
Por que temos fome perto da hora do almo�o e sentimos sono ao anoitecer? A resposta est� no nosso ritmo circadiano — popularmente conhecido como rel�gio biol�gico —, que regula as atividades di�rias do organismo num per�odo de (aproximadamente) 24 horas.
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Este mecanismo interno est� presente em todos os seres vivos — e mant�m nosso corpo funcionando dentro de um cronograma, dia e noite, onde quer que voc� esteja.
"Essencialmente, � a representa��o biol�gica interna de um dia", explica Russell Foster, professor de neuroci�ncia circadiana da Universidade de Oxford, no Reino Unido, � BBC Radio 4.
"Ele oferece uma estrutura temporal para nossa biologia funcionar efetivamente. Temos que entregar a subst�ncia certa, nas concentra��es certas, para os �rg�os certos, na hora certa do dia. E � nosso rel�gio biol�gico, nosso sistema circadiano, que nos permite essa organiza��o temporal, essa estrutura temporal."
Ele dita, portanto, o ritmo de praticamente todas as oscila��es que acontecem no nosso organismo — na temperatura corporal, na press�o arterial, nos n�veis de horm�nio, na produ��o de urina, na frequ�ncia card�aca, e por a� vai.
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E assim nos orienta em rela��o � melhor hora do dia para determinadas atividades, como dormir, comer e pensar.
Onde fica este rel�gio?
Nosso ritmo circadiano � regido por um rel�gio-mestre localizado no c�rebro — mais especificamente, no n�cleo supraquiasm�tico (NSQ), dentro do hipot�lamo.
E cada c�lula do corpo, por sua vez, tem seu pr�prio rel�gio, os chamados rel�gios perif�ricos, que seguem o ritmo do rel�gio-mestre.
"O rel�gio-mestre age um pouco como o maestro de uma orquestra, produzindo uma batida temporal regular, a partir da qual todas as bilh�es de c�lulas do corpo, em todos os sistemas de �rg�os do corpo, coordenam esta atividade r�tmica e a alinham � rota��o da Terra de 24 horas", explica o especialista.
Mais de 24 horas
Mas nosso rel�gio interno n�o tem exatamente 24 horas. De acordo com Foster, os ponteiros giram um pouco mais r�pido ou devagar, dependendo do indiv�duo.
Para sermos mais precisos, um estudo da Universidade de Harvard, nos EUA, mostrou que o ritmo circadiano tem em m�dia 24 horas e 11 minutos — com base no monitoramento di�rio dos horm�nios e da temperatura corporal dos participantes.
Por isso, � preciso acertar diariamente os ponteiros do nosso rel�gio-mestre, de modo que fiquem em sincronia com as 24 horas do dia.
E � a nossa exposi��o di�ria � luz do Sol — ou melhor, ao ciclo natural claro (dia) / escuro (noite) — que nos mant�m sincronizados com o mundo exterior, ajustando nosso rel�gio interno.

Basicamente, um grupo de c�lulas fotossens�veis presentes na retina do olho detecta a luz ambiente, fornecendo informa��es por meio do nervo �ptico ao c�rebro sobre a dura��o do dia e da noite — o que ajuda a garantir que nosso rel�gio interno seja mantido em sincronia com o dia astron�mico de 24 horas.
Sem este mecanismo, os 11 minutos a mais do nosso ritmo circadiano se acumulariam e voc� acordaria e iria dormir um pouco mais tarde a cada dia.
Por que � importante
A vantagem adaptativa de ter um rel�gio interno � permitir que nosso organismo antecipe certos eventos previs�veis — como o ciclo de sono-vig�lia e as refei��es, por exemplo — e se prepare para eles.
Quando anoitece, nosso corpo se prepara para descansar, e come�a a produzir melatonina, o horm�nio do sono. Ao amanhecer, no entanto, libera cortisol para que a gente desperte.

O cronograma dos horm�nios da fome — leptina (respons�vel pela saciedade) e grelina (por abrir o apetite) — segue o mesmo princ�pio, ou melhor, o mesmo rel�gio.
De acordo com Foster, estudos recentes mostram que a libera��o de leptina atinge seu pico por volta das 2h da manh�, e o ponto mais baixo ao meio-dia. "Normalmente, os altos n�veis de leptina � noite inibem o apetite para que a fome n�o atrapalhe seu sono."
"Enquanto isso, a grelina � secretada pelo est�mago durante o dia e aumenta em antecipa��o �s refei��es", escreveu o especialista em um artigo para o jornal brit�nico Daily Mail.

Ele lembra que n�o respeitar este ritmo natural pode ter consequ�ncias s�rias para o nosso organismo. Pesquisas mostram que viver fora de sincronia pode nos deixar mais vulner�veis %u200B%u200Ba problemas de sa�de, como infec��es, c�ncer, obesidade, diabetes tipo 2, doen�as card�acas e transtornos de sa�de mental, como depress�o.
� um desafio real para quem trabalha � noite, sofre de dist�rbios do sono ou apresenta certas defici�ncias visuais que impedem que a luz chegue �s c�lulas fotossens�veis da retina.
Como foi descoberto
O astr�nomo franc�s Jean Jacques d'Ortous de Mairan, no s�culo 18, foi um dos primeiros a levantar a hip�tese de que os seres vivos possuem uma esp�cie de rel�gio interno que regula suas atividades.
Ele fez isso a partir da observa��o de uma planta: a mimosa, popularmente conhecida como dormideira. Quem conhece sabe que as folhas desta esp�cie se fecham mediante o toque ou quando anoitece (e voltam a abrir quando o dia amanhece).
E o que De Mairan percebeu por meio de experimentos foi que ao colocar a planta em um arm�rio fechado — ou seja, na total escurid�o —, suas folhas continuaram a reproduzir o mesmo mecanismo por v�rios dias.
"Ele viu as folhas da planta mimosa abrirem e fecharem sob condi��es constantes (de escurid�o, por exemplo)", explica Foster.
Ou seja, n�o era s� a luz que ditava seu ritmo, mas algo dentro dela.
Mas, de acordo com o especialista, s� h� cerca de 60 anos que os pesquisadores come�aram a estudar esses ritmos nos seres humanos.
O conhecimento na �rea foi crescendo a ponto de, em 2017, tr�s cientistas americanos dividirem o Pr�mio Nobel de Medicina por terem desvendado "os mecanismos moleculares que controlam o ritmo circadiano".
"Ent�o sabemos um pouco (sobre o rel�gio biol�gico) h� algum tempo, como fenomenologia. Mas a coisa realmente empolgante nos �ltimos 30 anos � que entendemos o que faz o rel�gio biol�gico, como os genes e seus produtos proteicos interagem para gerar uma oscila��o biol�gica de 24 horas", diz Foster.
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