
Em 10 de fevereiro de 2016, Ali Berino, um et�ope que trabalha para paleont�logos no s�tio de Miro Dora, em Afar, encontrou uma mand�bula superior exposta na superf�cie de dep�sitos arenosos. Aquilo era diferente de qualquer outra pe�a em que ele j� havia colocado os olhos. Os cientistas que comandam a explora��o da �rea tamb�m ficaram impressionados, e mais ainda quando descobriram um cr�nio inteiro, no qual o maxilar se encaixava perfeitamente. Nos anos seguintes, a equipe do chamado Projeto Paleontol�gico Woranso-Mille se dedicou ao estudo de data��o da �rea. As an�lises revelaram que se trata do �nico esp�cime bem preservado do ancestral de Lucy, a Australopithecus afarensis, referida muitas vezes como a “m�e da humanidade”.
A esp�cie � qual pertence o cr�nio � a Australopithecus anamensis e, por ora, trata-se da mais antiga representante do g�nero Australopithecus, um homin�deo do qual o homem moderno descende. Ela j� era conhecida, mas, at� ent�o, s� havia dentes e fragmentos �sseos, datados de 4,2 milh�es e 3,9 milh�es de anos, descobertos em 1981. O esp�cime escavado em Miro Dora tem 3,8 milh�es de anos e, como o cr�nio est� completo, revelou a face do “av�” da humanidade.
“Ele tem uma mistura de caracter�sticas faciais primitivas e derivadas que eu n�o esperava ver em um �nico indiv�duo”, disse, em uma coletiva de imprensa, o paleont�logo Yohannes Haile-Selassie, do Museu de Hist�ria Natural de Cleveland, que liderou o estudo sobre esse f�ssil. “O A. anamensis j� era uma esp�cie sobre a qual sab�amos algumas coisas, mas esse � o primeiro cr�nio descoberto. � bom finalmente conseguirmos dar uma face ao nome. At� agora, t�nhamos um gap muito grande entre o ancestral humano mais antigo conhecido, que tem cerca de 6 milh�es, e as esp�cies como as de Lucy, entre 2 milh�es e 3 milh�es de anos. Um dos aspectos mais interessantes dessa descoberta � que o esp�cime faz a ponte no espa�o morfol�gico entre os dois grupos”, complementou Stephanie Melillo, pesquisadora do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva e coautora de dois artigos sobre a descoberta, publicados na revista Nature.
Al�m de revelar uma importante pe�a da anatomia do A. anamensis, o cr�nio desafia a cren�a de que a transi��o dessa esp�cie para a de Lucy foi linear. Ao contr�rio, a data��o demonstra que, por 100 mil anos, eles coexistiram. O f�ssil foi encontrado a 55 quil�metros de Hadar, onde Lucy foi escavada, em 1974. “N�s costum�vamos pensar que o A. anamensis gradativamente se transformou no A. afarensis ao longo do tempo. Ainda acreditamos que as duas esp�cies tiveram uma rela��o de ancestral-descendente, mas a nova descoberta sugere que elas estavam, na verdade, vivendo juntas em Afar por algum tempo. Isso muda nossa compreens�o sobre o processo evolutivo e levanta novas quest�es. Por exemplo: elas competiam por comida e espa�o?”, questionou Melillo. Para Selassie, trata-se de uma reviravolta sobre a evolu��o humana durante o Plioceno.

PAISAGEM
A edi��o da Nature tamb�m traz um artigo de Beverly Saylor, pesquisadora da Universidade da Reserva de Case Western, que determinou a idade do f�ssil por meio da data��o de minerais nas camadas de rochas vulc�nicas pr�ximas ao local em que ele foi encontrado. Saylor e a equipe da universidade combinaram observa��es em campo com an�lises de restos biol�gicos microsc�picos para reconstruir a paisagem, a vegeta��o e a hidrologia da �poca e do local onde o esp�cime descoberto morreu. O indiv�duo foi encontrado em dep�sitos arenosos no delta, onde um rio se encontra com um lago. O rio provavelmente se originou nas terras altas do plat� et�ope, enquanto o lago desenvolveu-se em eleva��es mais baixas, afirma a pesquisadora.
F�sseis de p�len e gr�os, al�m de restos qu�micos de plantas e algas preservados no lago e nos sedimentos do delta forneceram algumas pistas sobre as condi��es ambientais na �poca em que o A. anamensis viveu. Especificamente, eles indicam que a bacia hidrogr�fica era basicamente seca, mas que tamb�m havia �reas de floresta �s margens do delta e do sistema lacustre. “Ele viveu perto de um grande lago em uma regi�o que era seca. Estamos ansiosos para conduzir mais trabalhos nesses dep�sitos para entender o ambiente do esp�cime, a rela��o com as mudan�as clim�ticas e como isso afetou a evolu��o humana de forma geral”, disse, em uma nota, Naomi Levin, pesquisadora e coautora do estudo.