Novos focos de fogo foram registrados na ilha de Evia, na Gr�cia, nesse domingo 8/8 (foto: ANGELOS TZORTZINIS/AFP)
O ver�o no Hemisf�rio Norte ainda n�o chegou � metade, e pa�ses como Estados Unidos, Canad�, �ndia e China, al�m do continente europeu, em especial a Gr�cia, j� sofreram quebra dos recordes de temperatura, acompanhadas de inc�ndios devastadores. As ondas de calor por tr�s do fen�meno se tornar�o muito mais frequentes e s�o causadas pelo ritmo acelerado das mudan�as clim�ticas, segundo um estudo publicado na revista Nature Communications.
As taxas atuais de aumento da temperatura s�o registradas a uma velocidade 10 vezes maior, comparadas aos eventos de aquecimento do planeta pr�-industrializa��o. Provavelmente, o ritmo ser� mantido pelos pr�ximos 20 anos, n�o importando a rapidez com que a humanidade reduza as emiss�es de carbono que impulsionam o aquecimento global, alerta o estudo, liderado por Erich Fischer.
O cientista clim�tico do Instituto Tecnol�gico de Zurique (ETH) � um dos autores dos relat�rios sobre clima elaborados por pain�is de especialistas da Organiza��o das Na��es Unidas (ONU) e que servem como base para as discuss�es nas confer�ncias sobre mudan�as clim�ticas, as COPs.
Analisando os registros clim�ticos hist�ricos, os pesquisadores do ETH observaram que as temperaturas come�aram a subir a uma taxa mais elevada que nas d�cadas anteriores. “Foi a partir da� que come�amos a ver um n�mero repentino de ondas de calor, assim como quebras de recorde de temperatura a velocidades muito altas”, conta Fischer. “Como agora estamos em um per�odo de aquecimento muito r�pido, precisamos nos preparar para mais eventos de calor extremo que quebrem os recordes por grandes margens”, destaca.
Compara��o mostra destrui��o na cidade de Greenville, na Calif�rnia, ocorrida no s�bado 7/8 (foto: Fotos: JOSH EDELSON/AFP)
Segundo o cientista, at� agora, a pesquisa sobre como o aquecimento global afetar� as ondas de calor tem se concentrado principalmente no quanto as temperaturas aumentaram em compara��o a algum per�odo de refer�ncia, como o s�culo 19, quando a industrializa��o deu um salto, e n�o na rapidez em que isso ocorre.
“� claro que a avalia��o quantitativa � extremamente importante, e a ci�ncia mostrou, sem d�vida, que um mundo mais quente produzir� mais e mais ondas de calor”, reconhece. “Mas n�o levar em conta a rapidez com que as temperaturas sobem impede capturar uma parte importante desse quadro”, avalia.
Intensidade sete vezes maior at� 2050
De acordo com Fischer, em um cen�rio de altas emiss�es, eventos extremos devem ser sete vezes mais comuns at� 2050, e at� 21 vezes entre 2051 e 2080. Mesmo se o aquecimento global induzido pelo homem fosse estabilizado por uma mitiga��o agressiva, a frequ�ncia e a intensidade das ondas de calor continuariam maiores que as registradas at� agora, embora a quebra de recordes de temperatura seria “notavelmente reduzida”, afirma o estudo.
Compara��o mostra destrui��o na cidade de Greenville, na Calif�rnia, ocorrida no s�bado 7/8 (foto: Fotos: JOSH EDELSON/AFP)
Uma preocupa��o dos cientistas clim�ticos � que os esfor�os para redu��o das emiss�es est�o em um ritmo mais lento que o necess�rio para se cumprir as metas do Acordo de Paris. Assinado em 2015, o documento determina que o aumento da temperatura n�o deve ultrapassar 1,5°C e, se poss�vel, 2°C, os n�veis pr�-industriais at� o fim do s�culo.
Por�m, um rascunho do documento que vem sendo preparado pelo Painel Intergovernamental de Mudan�as Clim�ticas da ONU (IPCC) para embasar as pr�ximas COPs estima que o mundo chegar� a 2100 3°C mais quente do que o registrado no in�cio do s�culo 18.
