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Estado de Minas VIDA DE ARTISTA

'Sempre vivi de altos e baixos', diz atriz Marc�lia Cartaxo

Protagonista do longa in�dito 'Pacarrete', ela est� em sua casa na Para�ba, atravessando com preocupa��o a pandemia, mas tamb�m com esperan�a de dias melhores


01/07/2020 04:00 - atualizado 30/06/2020 22:51

Refinada e sensível, Pacarrete é uma mulher incompreendida em sua pequena cidade natal, onde procura reproduzir o glamour da vida na metrópole (foto: Luiz Alves/Divulgação)
Refinada e sens�vel, Pacarrete � uma mulher incompreendida em sua pequena cidade natal, onde procura reproduzir o glamour da vida na metr�pole (foto: Luiz Alves/Divulga��o)
“Tr�s ou quatro (personagens) s�o especiais. O resto � mais para a sobreviv�ncia.” S�o 35 anos, desde que a atriz paraibana Marc�lia Cartaxo, de 56, debutou no cinema. Ainda que seu rosto j� tenha sido visto em diversas produ��es na televis�o, � na tela grande que a figura mignon, de 1,50m, fica gigante.

“O cinema � o grande milagre na minha vida. Mas tu percebe as coincid�ncias?”, ela pergunta. Pouco tempo depois de estrear, no longa A hora da estrela (1985), de Suzana Amaral, veio o governo Collor (1990-1992) e, com ele, o fim da Embrafilme, que era o motor da produ��o e distribui��o de filmes nacionais. Ficou dif�cil fazer longas. A produ��o caiu quase a zero. “E agora estamos vivendo o ciclo de novo”, diz ela, que neste momento est� � espera de ver um dos personagens especiais que interpretou encontrar seu p�blico.

ADAPTA��O No passado, Marc�lia viveu Macab�a, a jovem nordestina simpl�ria de vida tr�gica que vai para a cidade grande na adapta��o que Suzana Amaral fez do cultuado romance de Clarice Lispector. Mais recentemente, Marc�lia interpretou Pacarrete, a mulher idosa que teve um passado de gl�ria na cidade grande e tenta reviv�-lo, a despeito da incompreens�o dos outros, no interior do Cear�.

Pacarrete, ao contr�rio de Macab�a, � fruto da vida real – houve realmente uma senhora de Russas que tinha nome margarida em franc�s, dan�ava bal� e era considerada louca pela popula��o local. Tamb�m t�tulo do primeiro longa-metragem do cineasta Allan Deberton, Pacarrete, assim como Macab�a, � uma personagem que exigiu muito da atriz e j� recebeu os devidos reconhecimentos da cr�tica.

Macab�a deu a Marc�lia o Urso de Prata de melhor atriz no Festival de Berlim de 1985. Pacarrete garantiu a ela alguns trof�us de melhor int�rprete, incluindo o Kikiko no Festival de Gramado de 2019. Tanto Suzana Amaral quando Allan Deberton estrearam em longas protagonizados por Marc�lia.

Pacarrete, que circulou por festivais, deveria ter entrado em cartaz nos cinemas no �ltimo dia 29 de abril. Por ora, em decorr�ncia do fechamento das salas imposto pelas medidas de conten��o da epidemia do novo coronav�rus, o futuro do longa-metragem � incerto.

Logo depois de anunciada a morte de Suzana Amaral, na quinta-feira passada (25), aos 88 anos, Marc�lia fez um agradecimento p�blico � cineasta por ter entrado em sua vida. E n�o foi uma entrada comum, conforme conta a atriz.

"Moro num bairro distante da praia e do Centro da cidade. N�o fiz muito dinheiro e minhas reservas est�o acabando (na pandemia). Sempre vivi de altos e baixos, mas me apego muito na quest�o espiritual. Acredito que amanh� ser� outro dia, e que ele vai ser diferente"

Marc�lia Cartaxo, atriz



Nascida em Cajazeiras, distante 470 quil�metros de Jo�o Pessoa, Marc�lia era uma garota do interior que, nos anos 1970,  come�ou a fazer teatro com os amigos da rua. Tinha 12 anos e com mais 15 crian�as criou o grupo do Mickey. Apresentavam-se nos quintais, na rua. A cria��o da Faculdade de Filosofia, Ci�ncias e Letras de Cajazeiras (Fafic) mudou o cen�rio.

“Juntavam todas as artes: cinema, feira na rua, artesanato, teatro e o grupo da gente fazia apresenta��es no s�o-jo�o, Paix�o de Cristo, as festas oficiais da cidade”, ela conta. O pr�prio grupo, com Eliezer Filho, come�ou a intensificar os trabalhos e os temas. At� que, um dia, o ator Luiz Carlos Vasconcelos, tamb�m paraibano, chegou � cidade com o Grupo Piolim.

Fortemente influenciado pelo trabalho desenvolvido por Vasconcelos, a primeira coisa que o grupo fez foi mudar o nome de Mickey para Terra (a can��o de Caetano Veloso havia acabado de ser lan�ada). Por causa de Vasconcelos, o grupo Terra n�o s� deixou sua cidade natal como chegou ao Sul e ao Sudeste.

CONVITE Foi com o espet�culo Bei�o de estrada (bei�o, no caso, quer dizer beira) que o Terra chegou a S�o Paulo. “Quando terminou a pe�a, a Suzana ficava atr�s de mim. Era meu primeiro dia em S�o Paulo, nunca tinha sa�do para um lugar t�o distante. Est�vamos todos deslumbrados, eu n�o conseguia dormir. E ela atr�s de mim, e eu querendo dispensar”, conta Marc�lia.

