
"Tem que ser muito filha de uma p* para vir 1 da manh� no pronto socorro por conta de uma infec��o urin�ria viu (sic). N�o tem outra express�o para descrever".
O coment�rio acima, postado no Twitter durante o fim de semana por um perfil de uma m�dica que se identifica como sendo de Rond�nia, viralizou, chocando e enfurecendo usu�rios.
Mas para a carioca Luciane Almeida, de 35 anos, trouxe � tona mem�rias dolorosas, que ela decidiu compartilhar tamb�m na mesma rede social.

Em 2009, Luciane conta que, devido a uma infec��o urin�ria, ficou internada na UTI (Unidade de Terapia Intensiva) por uma semana, foi colocada em coma induzido e teve que fazer hemodi�lise porque seus rins pararam de funcionar.
Hoje, mais de uma d�cada depois, ela recobrou a sa�de, mas n�o esquece do epis�dio que quase lhe tirou a vida. "A assistente social do hospital chegou a perguntar � minha fam�lia sobre os poss�veis preparativos para o meu funeral."
A BBC News Brasil n�o conseguiu confirmar a identidade do perfil que postou o coment�rio que abre esta reportagem e levou o assunto "infec��o" a "trending topic" no Twitter, mas conversou por telefone com Almeida.
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Em outro desdobramento, o Conselho Regional de Medicina do Paran� (CRM-PR) decidiu na segunda-feira (23/5) abrir uma sindic�ncia para apurar a conduta da suposta m�dica, que viveria em Curitiba e trabalharia numa unidade de pronto atendimento na regi�o metropolitana da capital paranaense.

Assim como Luciane, v�rios outros usu�rios relataram epis�dios semelhantes de infec��es urin�rias n�o tratadas envolvendo a si mesmos e pessoas pr�ximas, bem como outros problemas de sa�de.
Eu fui na emerg�ncia com infec��o urin�ria e o m�dico me mandou pra casa, no dia seguinte voltei pq n�o aguentava e estava em choque s�ptico, fiquei em coma 3 dias e fiz hemodi�lise %uD83E%uDD21
— Luciane Almeida (@lullyapropria) May 23, 2022Esta � a hist�ria de Luciane (a conversa foi editada por motivos de clareza).
"Tudo aconteceu no fim de 2009, quando eu tinha 22 anos. Comecei a sentir uma ard�ncia ao urinar. Achei que se tratava de uma cistite e me automediquei. A ard�ncia passou e voltei � vida normal.
Dois dias depois, senti uma dor estranha nas costas, mas pensei que era um problema na coluna. Era uma dor leve e suport�vel. Tomei um anti-inflamat�rio e fui para a piscina. Passei o dia bebendo refrigerante e comendo batata-frita. � noite, passei muito mal e tive que cancelar a noitada com meus amigos. A dor aumentou de intensidade e se tornou incapacitante. Foi quando pedi ao meu marido para me levar ao hospital. J� era madrugada.
Passei toda a manh� l�, fizeram todos os exames e o m�dico me passou um antibi�tico. Voltei para casa.
Era hor�rio do almo�o e n�o consegui comer nada. Fui direto para a cama. Estava exausta e com muito enjoo. Uma dor abdominal que n�o cedia de jeito algum.
Meu marido ficou estressado com a situa��o e achava que era exagero meu. Ele tentou me for�ar a comer e eu vomitei tudo. Andava curvada tamanha era a dor no abd�men.
Decidimos voltar ao hospital. Fui atendida por outra m�dica, que refez os exames. Quando os resultados chegaram, ela me mandou imediatamente fazer uma tomografia.
Fui colocada em uma cama na enfermaria para aguardar o diagn�stico. Foi ent�o que a m�dica veio at� mim com um semblante s�rio e disse: 'Voc� j� est� num quadro de choque s�ptico'.
Ela me explicou que, por causa da minha situa��o, n�o podia mais me dar antibi�tico via oral. Seria necess�rio administrar um antibi�tico intravenoso. Tamb�m disse que eu teria que permanecei durante dois dias na UTI. Inicialmente, me assustei, mas pensei: 's�o s� dois dias'.
Me lembro at� hoje. Quando entrei no CTI, me despedi do meu marido e falei: 't� vendo como n�o � exagero?'. Estava muito mal, delirante, n�o falava coisa com coisa. A m�dica, ent�o, me disse que teria que fazer a administra��o do antibi�tico por meio da minha veia jugular.
Comecei a entrar em p�nico. Tiveram que me segurar na maca. A m�dica falou: 'Vou ter que entubar voc� se voc� continuar assim'. Estava completamente fora de si, mas n�o porque sou rebelde. Em infec��es assim, voc� acaba perdendo seu eixo, n�o consegue pensar direto.
Fui entubada e colocada em coma induzido. O hospital avisou a minha m�e por telefone. Foi desesperador para minha fam�lia. Imagine, entrei falando na UTI. E de l� talvez n�o sa�sse viva. Fiquei quase tr�s dias em coma. Minha fam�lia me disse depois que fiquei irreconhec�vel porque os meus dois rins pararam e tive que fazer hemodi�lise.
Fiquei completamente inchada. Virei uma 'bolha humana'. Fiz hemodi�lise por dois dias e, quando me tiraram da seda��o, me lembro de ter acordado bastante debilitada, porque minha satura��o de oxig�nio caiu bastante durante esse per�odo. Tive que fazer fisioterapia respirat�ria durante o restante do tempo que passei na UTI. Tamb�m permaneci com uma sonda para me alimentar, que depois foi retirada.
O m�dico que me acompanhou no CTI foi categ�rico: eu s� sobrevivi porque era muito jovem. Meu organismo reagiu muito bem ao tratamento.