A import�ncia do Acordo de Paris
Segundo Fischer, a redu��o das emiss�es de gases de efeito estufa, caso ocorra, ter� impactos importantes mais � frente. “A probabilidade de extremos de calor que quebrem recordes depende do caminho das emiss�es que nos leva a um determinado n�vel de aquecimento”, diz. Se houver estabiliza��o da temperatura em 1,5°C, como quer o Acordo de Paris, embora eventos como esse continuem como reflexo da velocidade em que vem ocorrendo o aquecimento, o cientista destaca que novos registros dram�ticos se tornariam progressivamente menos frequentes.
“Esse � um daqueles artigos que n�o poderiam ser mais oportunos devido ao recente evento de calor extremo que quebrou recorde nos Estados Unidos e no Canad�. � quase como se os autores previssem o que estava por vir”, avalia Karsten Haustein, pesquisador do Centro de Servi�os Clim�ticos da Alemanha.
Devasta��o provocada por inc�ndios na vila de Gouves, na Gr�cia (foto: ANGELOS TZORTZINIS/AFP)
“Considere, por exemplo, uma onda de calor extrema que ocorre apenas uma vez a cada s�culo. Teria sido um epis�dio clim�tico quente e perigoso em qualquer clima. Mas se isso ocorrer em um mundo que aqueceu de 2°C a 3°C durante os �ltimos 100 anos, isso levar� repentinamente a uma onda de calor sem precedentes, que tem o potencial de quebrar recordes antigos em 5°C ou mais”, observa.
Rowan Sutton, pesquisador do Centro Nacional de Ci�ncias Atmosf�ricas da Universidade de Reading, no Reino Unido, lembra que acontecimentos recentes, como as inunda��es na Europa, “destacaram os efeitos devastadores das condi��es meteorol�gicas extremas amplificadas pelas mudan�as clim�ticas”. O novo estudo, diz ele, lan�a “um valioso holofote sobre o alto potencial para extremos de calor que quebram recordes”.
“Esse alto potencial � uma consequ�ncia da extraordin�ria taxa de mudan�a clim�tica: embora possa n�o parecer r�pido para n�s, a Terra est� se aquecendo a uma taxa sem precedentes na hist�ria da civiliza��o humana”, alerta.
Usando o Sol para monitorar as geleiras
Com o mundo se aproximando de um aumento de temperatura de 3ºC em rela��o aos n�veis pr�-industriais, segundo o Painel Intergovernamental de Mudan�as Clim�ticas da ONU (IPCC), novas tecnologias que monitoram os efeitos do aquecimento global s�o cada vez mais necess�rias. Agora, pesquisadores da Universidade de Stanford, nos EUA, desenvolveram uma alternativa mais barata, de baixo consumo de energia e de maior amplitude para acompanhar um dos mais graves problemas associados �s altera��es no clima: o derretimento de geleiras.
Antena captura sinais solares para medir a profundidade das camadas em que est� fixada (foto: Sean Peters/Divulga��o)
Em um estudo publicado na revista Geophysical Research Letters, glaciologistas e engenheiros el�tricos demonstraram como sinais de r�dio emitidos naturalmente pelo Sol podem ser transformados em um sistema de radar passivo para medir a profundidade das camadas de gelo. O m�todo, testado com sucesso na Groenl�ndia, pode, segundo os cientistas, apresentar uma vis�o prolongada e em grande escala do derretimento dos mantos de gelo e das geleiras, que est� entre as causas dominantes do aumento do n�vel do mar, amea�ando comunidades costeiras em todo o mundo.
Hoje, o principal meio de coleta de informa��es sobre a superf�cie polar, o radar de no gelo aerotransportado, envolve o voo de avi�es contendo um sistema de alta pot�ncia que transmite o pr�prio sinal de radar atrav�s do manto gelado. Al�m de consumir muitos recursos, a tecnologia tem uma importante limita��o: ela s� fornece informa��es sobre as condi��es da geleira no momento do voo.
Por outro lado, a tecnologia dos pesquisadores de Stanford usa um receptor alimentado por bateria, com uma antena fixada no gelo, para detectar as ondas de r�dio solares � medida que elas viajam para a Terra. Isso ocorre atrav�s do manto de gelo e para a subsuperf�cie.
