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Estado de Minas ANIMAIS MISTERIOSOS

A curiosa ilha povoada por pequenos mam�feros voadores em formato de pipas

Apesar de ser encontrado na maioria dos habitats florestais do sudeste asi�tico, pouco se sabe sobre o colugo, ou l�mure-voador; naturalista espera mudar isso


02/05/2021 13:39 - atualizado 02/05/2021 16:20

As habilidades de camuflagem dos colugos os ajudaram a passar despercebidos da atenção popular(foto: VINCENT_ST_THOMAS/GETTY IMAGES)
As habilidades de camuflagem dos colugos os ajudaram a passar despercebidos da aten��o popular (foto: VINCENT_ST_THOMAS/GETTY IMAGES)
Voc� n�o precisa ir muito longe dos hot�is da ilha paradis�aca de Langkawi, na Mal�sia, para se deparar com as casas coloridas de telhado baixo do seu interior verdejante.

Esta � a �rea rural de Langkawi em sua forma mais buc�lica; onde b�falos-do-p�ntano pastam tranquilamente na companhia de suas fi�is companheiras, as gar�as-vaqueiras.

Seguindo para noroeste, as plan�cies d�o lugar aos cumes irregulares do Machinchang Cambrian Geoforest Park, resultado da atividade geol�gica de 500 milh�es de anos, agora coberto por uma exuberante floresta tropical.


Alguns dos resorts de luxo da ilha est�o localizados entre esta floresta tropical e a costa norte. Embora sejam normalmente abertos apenas para h�spedes, minha guia, a primatologista e conservacionista francesa Priscillia Miard, tem uma boa rela��o com moradores naturalistas e conseguimos acesso para passear pelos jardins do Andaman Resort sem supervis�o.

"Eles constru�ram trilhas pela floresta tropical, que � o local perfeito para avistar mam�feros noturnos", explicou Miard, mal conseguindo conter a emo��o, no estilo do c�lebre naturalista e apresentador brit�nico David Attenborough.

As cigarras nos deram as boas-vindas � floresta tropical com um coro estridente. Algo saltou acima das nossas cabe�as, um esquilo-voador talvez, seguido de perto por um par de morcegos frug�voros que zumbiam entre as palmeiras como dois amantes dan�ando.

Quando caiu a noite na ilha, ficou evidente que outro mundo havia despertado.

Logo nos encontramos com dois dos assistentes de pesquisa de Miard — Fizri Zubir, aluno de mestrado na Universidade Sains Malaysia, que estuda o comportamento dos colugos, segurando uma c�mera; e Nur Liyana Binti Khalid, que estuda ci�ncias florestais na Universidade de Malaysia Sabah, ostentando uma lanterna na cabe�a como se estivesse se preparando para descer uma caverna.

Mas a aten��o deles estava voltada para o alto: a luz vermelha vasculhava as �rvores como uma patrulha noturna � procura de combatentes em uma guerra na selva. Miard usava uma c�mera de imagem t�rmica para rastrear as sombras. N�o demorou muito para encontrarmos o que est�vamos procurando.

"Tem um ali", disse Zubir, apontando para o tronco de uma �rvore enorme.

Além das praias turísticas, Langkawi tem um interior verdejante e rural(foto: THOMAS BIRD)
Al�m das praias tur�sticas, Langkawi tem um interior verdejante e rural (foto: THOMAS BIRD)

Atrav�s da fraca ilumina��o, avistamos um objeto redondo suspenso sob um dos galhos, que mal era poss�vel distinguir e poderia facilmente ter passado por uma jaca — se n�o come�asse a se desdobrar.

"Est� prestes a come�ar seu ritual matinal!", afirmou Miard, da mesma maneira como uma m�e orgulhosa poderia falar de seu filho.

A criatura se espregui�ou e, em seguida, se agarrou ereta com suas garras afiadas na �rvore e come�ou a se preparar. Sua pele chamava aten��o porque, francamente, havia muita.

Uma membrana que se estende do seu pesco�o passando por suas m�os e p�s at� a cauda, %u200B%u200Bcom um formato semelhante a uma pipa, diferencia o colugo, antes conhecido como l�mure-voador, de outros planadores noturnos como o esquilo-voador, que tem uma cauda longa que usa para guiar seu voo.

Como n�o voam, tampouco usam a cauda como leme, os colugos, com a l�gica de uma asa-delta que salta de uma encosta, normalmente sobem em uma �rvore antes de tentar planar. Ainda assim, seu alcance � impressionante.

De acordo com Miard, eles foram filmados fazendo um voo planador de 150m, embora saltos de 30m ou menos sejam muito mais comuns.

