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Estado de Minas CORANTES, AROMATIZANTES...

Os aditivos qu�micos presentes em 4 de cada 5 alimentos vendidos no Brasil

Levantamento in�dito revela como ind�stria no Brasil usa essas subst�ncias, que conservam e d�o forma, sabor, cheiro e textura ao que comemos. Nutricionistas alertam para poss�veis preju�zos � sa�de, mas empresas e governo dizem que n�o h� riscos.


07/11/2021 07:40 - atualizado 07/11/2021 11:20


Seringa injetando líquido vermelho em tomate sobre fundo amarelo
Pesquisa revelou um uso intensivo de aditivos em alimentos industrializados (foto: Getty Images)

Quando a nutricionista Vanessa Montera investigou a presen�a de aditivos em alimentos vendidos nos supermercados, ela levou um susto — n�o s� porque muitos tinham (o que ela j� esperava), mas porque alguns tinham v�rios aditivos, e muitos deles s� servem para disfar�ar que certas comidas poderiam ser dif�ceis de engolir de outra forma.

Seu estudo mostrou que os aditivos est�o por toda parte no mercado: quatro em cada cinco dos quase 9,9 mil alimentos analisados tinham ao menos um aditivos entre os ingredientes e um quarto tinham seis ou mais.

O estudo de Montera foi o primeiro do tipo a ser feito nessa escala no Brasil. A nutricionista diz que, apesar de ser esperado que alimentos industrializados contenham aditivos — subst�ncias naturais ou sint�ticas que s�o usadas para alterar as caracter�sticas de um produto —, ela n�o imaginava que os encontraria nesse n�mero.

"Alguns alimentos s�o coquet�is de aditivos. Chegamos a encontrar um produto de panifica��o que tinha 35. Foi o recorde."

Outra coisa que chamou sua aten��o foi o uso intensivo dos aditivos cosm�ticos, como s�o chamados por uma parte dos profissionais da �rea aqueles aditivos que mudam o sabor, o aroma e a forma dos alimentos, embora essa classifica��o n�o seja oficialmente reconhecida por autoridades brasileiras.

Corantes, saborizantes, aromatizantes, emulsificantes, entre outros, garantem que alimentos que passaram por v�rios processos industriais na sua fabrica��o correspondam ao que os consumidores esperam deles. S�o usados porque esse processamento pode �s vezes alterar os alimentos a ponto de deix�-los irreconhec�veis.

Diferentemente de outros aditivos, como os conservadores, por exemplo, os aditivos cosm�ticos n�o ajudam a fazer com que as comidas sejam mais baratas, durem mais tempo, cheguem a mais pessoas ou possam ser consumidas com mais seguran�a.

Na pr�tica, s�o o equivalente a uma maquiagem dos alimentos. "N�o precisariam nem estar ali", diz Montera.

Sua presen�a nos alimentos, principalmente quando s�o muito frequentes, funciona como um indicativo de que este alimento � ultraprocessado — e cada vez mais pesquisas associam esse tipo de comida a doen�as.

A Ag�ncia Nacional de Vigil�ncia Sanit�ria (Anvisa) regula o uso dos aditivos em alimentos e estabelece os n�veis m�ximos de consumo di�rio para uma pessoa.

Mas alguns nutricionistas t�m d�vidas se esses limites s�o realmente seguros, porque comemos cada vez mais alimentos ultraprocessados, que t�m muitos aditivos.

Eles apontam ainda para evid�ncias de que h� aditivos que podem fazer mal � sa�de — o que a ind�stria nega — e tamb�m para problemas na forma como esses ingredientes s�o informados nos r�tulos.

Por isso, defendem que as regras sejam revistas pela ag�ncia, e est� previsto que isso ocorra em breve.

Outro questionamento vem da compara��o desta pesquisa brasileira com um estudo semelhante na Fran�a, que apontou um uso substancialmente menor de aditivos por l�.

Isso indicaria, de acordo com cientistas, que muitos produtos vendidos no Brasil s�o mais artificiais e de pior qualidade.

O que s�o aditivos alimentares


Mulher comprando produtos em um supermercado
80% dos produtos analisados tinham ao menos um aditivo e 25% tinham seis ou mais (foto: Getty Images)

Aditivos s�o qualquer ingrediente adicionado ao alimentos sem o prop�sito de nutrir.

Eles modificam as caracter�sticas f�sicas, qu�micas, biol�gicas ou sensoriais do produto, durante sua fabrica��o, processamento, prepara��o, tratamento, embalagem, acondicionamento, armazenagem, transporte ou manipula��o.