“Em outras palavras, em vez de transmitir o pr�prio sinal, o sistema usa ondas de r�dio naturais que j� est�o vindo do Sol, um transmissor de energia nuclear no c�u”, explica Sean Peter, pesquisador do Laborat�rio Lincoln, do Instituto Tecnol�gico de Massachusetts (MIT). “Se esse tipo de sistema fosse totalmente miniaturizado e implantado em extensas redes de sensores, ele ofereceria uma vis�o sem precedentes da evolu��o subterr�nea das condi��es polares em r�pida mudan�a da Terra.”
Energia aleat�ria
Peter, que come�ou essa pesquisa ainda como aluno de gradua��o da Universidade de Stanford, explica que o Sol � uma fonte gigante de energia eletromagn�tica ca�tica e aleat�ria, emitida por enormes bolas de g�s que chegam � Terra em um amplo espectro de frequ�ncias de r�dio. Nessa aleatoriedade, afirma, est�o os ingredientes da ferramenta desenvolvida pelos cientistas para monitorar n�o s� o gelo, mas as mudan�as polares na Terra e em todo o Sistema Solar.
Os pesquisadores usaram o caos das ondas emitidas em frequ�ncias aleat�rias a seu favor: eles gravaram um fragmento da radioatividade do Sol, que �, como explicam, como uma can��o intermin�vel que nunca se repete, e, ent�o, ouviram aquela assinatura �nica no eco criado quando as ondas de r�dio solar ricocheteavam no fundo de uma camada de gelo. Medir o atraso entre a grava��o original e o eco permite calcular a dist�ncia entre o receptor da superf�cie e a base da placa de gelo e, portanto, sua espessura.
No teste realizado na geleira Store, no oeste da Groenl�ndia, os pesquisadores calcularam um tempo de retardo de eco de cerca de 11 microssegundos, que aponta para uma espessura de gelo de cerca de 900m – n�mero que corresponde �s medi��es do mesmo local registradas tanto no solo quanto no radar a�reo.
“Uma coisa � fazer um monte de c�lculos de matem�tica e f�sica e se convencer de que algo deve ser poss�vel. Outra � realmente ver um eco real do fundo de uma camada de gelo usando o Sol”, diz Dustin Schroeder, professor-assistente de geof�sica na Escola de Ci�ncias da Terra, Energia e Ambientais de Stanford.
Outras implica��es clim�ticas
A ideia de usar ondas de r�dio passivas para coletar medi��es geof�sicas da espessura do gelo foi inicialmente proposta pelo coautor do estudo Andrew Romero-Wolf, pesquisador do Laborat�rio de Propuls�o a Jato da Ag�ncia Espacial Norte-Americana (Nasa), como forma de investigar as luas geladas de J�piter.
A certa altura, Romero-Wolf percebeu que, em vez de uma fraqueza, as emiss�es err�ticas de r�dio do planeta poderiam, na verdade, ser uma for�a se pudessem ser transformadas em uma fonte para sondar a subsuperf�cie das luas. “Come�amos a discutir isso no contexto da lua de J�piter, Europa, mas, ent�o, percebemos que deveria funcionar tamb�m para observar as camadas de gelo da Terra se substitu�ssemos J�piter pelo Sol”, disse Schroeder, em nota.
A partir da�, a equipe de pesquisa assumiu a tarefa de isolar as emiss�es de r�dio do Sol para verificar se elas poderiam ser usadas para medir a espessura do gelo. O m�todo consistia em trazer um subconjunto da banda de frequ�ncia de r�dio de 200 a 400 megahertz acima do ru�do de outros corpos celestes, processando grandes quantidades de dados e eliminando fontes de eletromagnetismo, como esta��es de TV, r�dio FM e equipamentos eletr�nicos.
Embora o sistema s� funcione quando o Sol est� acima do horizonte, a prova de conceito testada abre a possibilidade de adapta��o a outras fontes de r�dio naturais e feitas pelo homem no futuro. Os coautores pretendem, ainda, aplicar essa t�cnica a miss�es espaciais, aproveitando a energia ambiente emitida por outras fontes astron�micas, como o gigante gasoso J�piter. “Ampliar as fronteiras da tecnologia de detec��o para a pesquisa planet�ria nos permitiu expandir as fronteiras da tecnologia de detec��o para mudan�as clim�ticas”, diz Schroeder.