Lembrando uma pipa, os colugos podem planar por até 150m no ar(foto: THAWATS/GETTY IMAGES)
Lembrando uma pipa, os colugos podem planar por at� 150m no ar (foto: THAWATS/GETTY IMAGES)

Depois de se preparar, o colugo ergueu o rabo para se livrar do jantar do dia anterior. Foi dif�cil n�o tra�ar paralelos entre os h�bitos dos colugos e o que n�s, humanos, costumamos fazer pela manh�.

"Os colugos n�o est�o muito distantes de n�s," afirmou Miard.

"As pessoas costumavam pensar que eram parentes de morcegos ou esquilos, mas isso n�o � verdade. Na verdade, os primatas s�o alguns de seus parentes vivos mais pr�ximos."

O status de elo perdido do colugo — eles, na verdade, pertencem � sua pr�pria ordem, dos derm�pteros, tendo sobrevivido mais que todos os seus primos planadores mam�feros mais pr�ximos — � apenas uma de suas qualidades intrigantes, que tamb�m incluem alimentar seus filhotes com leite excretado de gl�ndulas localizadas sob suas axilas; prefer�ncia por folhas e flores a frutos; lamber seus olhos como lagartos para limp�-los; e se comunicar por meio de ultrassom (como morcegos quase cegos), apesar de ter uma boa vis�o.

"Eles geralmente dormem em �rvores diferentes de onde gostam de se alimentar", observou Miard, enquanto um colugo pulava da copa das �rvores, planando sobre nossas cabe�as como um filhote de gato amarrado a uma pipa.

Ele pousou sem incidentes e imediatamente come�ou a comer uma suculenta salada de folhas e um acompanhamento de l�quen rico em minerais, que consumiu diretamente do galho.

Os humanos viveram junto aos colugos por s�culos. Eles foram registrados pela ci�ncia pela primeira vez em 1758 — e fizeram at� uma apari��o na Viagem Ao Arquip�lago Malaio, texto seminal do renomado naturalista brit�nico Alfred Russel Wallace, escrito em 1869:

"Outro animal curioso que conheci em Cingapura e em Born�u [...] � o Galeopitec�deo, ou l�mure-voador. Essa criatura tem uma ampla membrana que se estende ao redor de seu corpo at� as extremidades dos dedos dos p�s, e at� a ponta de sua cauda bastante longa. Isso permite que ele passe obliquamente pelo ar de uma �rvore para outra... "

Os colugos tampouco s�o incomuns. Embora o colugo filipino seja exclusivo de apenas algumas ilhas das Filipinas, o colugo malaio � encontrado na maioria dos habitats florestais do sudeste asi�tico. O que levanta a quest�o �bvia: por que n�o se sabe mais sobre eles?

� um enigma que come�ou a intrigar Miard nos �ltimos tr�s anos, enquanto estudava mam�feros noturnos nas ilhas malaias de Penang e Langkawi como parte de sua pesquisa de doutorado.

"Em Penang [uma ilha a apenas 108 km ao sul de Langkawi], onde comecei minha pesquisa, me concentrei principalmente na metodologia de pesquisa para rastrear mam�feros noturnos, como civeta, loris-lento, cervo-rato e javali selvagem," contou.

Os colugos comem folhas e flores diretamente dos galhos das árvores(foto: PRISCILLIA MIARD)
Os colugos comem folhas e flores diretamente dos galhos das �rvores (foto: PRISCILLIA MIARD)

"Mas encontrei colugos vivendo em todos os lugares. Eles viviam em fazendas e em jardins � beira da estrada. Mas havia tantos dados faltando. Isso � o que me deixou realmente interessada em estud�-los."

Uma raz�o comumente citada para nossa persistente falta de conhecimento em rela��o aos colugos � que eles s�o animais sens�veis. De acordo com o naturalista Irshad Mobarak de Langkawi, "nenhum zool�gico do mundo os criou com sucesso em cativeiro".

Suas fant�sticas habilidades de camuflagem, h�bitos noturnos e o fato de terem as �rvores como habitat tamb�m aludem ao motivo de terem escapado da aten��o popular por tanto tempo. Al�m disso, eles n�o nos comem, e tampouco n�s a eles.

Mas, para um naturalista dedicado, nenhuma desculpa pode compensar uma lacuna desconcertante no conhecimento cient�fico.

Sabendo que a observa��o e o trabalho de campo seriam essenciais para conhecer os colugos, Miard se mudou para Langkawi em 2018, onde uma cobertura florestal maior e terras mais planas auxiliam sua pesquisa, al�m de fornecer um local secund�rio para comparar suas descobertas em Penang.

Com a ajuda da Malaysian Primatological Society, ONG com sede em Penang, ela estabeleceu uma Esta��o de Pesquisa de Colugo em Temoyong, em Langkawi, que oferece uma base para estudantes e pesquisadores curiosos de todas as disciplinas virem estudar colugos.

