Voc� � desses que sai pelas ruas olhando para o alto, para os lados, observando a cidade e suas constru��es? Saberia apontar o pr�dio mais bonito da capital mineira? Arquitetura � sin�nimo de arte e ci�ncia. Dois vencedores do Pr�mio Pritzker, a maior honraria da �rea, a definem assim: “Arquitetura � inven��o”, Oscar Niemeyer (1907–2012), ganhador em 1988; e “Arquitetura � uma maneira de ver, pensar e questionar nosso mundo e nosso lugar nele”, o norte-americano Thom Mayne (vencedor de 2005). As constru��es de Belo Horizonte se encaixam bem com os pensamentos desses dois criadores. De uma capital que come�ou planejada, ainda que tenha ignorado o tra�ado do antigo vilarejo na �poca, nos idos de 1897, como relevo, matas e rios, BH nasceu com a assinatura de vis�o de futuro.
Pouco se v� da arquitetura rural da �poca do Curral del-Rei, s�o raros os casar�es que resistem. A influ�ncia da est�tica do neocl�ssico, assim como da arquitetura neog�tica e o barroco est�o por a�. Mas o projeto urban�stico do engenheiro Aar�o Reis (1853-1936) foi inspirado em Paris e Washington, exemplos de modernidade e planejamento urbano. O tempo passou e os estilos se reinventaram at� chegar ao conjunto inovador e moderno da Pampulha, na d�cada de 1940, declarado como patrim�nio mundial pela Unesco em 2016.
Com tanta mistura de escolas, do que foi preservado at� as cria��es mais recentes para a hist�ria, Belo Horizonte � reconhecida pela beleza de suas constru��es de influ�ncia e estilo distintos.O EM convidou arquitetos renomados, influenciadores, professores e gestores para escolherem qual � a edifica��o mais bonita da capital mineira, que caminha para os 123 anos em dezembro, e j� foi apontada pelo Population Crisis Commitee, da Organiza��o das Na��es Unidas (ONU), como a metr�pole com melhor qualidade de vida na Am�rica Latina e a 45ª posi��o entre as 100 melhores cidades do mundo.
PLURALIDADE
Ao definir as prefer�ncias, alguns especialistas fugiram do lugar-comum, ainda que seja quase imposs�vel ignorar a beleza arrebatadora do conjunto arquitet�nico da Pampulha e o tra�o vanguardista de Oscar Niemeyer. Ir contra, aos olhos de muitos, beira a insanidade, diante de projetos de um arquiteto reverenciado no mundo. Mas, sim, BH presenteia a popula��o com edifica��es de outros autores de tamanha compet�ncia. E, claro, a pluralidade da obra de Niemeyer est� espalhada pela capital, n�o s� em torno da Lagoa da Pampulha, o que define a diversidade do que � belo aos olhos de quem v�. Veja a seguir os depoimentos � reportagem do EM e suas singularidades.
(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
Bruno Santa Cec�lia
arquiteto e urbanista, professor da Fumec e da UFMG e s�cio do escrit�rio Arquitetos Associados, que vai responder pela curadoria do Pavilh�o do Brasil na 17ª Mostra Internacional de Arquitetura da Bienal de Veneza
Exuber�ncia pl�stica singular
“N�o tenho d�vidas: a constru��o mais bonita de Belo Horizonte � o Edif�cio Niemeyer (1954), na Pra�a da Liberdade. Com sua exuber�ncia pl�stica singular, o Niemeyer se destaca na paisagem urbana a ponto de ser reconhecido como um dos cart�es-postais da cidade. Convenhamos, um feito not�vel para um edif�cio residencial particular que tem como vizinhos nada menos do que as antigas sedes do governo do estado, hoje importantes centros culturais. O aspecto ic�nico do edif�cio decorre da associa��o entre o car�ter insular do terreno, sem divisas ou constru��es vizinhas, e o desenho livre e cont�nuo do seu contorno, que desfaz totalmente a no��o convencional de fachada. Suas curvas se materializam no belo desenho dos brise-soleils (do franc�s, quebra-sol) que, dispostos ao ritmo de tr�s por pavimento, ocultam a presen�a das aberturas e a pr�pria escala do edif�cio, refor�ando sua monumentalidade. A genialidade de Oscar Niemeyer pode ser percebida na solu��o excepcional da planta, que concilia habilidosamente um desenho de formas livres com uma articula��o simples e racional do espa�o dom�stico. Projetando sobre um terreno triangular de dif�cil resolu��o, Niemeyer se valeu da legisla��o da �poca – que permitia o avan�o das constru��es sobre 1/3 do per�metro do lote – para ampliar a �rea dos pavimentos e gerar um desenho sinuoso que dissimula a geometria do pr�prio lote. Ao n�vel do ch�o, os avan�os dos pavimentos resultam em �reas de sombra e abrigo para os pedestres, especialmente em dias de chuva – pequenas gentilezas cada vez mais raras nas constru��es urbanas. Al�m disso, a incomum aus�ncia de cercas e muros divis�rios dissolve os limites entre espa�o publico e privado, apresentando o pilotis do Niemeyer como extens�o natural da Pra�a da Liberdade. O Edif�cio Niemeyer � como toda boa arquitetura: melhora o lugar em que se insere. Realizando um sonho de inf�ncia, habitei-o por quase sete anos. Nesses 2.500 dias, nunca deixei de aprender e de me surpreender com a beleza dos seus espa�os. Obrigado, Oscar!”