Essas subst�ncias ajudam a garantir que podemos consumir um alimento sem riscos, por exemplo.

Embora bastante associados � alimenta��o moderna, eles n�o s�o uma novidade. J� eram usados em sociedades antigas, como o sal que � adicionado para preservar uma comida.

O vinagre das conservas, o a��car dos alimentos cristalizados e a fuma�a da defuma��o s�o outros exemplos de aditivos bastante comuns.

Mas tamb�m se tornaram bem comuns aditivos sint�ticos, que passaram a ser empregados pela ind�stria para produzir comida em larga escala e fazer com que ela chegue em boas condi��es para os consumidores.

De acordo com a Organiza��o Mundial da Sa�de(OMS), o uso dos aditivos se justifica quando ele tem uma utilidade clara, como preservar o valor nutricional ou a estabilidade de um alimento, e n�o � usado para enganar o consumidor.

Cientistas tamb�m apontam que seu uso excessivo pode ser problem�tico.

Aditivos por toda parte

A nutricionista Vanessa Montera investigou em seu estudo como esses aditivos s�o usados pela ind�stria no Brasil.

Esse trabalho foi sua tese de doutorado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e foi publicado no peri�dico Food and Function, da Sociedade Real de Qu�mica, do Reino Unido.

A nutricionista analisou uma base de dados elaborada pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor a partir da visita a dez lojas das cinco maiores redes de supermercado do pa�s em duas cidades, Salvador e S�o Paulo.

Todos os produtos embalados tiveram seus r�tulos fotografados. De cerca de 14 mil itens, foram exclu�dos os que estavam duplicados, as �guas engarrafadas e aqueles que n�o tinham informa��es nutricionais nas embalagens. Restaram 9.856 alimentos, que foram divididos em 25 categorias.

Em seguida, foram verificados os ingredientes de cada um deles. A cientista concluiu que 79,4% tinham ao menos um aditivo.

Mas isso conta apenas uma parte da hist�ria, porque a minoria (11,6%) tinha um aditivo s�, enquanto 19,8% tinham dois ou tr�s, 23,2% tinham quatro ou cinco e 24,8% — a maior parcela do total — tinham seis ou mais.

Os produtos com mais aditivos foram as bebidas de fruta saborizadas (com teor de suco abaixo de 30% e p�s e concentrados para preparo de refrescos). Nesses produtos, em m�dia, os aditivos representavam 79,7% do n�mero total de ingredientes listados.

Tamb�m se destacaram refrigerantes (74,5%), outras bebidas (57,3%) — tais como aquelas � base de soja, ch�s prontos para consumo, bebidas para desportistas, leite de coco —, produtos l�cteos n�o ado�ados (51,1%), n�ctares (49,7%), produtos l�cteos ado�ados (45,6%) e doces e sobremesas (45,4%).


Bebidas em prateleira de supermercado
Bebidas de fruta, refrigerantes e outros produtos semelhantes s�o o que t�m mais aditivos, de acordo com o estudo (foto: Getty Images)

Entre os cinco aditivos mais usados, quatro eram do tipo cosm�tico — a exce��o foram os conservadores, que fazem com que os alimentos durem mais tempo.

Os aromatizantes, que d�o cheiro a um produto, foram de longe o aditivo mais comum. Estavam em 47,1% dos produtos.

Depois, vieram os conservadores (28,9%), os corantes (27,8%; conferem cor � comida), os estabilizantes (27,6%; mant�m a dispers�o de componentes) e os emulsificantes (19,4%; mant�m uma mistura).

"Os conservadores t�m um prop�sito, porque a ind�stria precisa fazer com que esses produtos possam ficar mais tempo na prateleira, mas os aditivos cosm�ticos s� servem para deixar o p�o mais fofinho, fazer o iogurte ficar rosa, deixar o creme de leite mais branco. Seu �nico prop�sito � tornar o produto mais atraente para o consumidor e, por isso, n�o s�o estritamente necess�rios", avalia Montera.

A nutricionista argumenta que sua pesquisa mostra que a ind�stria de alimentos est� pesando a m�o no uso desses ingredientes.

"Tinha um produto que tinha um umectante [que previne a perda de umidade] e um antiumectante [que impede a absor��o de umidade]. Qual � o sentido disso?", questiona.

O que dizem as regras

A principal preocupa��o � com o impacto no corpo que o consumo desses aditivos causa, dizem os nutricionistas.