Localizada entre uma mesquita e um posto de gasolina, a �rea ao redor da esta��o de pesquisa � o lugar ideal para estudar como os colugos est�o se adaptando � invas�o humana em seu territ�rio.

Fomos para l� em nossa segunda noite, assim que um alto-falante come�ou a chamar os fi�is para a ora��o noturna.

No alto, o sol poente coloria o c�u em tons espetaculares de laranja e depois roxo, o famoso p�r do sol de Langkawi, outra atra��o natural da ilha.

"Todas essas �rvores teriam sido plantadas por pessoas", explicou Miard, enquanto caminh�vamos do centro de pesquisa para a rua Bohor Tempoyak na companhia de seu assistente de pesquisa Zubir.

Curiosamente, na Pen�nsula da Mal�sia, os colugos raramente deixam as florestas, mas em Langkawi, eles chegam muito mais perto de �reas de povoamento humano. Ningu�m sabe exatamente por qu�.

Por um breve momento, Miard e Zubir acreditaram ter visto um colugo, um objeto branco em movimento avistado com a c�mera de imagem t�rmica. Mas acabou sendo um alarme falso: era um p�ssaro fazendo ninho na copa das �rvores.

Quando nossas esperan�as estavam se esvaindo, eles avistaram um colugo agarrado a um tronco � beira da estrada. Em uma segunda inspe��o, descobriram que, na verdade, eram dois: uma m�e e seu filhote beb�, agarrado a seu peito.

Uma mãe colugo e seu bebê descansam durante o dia(foto: ETHAN PANG)
Uma m�e colugo e seu beb� descansam durante o dia (foto: ETHAN PANG)

"Ah, olha como s�o fofos, aquele pequenino deve ter apenas algumas semanas de vida", disse Miard, antes de assumir uma postura mais profissional.

"Observamos que eles podem ter at� tr�s filhotes por ano; e n�o parecem ter uma temporada de acasalamento espec�fica."

Em pouco tempo, colugos apareceram ao nosso redor, emergindo da escurid�o como fantasmas, usando a estrada como uma esp�cie de passagem a�rea — a lacuna formada pela rodovia, uma estrada secund�ria de duas pistas, mostrou ser o espa�o ideal para um animal que plana, mesmo que quase acidentes com caminh�es e motocicletas fossem comuns.

"Aprendemos que eles s�o muito soci�veis", afirmou Miard se referindo � comunidade do bairro.

"Uma �rea pode ter at� 20. Mas gostar�amos de marcar um para rastrear seus movimentos com mais detalhes."

Apesar de manifestar adaptabilidade a v�rios habitats, h� muita preocupa��o com as amea�as impostas aos colugos na Mal�sia, pa�s onde o desmatamento continua sendo um problema real.

"A perda de habitat � a maior amea�a", ela disse. "Mas alguns fazendeiros os matam tamb�m."

O assassinato de colugos como praga � ir�nico porque eles, na verdade, s�o ben�ficos para o meio ambiente.

"Os colugos s�o essenciais para a produtividade das �rvores", explicou Miard.

"Veja o duri�o, fruta que os malaios amam. Quando a �rvore floresce, os colugos comem algumas dessas flores. Isso resulta em uma fruta de melhor qualidade."

A quest�o da conscientiza��o sobre o colugo � onde a pesquisa de Miard se encontra com a conserva��o, j� que esses mam�feros misteriosos s�o an�logos � sa�de do ecossistema.

A Mal�sia � um dos apenas 17 pa�ses considerados megadiversos pelos cientistas, mas tamb�m � uma na��o em r�pido desenvolvimento, onde os humanos est�o colocando uma press�o cada vez maior sobre o mundo natural, sobretudo na selva, que � desmatada para cultivo ou constru��o de moradias.

Nesse sentido, os resultados de sua pesquisa s�o publicados nos perfis de rede social do Night Spotting Project (NSP), cujos objetivos incluem "salvar mam�feros noturnos por meio de pesquisa, educa��o e capacita��o da comunidade".

Miard tamb�m gostaria que Langkawi se voltasse mais para o ecoturismo.

"Muitos turistas v�m aqui e alugam jet skis na Cenang Beach ou v�o ao shopping comprar produtos duty free. Mas Langkawi poderia ser como Sabah [estado no leste da Mal�sia] e desenvolver o turismo em torno da natureza. A maioria das pessoas n�o tem ideia de qu�o rico � o recurso animal", diz.

"A trilha na floresta � incr�vel, mas poucas pessoas v�o para a floresta, exceto os locais, para ca�ar. Esta ilha poderia realmente ser um ponto de ecoturismo", finalizou Miard, sugerindo que Langkawi ficasse conhecida como "a ilha dos colugos".

Leia a vers�o original desta reportagem (em ingl�s) no site BBC Travel.


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