Le�nidas Oliveira
arquiteto, historiador e diretor-executivo da Funda��o Nacional de Artes (Funarte)
(foto: Euler J�nior/EM/D.A Press)
O casar�o e sua impon�ncia
“A constru��o que muito me agrada e a credencio como a mais bonita � o Museu Hist�rico Ab�lio Barreto (MHAB), inaugurado em 1943, no Bairro Cidade Jardim, com seu conjunto arquitet�nico que compreende o casar�o secular, sede da antiga Fazenda do Leit�o, constru�do em 1883. Hoje, o edif�cio-sede, inaugurado em dezembro de 1998, com projeto de �lvaro Mariano Teixeira Hardy, o Veveco, � tombado pelo Iphan. � um edif�cio que adapta de forma harmoniosa com o externo e seus jardins. � quase uma pincelada. A sala de exposi��o � bel�ssima, com tr�s andares e 10 metros de altura. De todos os andares voc� pode ver a exposi��o de v�rios �ngulos. No c�modo fechado, h� 80 mil pe�as de um acervo valios�ssimo, guardadas e condicionadas de forma criteriosa. Existe um corpo com curva envidra�ada que abra�a os jardins. De todas as janelas � poss�vel ver o casar�o como a grande pe�a do acervo, em anexo, de uma beleza est�tica maravilhosa, com uma bonita escadaria. O casar�o com sua impon�ncia ainda tem forma funcional. Sem falar que a constru��o ocorreu gra�as aos Amigos do Museu, com recursos captados pela comunidade, e com a doa��o do projeto pelo Veveco. Enfim, uma constru��o coletiva. � um lugar agrad�vel e generoso. Tem ainda a grande varanda, bem mineira. Preciso destacar a circula��o livre, sem portas e barreiras. Acredito que � o maior espa�o de exposi��o de v�o livre de BH. O jardim � destaque � parte, tanto que foi feita uma curva para abra�ar a imensa gameleira que l� est�, mostrando cuidado com o entorno. A obra tem uma escala muito humana. � um presente lindo para a cidade, para todos.”
Estela Netto,
arquiteta, especialista em hist�ria da cultura e da arte e � frente do escrit�rio hom�nimo
(foto: Marcos Vieira/EM/D.A Press)
Modernismo divino
“Um dos meus edif�cios preferidos de BH � a Igreja S�o Francisco de Assis, mais conhecida como Igrejinha da Pampulha, de Niemeyer. Eu me lembro como se fosse hoje quando entrei pela primeira vez naquela pequena igreja modernista. H� 19 anos. A leveza das formas e a incr�vel performance que o concreto alcan�ou com sua esbeltez fizeram cen�rio para um momento tocante na minha vida. Entrei numa igreja � medida do homem em Minas Gerais. Nada de barroco, cheio de tens�es e ang�stia. Ou neog�tico e sua propor��o assustadora. Entrei numa igreja do meu tamanho, que aproximou Deus de mim e me colocou no centro da experi�ncia religiosa da rela��o com o divino. Agrade�o ao modernismo e a Niemeyer por ter vivido isso por meio da arquitetura. No meu entendimento, a experi�ncia que o usu�rio tem com o lugar deve ser uma das caracter�sticas que
Gustavo Penna
arquiteto, fundador do escrit�rio GPA&A, membro do Conselho Curador da Funda��o Oscar Niemeyer e da Funda��o Dom Cabral e s�cio-fundador da Academia de Escolas de Arquitetura e Urbanismo de L�ngua Portuguesa (AEAULP)
(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Pr�dio respira e tem eleg�ncia
“Escolho o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), na Rua da Bahia (projeto de Humberto Serpa). � um pr�dio que respira, tem eleg�ncia e prop�s uma solu��o arquitet�nica que liberta a estrutura do edif�cio. Era e continua sendo de vanguarda. Destaco ainda a rela��o com a rua e a cal�ada. � uma constru��o que tem generosidade, por ser um pr�dio com solu��o arquitet�nica e urban�stica. � muito bonito.”