A cineasta falou que estava procurando uma atriz para um filme e perguntou para Marc�lia se ela conhecia A hora da estrela. Marc�lia nunca tinha ouvido falar nem mesmo de Clarice Lispector. “A Suzana era el�trica, falava muito r�pido, eu disse tudo bem, outro dia. E, no dia seguinte, ela foi ver a pe�a de novo, levou o livro, pediu para eu ler, pediu endere�o, telefone, que eu nem tinha. Era filha de costureira e agricultor, n�o tinha perspectiva de ir para lugar nenhum.”

Marc�lia voltou para Cajazeiras e passou a receber cartas de Suzana. Foram oito, durante oito meses. “Lindas, que j� n�o tenho mais, e estou tentando reproduzir para um projeto futuro”, conta a atriz. Na �ltima, a diretora mandou a passagem para S�o Paulo. “Mas de �nibus, porque ela queria que eu fosse pensando no caminho da personagem.”

Para se preparar para o papel, Marc�lia tinha outras miss�es. Uma delas era costurar a camisola da personagem, de algod�o grosso. “Ela me disse para deixar suja”, relembra. Macab�a � conhecida pela sujeira e o mau cheiro. Marc�lia fez tudo isso �s escondidas; s� um amigo do grupo de teatro sabia. At� o dia de embarcar, a m�e n�o queria deix�-la ir. At� o prefeito de Cajazeiras teve que intervir. A atriz tinha 19 anos – quando A hora da estrela foi lan�ado, j� havia feito 21.

TESTE “A Suzana tinha falado que a filha ia me pegar na rodovi�ria de S�o Paulo. Cheguei meia hora antes, e a menina nada. Eu, sentada em cima da mala, s� tinha visto Suzana aquela vez... Quando apareceu a Cac� com meu nome escrito, foi um al�vio.” Chegando na casa da diretora, Marc�lia ficou sabendo que teria que fazer um teste.

Eram ela e mais cinco atrizes pelo papel de Macab�a. “Quando terminou meu teste, parecia que o Brasil tinha ganho a Copa. N�o voltei, ca� dentro do filme.” A hora da estrela foi rodado em 28 dias, em pel�cula de 35mm, um material caro. Os atores n�o podiam errar, pois a cena que era filmada era a que iria valer. Como n�o havia som direto, seis meses depois das filmagens Marc�lia voltou a S�o Paulo para dublar o filme.

“Na dublagem, a Suzana olhava e dizia: ‘Meu Deus, quem � que vai gostar do filme? S� tem gente feia.’ Eu adorava, pois nunca tinha me visto fotografar assim. Nem muitas fotos de crian�a tenho, pois a gente n�o tinha condi��o. Comecei a viajar, pensar que meu caminho era esse, idealizava o futuro.”

E ele veio junto com outros grandes personagens. Dos filmes passados, Marc�lia destaca a prostituta Laurita de Madame Sat� (2002, de Karim A�nouz) e as participa��es nos filmes A hist�ria da eternidade (2014, de Camilo Cavalcante) e 16060 (1995, de Vinicius Mainardi). Coincidentemente, todos esses tamb�m foram os primeiros longas de fic��o dos respectivos realizadores.

At� que veio Pacarrete, personagem que Marc�lia esperou 12 anos para fazer – o diretor falou da inten��o de fazer o longa quando a dirigiu em seu primeiro curta, Doce de coco. Pacarrete, personagem que viveu na cidade de Russas, era na verdade Maria Ara�jo Lima, uma bailarina idosa.

Quando o projeto come�ou a se concretizar, Marc�lia viu que teria um problem�o nas m�os. Na verdade, no corpo inteiro. “Nunca toquei piano, nunca fiz bal�. A Pacarrete falava franc�s. Achava que n�o era para mim.” Deberton convocou um casal de bailarinos mais velhos de Fortaleza, uma professora de franc�s e outro de piano para a atriz.

Foi uma dificuldade, ela conta. “Al�m do corpo dolorido, eu tinha que ficar na cabe�a com a hist�ria do franc�s. Eu n�o tinha aquela cultura toda. Comecei a pesquisar bailarinas mais antigas, gente que n�o tinha mais o movimento perfeito. Fui mais por a�. Eu ficava hospedada na casa do Allan, e ele me dizia (nos ensaios) que n�o estava vendo a Pacarrete. E se deslumbrava com a professora dan�ando. Eu ficava com �dio, ci�me, me acabei, com o corpo todo doendo. Haja rem�dio.”

At� que Deberton se saiu com esta para Marc�lia: “Pense que, a cada dia, voc� resolve uma coisa.” E ela vem levando isso a cabo. Vive intensamente cada dia, sem saber como vai ser o amanh�. “Quando sai da fantasia e cai na realidade, � dif�cil”, comenta a atriz, que h� anos voltou para a Para�ba.

Atualmente, Marc�lia vive em Jo�o Pessoa, numa casa que herdou da m�e. “Moro num bairro distante da praia e do Centro da cidade. N�o fiz muito dinheiro e minhas reservas est�o acabando (na pandemia). Sempre vivi de altos e baixos, mas me apego muito na quest�o espiritual. Acredito que amanh� ser� outro dia, e que ele vai ser diferente.”

ONDE ASSISTIR MARC�LIA CARTAXO

» A HORA DA ESTRELA (1985)
O filme de Suzana Amaral est� dispon�vel gratuitamente na plataforma Spcine Play (www.spcineplay.com.br)

» MADAME SAT� (2002)
O longa de Karim A�nouz est� dispon�vel no cat�logo do Canal Brasil

» A HIST�RIA DA ETERNIDADE (2014)
O t�tulo est� dispon�vel para aluguel no Now e no Looke



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