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Estado de Minas MEM�RIA

Como a Ci�ncia explica que nunca esquecemos de algumas m�sicas

A m�sica tem um alto componente emocional em nossa vida, que est� relacionado at� mesmo ao modo como nossos pais falam conosco quando somos beb�s e que perdura mesmo quando uma doen�a degenerativa nos ataca


23/11/2020 09:12 - atualizado 23/11/2020 11:04


Canções nos fazem evocar memórias ou momentos especiais(foto: Getty Images)
Can��es nos fazem evocar mem�rias ou momentos especiais (foto: Getty Images)

Para ter mem�ria, o mundo criou a m�sica. No in�cio das civiliza��es, os principais saberes de diferentes culturas eram passados %u200B%u200Bde gera��o em gera��o atrav�s da tradi��o oral. E essa tradi��o oral dependia da mem�ria.

"Antes que as narrativas pudessem ser escritas, elas eram recitadas ou cantadas", diz David C. Rubin, professor de Psicologia da Universidade Duke, no livro Memory in Oral Tradition (Mem�ria em tradi��o oral, em tradu��o livre).

� por isso que textos como A Il�ada, a Odiss�ia e outros grandes �picos antigos foram transmitidos pela primeira vez na forma de versos.

Ent�o, a m�sica ocupou esse mesmo espa�o. As can��es nos levam a um lugar, um momento.

N�o sabemos ainda muito bem o porqu�, mas a m�sica � uma das poucas armas que os terapeutas t�m para lidar com o avan�o do mal de Alzheimer, a forma mais comum de dem�ncia em idosos.

Mas como a m�sica tem esse efeito na mem�ria? Por que nunca esquecemos de nossas m�sicas favoritas?

"A m�sica tem a capacidade dupla de criar e recuperar mem�rias dentro do c�rebro humano", diz a psic�loga Luc�a Amoruso, pesquisadora da Universidade de Buenos Aires na Argentina, que investiga aspectos do comportamento e da m�sica.

"Quando as pessoas sofrem de dem�ncia senil ou Alzheimer, em muitos caso,s a m�sica � a �nica chave que lhes resta para desbloquear essas mem�rias."

M�sica materna


Os pais têm um papel importante na criação de uma memória musical(foto: Getty Images)
Os pais t�m um papel importante na cria��o de uma mem�ria musical (foto: Getty Images)

Embora existam muitas teorias, n�o existe uma definitiva sobre quando a m�sica apareceu na vida do ser humano.

De todas as hip�teses, incluindo a que indica que se pretendia imitar o "canto" dos animais, h� uma surpreendente: a que sugere que foi a forma que as m�es encontraram para acalmar seus filhos.

"Em tempos pr�-hist�ricos, as m�es tinham que se afastar de seus beb�s em intervalos regulares para ter as m�os livres para outras atividades e usavam uma forma de falar como beb�s, um 'tom maternal', para tranquiliz�-los", explica Dean Falk, antrop�logo da Universidade da Fl�rida no livro How Humans Achieved their Words (Como humanos conquistaram suas palavras, em tradu��o livre).

A tonalidade, aquela musicalidade com que nossas m�es falam conosco especialmente quando somos beb�s, abre nossos primeiros canais em nossa mem�ria.

"V�rias an�lises indicaram que o c�rebro dos beb�s tem a capacidade de responder � melodia muito antes que a comunica��o possa ser estabelecida por meio de palavras", diz Amoruso.

"A m�sica, de alguma forma, nos ajuda a criar nosso primeiro v�nculo social, que � com nossos pais. E isso ser� replicado em nossos outros la�os sociais no futuro e, claro, com a m�sica."

Ent�o, quando crescemos com essa programa��o, toda vez que ouvimos uma melodia, um processo impressionante ocorre em nosso c�rebro: em vez de ativar uma �rea ou regi�o, v�rias s�o ativadas.

"A primeira coisa que ocorre no c�rebro quando ouvimos m�sica � que nosso centro de prazer � ativado e libera dopamina, que � basicamente um neurotransmissor que nos deixa felizes", explica Robert Zatorre, que � m�sico, psic�logo e fundador do Centro de Pesquisa do C�rebro, M�sica e Som, no Canad�.

Normalmente, as m�sicas que memorizamos ficam no lobo frontal, onde est� localizada nossa "discoteca" mental.

"No entanto, embora pare�a que a m�sica simplesmente nos d� prazer e o guardamos na mem�ria, a verdade � que muito mais coisas acontecem em nossas cabe�as", diz Zatorre.


Desde pequenos, nós temos uma forte ligação com a música(foto: Getty Images)
Desde pequenos, n�s temos uma forte liga��o com a m�sica (foto: Getty Images)

O c�rebro, para come�ar, compara a melodia que est� ouvindo com aquela gravada em sua cabe�a, o que nos permite reconhecer uma m�sica simplesmente ouvindo suas primeiras notas.

"E outro processo que ocorre � que o c�rebro deve separar a m�sica do ru�do externo. Esse processo tamb�m � bastante complexo, porque devemos iniciar v�rios processos cognitivos", explica Zatorre.

M�sicas favoritas

Mas o que acontece quando uma m�sica n�o s� transmite prazer, mas tamb�m emo��es (que podem at� ser tristes) e desperta sentimentos?

Recentemente, por ocasi�o do Dia Mundial da Luta contra a Doen�a de Alzheimer, perguntamos aos leitores sobre as can��es que pensavam que nunca iriam esquecer.

E embora muitas delas estivessem relacionadas ao amor, a verdade � que a maioria era determinada por um momento preciso da vida: o nascimento de um filho, a primeira viagem ao exterior, a morte de um amigo, a liberta��o da pris�o.