Fl�vio Carsalade
arquiteto, urbanista e professor da Escola de Arquitetura da UFMG
Inova��o arquitet�nica
“Escolho o Museu de Arte da Pampulha porque, em primeiro lugar, � uma inova��o indubit�vel na arquitetura da �poca. Quando foi criado, n�o se fazia nada parecido. Tem propor��es materiais e espa�os de uma riqueza insuper�vel. E o reconhecimento da popula��o mundial, como parte de um conjunto arquitet�nico que � patrim�nio da humanidade. Dos especialistas aos leigos, todos se extasiam com a beleza da constru��o. Recomendo entrar e fruir o espa�o. Uma obra espetacular. N�o h� muito mais o que falar.”
J�nior Piacesi
arquiteto e urbanista, diretor da Piacesi Arquitetos Associados e especialista em inova��o e tend�ncias pelo Instituto Marangoni
(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Leveza em escala gigante
“Minha escolha � o Col�gio Estadual Governador Milton Campos, o Estadual Central, de 1954, obra de Oscar Niemeyer. Sou apaixonado, especificamente, por esta constru��o, que me marca muito, al�m da Casa do Baile, na Pampulha, e do Edif�cio JK, porque � uma constru��o dividida em quatro grandes blocos, posicionados em um grande quarteir�o ajardinado. E o que me impressiona � a delicadeza tanto do caminhar quanto do olhar. Tenho de destacar ainda a leveza que a escala gigante conseguiu trazer. � impressionante o grande audit�rio, que parece uma gota voando. Uma
pena que nem todo mundo em BH consegue ter acesso a tanta beleza.”
Leonardo Castriota
arquiteto e urbanista, professor da UFMG, presidente do Comit� Brasileiro do Conselho Internacional de Monumentos e S�tios (Icomos/Brasil) e membro do Conselho T�cnico do Instituto do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico Nacional (Iphan) e do Conselho Estadual do Patrim�nio de Minas Gerais (Conep-MG)
(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press )
Obra arrojada
“� o Museu de Arte da Pampulha, porque tem resolu��o pl�stica impec�vel e respeita � perfei��o os ideais dos modernistas da arquitetura. A ideia do promenade architecturale (conceito desenvolvido pelo arquiteto su��o-franc�s Le Corbusier nos anos 1930). � um edif�cio cuidado e pensado desde a implanta��o at� os detalhes. Apresenta leveza, fluidez e flexibilidade. Tem verdade estrutural, ou seja, a estrutura corresponde � forma que se enxerga. H� o predom�nio do vazado sobre o cheio. Tem massa, vidros e volumes soltos. Foi arrojado e chamou a aten��o do mundo inteiro. Obra de um grande talento, Oscar Niemeyer. � o mais bonito de todos.”
Joel Campolina
arquiteto e urbanista, diretor e s�cio-fundador da arqStudio.br Arquitetos
(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
Pioneira em sustentabilidade
“Primeiro, deixo claro que conceito de boniteza � muito subjetivo, e em arquitetura vai muito al�m de beleza material. Permita-me fugir de eventuais 'lugares-comuns'. Para mim, a edifica��o mais bela de BH � o Hospital da Rede Sarah, meio escondidinho na Avenida Amazonas, em frente ao Expominas. Uma das muitas obras do genial arquiteto Jo�o Filgueiras Lima, o Lel�. Explico: re�ne uma beleza est(�tica) �nica, instigante, pioneira em conceitos de sustentabilidade, sistema estrutural-construtivo criativo, em elementos pr�-fabricados leves, etc.etc. Enfim, n�o existe nada igual em nosso mundo.”