O Minist�rio da Sa�de se negou a comentar o assunto e disse � BBC News Brasil que caberia � Anvisa tratar do tema.

A ag�ncia afirmou por sua vez, em comunicado, que analisa os riscos envolvidos no consumo de aditivos e determina quais s�o permitidos e seus limites m�ximos, para que a ind�stria possa tirar proveito deles sem prejudicar os consumidores.


Linha de produção de abacaxi enlatado
Anvisa diz que regras garantem a seguran�a do uso de aditivos (foto: Getty Images)

As subst�ncias s�o avaliadas caso a caso, segundo a Anvisa, e o fabricante precisa comprovar que elas s�o seguras, necess�rias e que o consumo m�dio esperado n�o traz perigos.

A ag�ncia disse ainda que segue as regras e recomenda��es da OMS, da Organiza��o para Alimenta��o e Agricultura, e o que � praticado na Uni�o Europeia e nos Estados Unidos.

Mas nutricionistas ouvidas pela reportagem acreditam que a Anvisa pode (e deve) fazer melhor.

Um dos problemas apontados � que os limites di�rios determinados pela ag�ncia levam em conta a ingest�o de um aditivo individualmente e determinam o quanto pode ser usado em um �nico produto.

Mas isso seria colocado em xeque pelo aumento em todo o mundo, medido por diversas pesquisas, do consumo de produtos ultraprocessados, que cont�m muitos aditivos.

Isso significa que, na pr�tica, n�o � dif�cil algu�m consumir mais de um alimento que cont�m o mesmo aditivo e ir al�m do limite considerado seguro.

Tamb�m n�o seria levado em considera��o nas regras atuais que esses aditivos s�o consumidos muitas vezes de forma combinada. Como a pesquisa de Vanessa Montera mostra, � comum que alimentos tenham v�rios aditivos.

Por fim, a lei brasileira n�o exige que o r�tulo informe a quantidade de aditivos usada em cada produto, explica Daniela Canella, pesquisadora do N�cleo de Pesquisas Epidemiol�gicas em Nutri��o e Sa�de da Universidade de S�o Paulo (Nupens-USP).

"N�o temos como saber o quanto estamos comendo. A ind�stria diz que isso � segredo industrial e que n�o revela para que os concorrentes copiem seus produtos, mas isso significa que a gente desconhece o quanto a gente consome de aditivo no Brasil", diz Canella, que tamb�m � professora da Uerj e orientou Montera em sua pesquisa de doutorado.

O que diz a Ci�ncia


Fileiras de biscoito do tipo waffer na cor rosa
Aditivos cosm�ticos, que alteram cor, sabor, cheiro e forma dos alimentos, s�o usados para 'maquiar' alimentos, dizem nutricionistas (foto: Getty Images)

A Ci�ncia ainda � inconclusiva sobre se os aditivos causam ou n�o preju�zos � sa�de.

H� estudos que apontam ind�cios de que seu consumo por pode estar ligado a dist�rbios de comportamento, transtornos mentais, alergias, altera��es no metabolismo do corpo, obesidade e c�ncer.

Existe ainda a preocupa��o com o fato de os ultraprocessados acostumarem nosso paladar a um excesso de certos ingredientes, como s�dio e a��car, tornando mais dif�cil adquirir o gosto pelos alimentos in natura , que s�o fontes de nutrientes.

A ind�stria de alimentos diz que os aditivos s�o importantes para garantir a seguran�a e o valor nutricional dos alimentos e que n�o h� por que se preocupar.

A Associa��o Brasileira da Ind�stria e Com�rcio de Ingredientes e Aditivos para Alimentos disse � BBC News Brasil que o n�mero de aditivos na composi��o de um produto "n�o tem nenhuma rela��o" com o alimento ser saud�vel ou n�o.

"A quantidade m�xima permitida leva em conta a intera��o entre os aditivos em todas as categorias de alimentos, bem como a ingest�o di�ria aceit�vel, com base no perfil alimentar da popula��o brasileira", declarou a entidade.

Por sua vez, a Associa��o Brasileira da Ind�stria de Alimentos disse � reportagem que os aditivos s�o usados em "pouqu�ssimas quantidades" e controlados rigorosamente.

"N�o h� evid�ncias que demonstrem que a combina��o de aditivos num mesmo alimento possa oferecer riscos � sa�de humana", afirmou a associa��o.

Um dos motivos � que essas pesquisas quase n�o s�o feitas, argumenta Daniela Canella.