Na ci�ncia, essa correla��o tamb�m � explicada pela conex�o das melodias com a mem�ria.

"Existem v�rios sistemas de mem�ria: epis�dica, temporal, sem�ntica, de curto prazo, de longo prazo", enumera Amoruso.


A música está relacionada ao prazer, mas também está ligada às emoções(foto: Getty Images)
A m�sica est� relacionada ao prazer, mas tamb�m est� ligada �s emo��es (foto: Getty Images)

Assim como uma m�sica pode fazer parte de um momento espec�fico, como uma viagem inesquec�vel, o momento em que nos apaixonamos por algu�m, uma conquista importante, o artista que interpreta a m�sica ou a letra da m�sica tamb�m desempenha um papel importante.

"Uma viagem, um momento, fazem parte da mem�ria epis�dica, mas acontece que a m�sica � interpretada por um artista que conhecemos bem, suas caracter�sticas, hist�ria... A� tamb�m se ativa a mem�ria sem�ntica", afirma o especialista.

"Para ser armazenada em nosso c�rebro, a m�sica depende de todos esses sistemas de mem�ria", acrescenta.

'Toque de novo'

Para Zatorre, al�m desse processo, com a m�sica, tamb�m existe um fen�meno associado � repeti��o.

"O que acontece quando gostamos muito de uma m�sica? N�s a repetimos", diz ele.

"E n�o apenas por um breve per�odo. Por exemplo, uma m�sica que nos marcou quando t�nhamos 15 anos, podemos ouvi-la muitas vezes pelo resto de nossas vidas. Ela acaba gravada na nossa mem�ria de forma excepcional", explica Zatorre.

"Algo que n�o acontece da mesma forma com outras coisas que nos d�o prazer: comer nossa comida favorita ou visitar nosso lugar preferido", completa.

E a� vem outro fator: a m�sica n�o s� cria mem�rias e evoca emo��es, mas tamb�m condiciona nosso comportamento e nossas mem�rias.

Um dos principais estudos de Amoruso examinou como, por meio da m�sica, as pessoas podem antecipar o comportamento dos outros.

Em sua pesquisa, intitulada "O tempo do tango: experi�ncia e antecipa��o contextual durante a observa��o da a��o", a neurologista destaca que as pessoas estudadas que ouviam tango h� muitos anos (e tamb�m o dan�avam) podiam antecipar, em apenas milissegundos, o erros que quem nunca tinha ouvido a famosa melodia argentina ia cometer ao dan�ar pela primeira vez.

"O que os resultados deste estudo mostram � que as rea��es no c�rebro que permitiram antecipar esse erro foram inteiramente devidas � experi�ncia de quem ouvia e dan�ava tango h� muitos anos", explica.

At� o �ltimo suspiro

Recentemente, viralizou um v�deo de uma idosa sentada em uma cadeira, que depois que algu�m a fez ouvir a famosa pe�a de bal� O Lago dos Cisnes, de Pyotr Ilyich Tchaikovsky, parece come�ar a dan�ar.

Em sua cadeira de rodas, com os olhos fechados, como se evocassem uma luz, realiza movimentos de bal� com as m�os, quase como se estivesse diante de um audit�rio lotado.


Nem todos os pacientes que têm Alzheimer reagem da mesma forma à música(foto: Getty Images)
Nem todos os pacientes que t�m Alzheimer reagem da mesma forma � m�sica (foto: Getty Images)

Mas a verdade � que ela estava em uma casa de repouso. Seu nome era Marta Gonz�lez, e ela sofria de Alzheimer (faleceu em 2019, logo ap�s a grava��o do v�deo). Mas ela havia estudado bal� em Cuba e n�o havia esquecido aqueles belos movimentos do Lago dos Cisnes, apesar do avan�o da doen�a. E eles foram ativados ao ouvir m�sica.

Como isso pode acontecer, se um dos locais mais afetados pelo Alzheimer � o lobo frontal?

"� algo que ainda n�o podemos responder de forma conclusiva. O que poder�amos afirmar � que a m�sica � a chave para muitas mem�rias que ainda est�o na nossa mem�ria, apesar de sofrermos de uma doen�a degenerativa", explica Amoruso.

No entanto, nem qualquer m�sica pode ser usada para tratar pessoas afetadas por dem�ncia senil ou Alzheimer.

"N�o se pode dizer com certeza que a m�sica � a �ltima coisa que esquecemos. Muitos pacientes com Alzheimer n�o reagem aos tratamentos com m�sica", diz Zatorre.

Mas o especialista aponta uma diferen�a: quando a m�sica para o tratamento � escolhida pelo paciente � quando h� os melhores resultados.

"O v�nculo com a m�sica e a mem�ria tem um alto grau emocional. Muitos desses pacientes acessam essas mem�rias gra�as � m�sica. Na verdade, �s vezes, � o �ltimo recurso para acessar essas mem�rias", nota Amoruso.

Para Zatorre e Amoruso, a m�sica tamb�m tem sido um elemento fundamental para lidar com o confinamento. E talvez seja assim que nos lembramos de 2020 e do contexto da pandemia do coronav�rus.

"Muitos dos pacientes que tratei me confessaram que nem sexo, nem comida, nem bebida alco�lica ajudaram muito a lidar com o confinamento e as circunst�ncias que nos levaram a viver a pandemia", disse Zatorre .

"A maioria indica que a m�sica tem sido sua maior aliada. Que essa tem sido uma forma de aguentar o que est� acontecendo. E tenho certeza que muitas mem�rias foram criadas a partir dessa combina��o."


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