Conhe�a o legado de Marlene Silva, a pioneira da dan�a afro em MG
A bailarina, core�grafa, pesquisadora e professora mineira morreu aos 83 anos, de enfarte, no Rio de Janeiro. Ela foi refer�ncia para v�rias gera��es de artistas negros de BH
postado em 14/04/2020 04:00
Marlene Silva, mulher de fibra, enfrentou o racismo em BH: "Macaco era das coisas mais leves que eu ouvia. N�o podia me abater. Lutei para nossa cultura ser reconhecida" (foto: Pablo Bernardo/divulga��o)
Fernanda Gomes*
Pioneira da dan�a afro em Minas Gerais, a bailarina Marlene Silva, de 83 anos, morreu na segunda-feira (13), no Rio de Janeiro, v�tima de enfarte.
“Marlene era m�e. Abra�ava todo mundo com o cora��o. N�o trabalhava por amor, mas com amor. Ela respirava arte, a dan�a era o espelho da vida dela”, lembrou Carla Paix�o, disc�pula e amiga da core�grafa desde 1992, quando as duas trabalharam juntas em Belo Horizonte.
Desde ent�o, Carla conta que sempre procurou manter contato com Marlene e guarda com carinho as li��es que recebeu da bailarina durante o primeiro trabalho juntas. “Foi bel�ssimo, muito sucesso, muita gente participando. Lembro-me dos ensaios, no Santa Tereza, e das aulas que ela (Marlene) dava. Conduzia mais de 40 pessoas ao mesmo tempo e conseguia manter a harmonia entre todos”, conta a bailarina.
Segundo Carla, Marlene tinha um problema no joelho e, �s vezes, usava uma bengala para andar. "Mas em uma sala de aula ela se transformava em uma adolescente de 17 anos”, lembra a amiga e parceira.
Carla conta que Marlene estava buscando patroc�nio para apresentar seu novo projeto em BH. Baseado no livro Casa-grande & senzala, de Gilberto Freyre, o espet�culo seria lan�ado no final de 2020 ou in�cio de 2021.
O multi-instrumentista, cantor e compositor S�rgio Perer� conta que nos anos 1980, sempre que se falava sobre dan�a afro, Marlene era a "refer�ncia”. O m�sico dirigiu homenagens feitas a Marlene na edi��o 2018 da Mostra Benjamin de Oliveira, realizada no Teatro Francisco Nunes. “Todas as pessoas ligadas � m�sica afro ou de heran�a africana t�m algum la�o direto ou indireto com a Marlene”, comenta ele.
Perer�, assim como todos os f�s da bailarina, foi pego de surpresa com a not�cia da morte de Marlene. Para ele, mais do que lamentar, as pessoas devem se lembrar de tudo o que ela fez em vida. “Devemos celebrar o fato de que tivemos a maravilha de ter algu�m t�o especial entre n�s.”
Core�grafa aclamada, Marlene Silva era tamb�m bailarina e apresentou espet�culos de dan�a afro em diversos palcos da capital mineira
(foto: Arquivo EM)
DO CONC�RDIA PARA O CATETE
Mineira de Belo Horizonte e nascida no Bairro Conc�rdia, Marlene Silva era bailarina, core�grafa, pesquisadora e professora, com mais de quatro d�cadas de carreira.
“Marlene ousou colocar o negro na cena cultural de Belo Horizonte, fazendo a integra��o tamb�m das periferias, criando uma rela��o diferente entre as classes sociais”, afirmou o core�grafo e bailarino Rui Moreira ao Estado de Minas, em 2018, quando a artista recebeu homenagem na capital.
Ainda crian�a, Marlene se mudou para o Rio de Janeiro, onde trabalhou como cabeleireira. Garota, fez aulas de bal� cl�ssico – era a �nica negra na sala, no Bairro do Catete. Ao ver a filha discriminada pela professora, a m�e tirou a menina de l�. Aos 21 anos, ela assistiu a um espet�culo comandado pela core�grafa Mercedes Baptista, pioneira da dan�a afro no pa�s. Decidiu o seu futuro ali.
A trajet�ria de Marlene teve in�cio na d�cada de 1970, quando chegou a Belo Horizonte e passou a dar aulas no est�dio de Dulce Beltr�o. A mineira j� havia chamado a aten��o no filme Xica da Silva, de Cac� Diegues. “Quando eu cheguei aqui, em 1974, n�o tinha nada”, contou ela ao Estado de Minas, lembrando que Dulce se encantou com o trabalho e prop�s que ela desse aulas em sua escola.
RACISMO
Nos anos 1980, Marlene Silva montou a pr�pria escola de dan�a, no Bairro Santo Ant�nio.
Um de seus espet�culos, Ra�zes da nossa terra, fez hist�ria em BH. Mas ela e seu trabalho foram alvo de racismo na capital mineira. “Tinha um projeto com a Belotur de apresentar nas periferias, ir l� mostrar o nosso trabalho. Mas muita gente ria, apontava e nos chamava de macacos. Inclusive, macaco era das coisas mais leves que eu ouvia. S� que n�o podia deixar isso me abater. Ent�o, lutei muito contra isso, para nossa cultura ser reconhecida. Hoje, mesmo longe do que eu queira, a situa��o j� est� bem melhor do que era”, disse ela ao EM, em 2018, ao ser homenageada na Mostra Benjamin Oliveira.
*Estagi�ria sob supervis�o da subeditora Tet� Monteiro