Linha de produção de sorvetes
Ind�stria de alimentos diz n�o haver estudos que apontem preju�zos � sa�de por causa dos aditivos (foto: Getty Images)

"N�o h� estudos no Brasil e existem pouqu�ssimos no mundo que analisam os aditivos somados, isso normalmente � feito com cada um deles sozinho. � poss�vel que o efeito cumulativo deles n�o seja seguro", afirma a nutricionista.

Vanessa Montera aponta outros problemas. De acordo com a pesquisadora, a maioria das pesquisas, que s�o feitas pela pr�pria ind�stria, analisam apenas se os aditivos s�o t�xicos ou causam muta��es nas c�lulas e n�o investigam os preju�zos que podem causar ao metabolismo, ou seja, ao funcionamento do corpo.

"Tem alguns estudos que apontam efeitos preocupantes, mas realmente n�o � nada que nos fa�a bater o martelo. Mas, ainda assim, deveria ser adotado o princ�pio da precau��o, porque, da mesma forma que n�o d� pra dizer com 100% de certeza que s�o prejudiciais, tamb�m n�o d� pra garantir que n�o s�o", diz a cientista.

Al�m disso, os estudos s�o realizados majoritariamente em animais, explicam os especialistas. N�o seria �tico fazer pesquisas dos efeitos em humanos, dando aditivos �s pessoas para ver o que acontece.

A sa�da, explica Canella, � fazer os chamados estudos observacionais, em que se acompanha um grupo de pessoas por um tempo e se analisam seus h�bitos e estilo de vida e os problemas de sa�de para ver se h� alguma correla��o.

"� dif�cil fazer estudos assim porque sempre pode ter havido outra influ�ncia. Pode ter sido a polui��o, e n�o o aditivo, que causou uma doen�a, por exemplo. Por isso, o n�vel de evid�ncias nunca vai ser o ideal, o que � uma maravilha para a ind�stria, que sempre vai poder dizer que n�o d� pra estabelecer uma rela��o de causa e consequ�ncia, e � verdade", diz a pesquisadora da USP.

Anvisa vai rever regras de aditivos

Uma outra preocupa��o surge com a compara��o do estudo feito por Montera no Brasil com outro na Fran�a.

A pesquisa com 126 mil produtos aliment�cios dispon�veis nos supermercados francesesapontou que 53,8% tinham aditivos e 11,3% tinham cinco ou mais aditivos — bem abaixo dos �ndices encontrados no estudo brasileiro.

"Isso mostra que talvez a qualidade dos alimentos que est�o sendo oferecidos aqui � pior do que a dos alimentos de l�", diz Montera.

A nutricionista afirma ainda que, se a amostra do estudo nacional fosse t�o grande quanto a da pesquisa francesa, os resultados poderiam ser ainda piores.

"A Europa tem um controle maior sobre o uso de alguns aditivos alimentares", explica Montera.


Mulher com lata na mão olhando rótulo
Os aditivos devem ser listados entre os ingredientes informados nos r�tulos (foto: Getty Images)

Ter mais aditivos � sinal de pior qualidade porque essas subst�ncias s�o usadas muitas vezes para substituir ingredientes naturais.

Em tese, por exemplo, uma empresa poderia usar morangos de verdade para deixar o iogurte rosa, mas morangos s�o mais caros do que um corante.

Os aditivos tamb�m servem para "maquiar" os produtos ultraprocessados, diz Canella, tornando seu aspecto, textura e gosto aceit�veis.

A nutricionista defende que cabe ao governo brasileiro exigir padr�es de qualidade melhores das fabricantes de alimentos.

"Os pa�ses t�m legisla��es mais e menos rigorosas. Se em um lugar voc� pode usar mat�ria-prima de pior qualidade, esse pa�s se torna um refugo da ind�stria. Se d� pra produzir mais barato e a legisla��o n�o barra, por que uma empresa vai ter mais despesa e menos lucro?", questiona Canella.

Tamb�m seria bom que os r�tulos informassem melhor sobre esses ingredientes, indicando sua quantidade, por exemplo, acrescenta Montera.

O Brasil ter� uma oportunidade de aprimorar suas regras para os aditivos. Est� prevista na agenda da Anvisa para o per�odo entre 2021 e 2023 a moderniza��o das regras e procedimentos para autoriza��o do uso dos aditivos em alimentos.

Mas, questionada sobre esse assunto, a ag�ncia disse � BBC News Brasil que n�o iria comentar.

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