voc� confere a seguir.
Como desentupir o nariz
Ap�s o diagn�stico, o primeiro passo fundamental para controlar as crises de rinite � fazer algumas modifica��es em casa.
"� preciso ventilar bem o quarto, fazer limpezas regulares, trocar len��is uma vez por semana e evitar carpetes, tapetes, bichos de pel�cia e cortinas de pano", recomenda Silva.
Vale tamb�m colocar o travesseiro e o colch�o no sol de vez em quando e lavar roupas, cobertores e edredons que est�o guardados no arm�rio por muito tempo antes de utiliz�-los.
Todas essas atitudes t�m um objetivo em comum: controlar o ac�mulo das subst�ncias que causam alergia, como a poeira, os �caros e os pelos de animais. Esse cuidado deve ser redobrado no quarto de dormir, j� que passamos pelo menos um ter�o de nosso dia nesse ambiente.

A faxina, claro, n�o se limita � casa: tamb�m � necess�rio lavar o nariz. "Fazer uma limpeza di�ria das narinas com soro fisiol�gico ajuda a eliminar impurezas e hidratar a mucosa, o que previne irrita��es", complementa a alergista.
Al�m do controle do ambiente, os m�dicos tamb�m costumam prescrever algumas medica��es, a depender do grau da rinite e da frequ�ncia das crises.
"Para pacientes que s� t�m rinite al�rgica na primavera, por exemplo, podemos indicar rem�dios para aliviar os sintomas somente nessa �poca do ano", conta Salmito.
J� para as situa��es em que a rinite � mais grave ou aparece em qualquer m�s, n�o adianta apenas apagar o fogo. Nesses casos, os m�dicos tentam agir preventivamente.
"Nesses casos, os anti-inflamat�rios da classe dos cortic�ides podem ajudar", cita o otorrino.
"A boa not�cia � que essas drogas evolu�ram muito nos �ltimos 20 anos e hoje temos op��es aplicadas diretamente no nariz, que n�o s�o absorvidas pelo resto do corpo e provocam menos efeitos colaterais", completa.
Uma 'vacina' para a rinite?
Uma terceira alternativa farmacol�gica para destravar a respira��o envolve a imunoterapia.
Em suma, esse tratamento � feito ao longo de tr�s a cinco anos e oferece ao paciente doses crescentes da subst�ncia que provoca a rea��o al�rgica nele.
Se a pessoa tem um quadro de rinite causado por �caros, por exemplo, os especialistas produzem inje��es ou comprimidos com uma parcela m�nima do agente que provoca o gatilho das crises. Essa quantidade vai aumentando passo a passo.
"O objetivo � modificar aos poucos a resposta imunol�gica, de tal modo que a pessoa perca aquela sensibilidade que tinha quando era exposta ao al�rgeno", desvenda Silva. � como se o corpo se acostumasse aos poucos e n�o reagisse t�o mal �quela subst�ncia.

A efic�cia dessa op��o, por�m, varia de indiv�duo para indiv�duo. "Cerca de 30% dos pacientes t�m uma resolu��o quase total do quadro que apresentam. Outros melhoram significativamente", calcula Salmito.
"A perspectiva � que essa t�cnica evolua bastante pelos pr�ximos anos e aumente essa taxa de sucesso progressivamente", completa o especialista.
Outro ponto negativo da imunoterapia est� na acessibilidade: no Brasil, ela s� est� dispon�vel em cl�nicas privadas e n�o faz parte da cobertura dos planos de sa�de.
No sistema p�blico, s� � poss�vel encontrar alguns poucos servi�os que oferecem a "vacina contra a rinite", ligadas a grupos de pesquisa e hospitais universit�rios.
O controle do ambiente, os antial�rgicos, os anti-inflamat�rios e a pr�pria "vacina" podem at� n�o representar uma cura. Mas ao menos eles trazem uma grande possibilidade de controlar a rinite al�rgica — e evitar as penosas temporadas de nariz entupido.
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