Foi um milagre, na verdade.
Quando estava no pior momento do coma e da hemodi�lise, a assistente social do hospital chamou minha m�e e chegou a perguntar se minha fam�lia estava preparada financeiramente para meu vel�rio.
Ao todo, fiquei uma semana na UTI e depois mais alguns dias no quarto. Quando sa� da UTI, havia perdido nove quilos. Aos poucos, fui recuperando os movimentos. N�o conseguia nem me mexer direito.
Durante minha estadia na UTI, tr�s pessoas morreram de pielonefrite aguda (quando a infec��o ascende aos rins, tornando-se mais grave), mas eram mais idosas.
E ao voltar para casa, ainda tive que tomar antibi�tico por 14 dias.
A suspeita dos m�dicos foi que eu contra� uma bact�ria comum, pois n�o houve resist�ncia ao antibi�tico. Cheguei a investigar para ver se eu tinha algum problema de sa�de subjacente que desconhecia, mas n�o tinha nada de errado comigo. Foi algo aparentemente pontual.
Quando vi o tu�te dessa suposta m�dica, fiquei indignada. Al�m de mostrar total falta de sensibilidade, ela parece n�o ter conhecimento t�cnico algum.
Sou o exemplo vivo de que uma infec��o urin�ria �, sim, coisa s�ria.

Opini�o do especialista
Osvaldo Merege Vieira Neto, presidente da Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), explica que h� infec��es urin�rias de diferentes gravidades.

"H� casos leves, como cistite, mas h� outros que matam, se o m�dico n�o intervier rapidamente. J� vi um caso de um paciente vir a �bito em poucas horas, especialmente quando afeta os rins (pielonefrite)".
"O coment�rio desta suposta m�dica � absurdo. Infec��o urin�ria pode ser potencialmente grave e matar. "
"Quando voc� tiver sintomas espec�ficos de infec��o urin�ria, voc� n�o deve ficar esperando. Voc� deve buscar ajuda m�dica imediatamente", conclui.
Mulheres mais atingidas
Segundo dados da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU), a infec��o do trato urin�rio (ou infec��o urin�ria) � associada � bact�ria 'Escherichia coli' em cerca de oito a cada 10 casos.
Mas as causas por tr�s desse problema de sa�de s�o diversas, entre elas higiene inadequada, hist�rico familiar, gesta��o, infec��o hospitalar, atividade sexual e doen�as cr�nicas, como diabetes.
A infec��o urin�ria pode afetar bexiga (quando ganha o nome de cistite), uretra (uretrite) ou rins (pielonefrite).
Entre os sintomas, o principal deles � a urg�ncia urin�ria (dificuldade de controlar), mas muitos pacientes s�o assintom�ticos.
As mais atingidas s�o as mulheres: estima-se que mais de 50% delas v�o ter ao menos um epis�dio de infec��o do trato urin�rio ao longo da vida.
Isso porque a uretra, mais curta do que a dos homens, facilita a entrada de bact�rias no canal urin�rio, que alcan�am a bexiga e encontram um ambiente �mido e aquecido, prop�cio ao seu desenvolvimento.
Os idosos tamb�m costumam ser afetados com maior frequ�ncia.
E, com a chegada do ver�o, crescem as ocorr�ncias de infec��es urin�rias — as temperaturas mais elevadas, ideais para maior frequ�ncia em praias e piscinas, "favorecem o aumento da umidade em �reas �ntimas, o que modifica a popula��o de bact�rias e germes comuns dessa regi�o, causando um desequil�brio que propicia o desenvolvimento de infec��es", segundo a Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN).

Preven��o
Segundo a SBN, estas s�o as recomenda��es para evitar infec��es urin�rias:
- Ingest�o de �gua suficiente para provocar de seis a oito mic��es, distribu�das uniformemente ao longo do dia
- Revis�o de h�bitos de higiene, utilizando apenas papel higi�nico descart�vel, evitando uso de duchas e produtos espec�ficos propagados como "mais seguros" a cada mic��o;
- Utiliza��o de �gua e sabonete ap�s as evacua��es, com cuidado no direcionamento do fluxo de �gua para o enxague;
- Regulariza��o do ritmo intestinal, pois longos per�odos de constipa��o permitem a prolifera��o bacteriana pela presen�a de fezes ressecadas na ampola retal;
- Revis�o ginecol�gica anual, para mulheres e consulta urol�gica para os homens, especialmente quando apresentam quadros pouco comuns de ITU;
- Cuidados de higiene antes e ap�s as rela��es sexuais;
- Uso de preservativos;
- Dar prefer�ncia por roupas �ntimas de algod�o, evitando tecidos sint�ticos e modelos "colados" ao corpo, especialmente nas regi�es �ntimas.
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