
Humberto Werneck � um escritor que reescreve. Sempre, de forma quase obsessiva. “Tem escritor que senta, escreve e d� por terminado. Tenho uma dificuldade enorme para escrever. E se algu�m tiver que sofrer, que n�o seja o leitor”, afirma o mineiro radicado em S�o Paulo.
Tal reescritura n�o vem de agora, recorda Werneck. Ainda muito jovem, dando seus primeiros passos no jornalismo no “Suplemento Liter�rio”, ent�o editado por Murilo Rubi�o (1916-1991), ele estava dentro de um �nibus quando se lembrou da palavra que queria para um conto, que sairia na pr�xima edi��o da publica��o. Desceu, pegou um t�xi – um luxo para ele, na �poca – e foi parar na oficina onde o “SL” estava prestes a ser impresso. Fez a troca aos 45 do segundo tempo.
“O espalhador de passarinhos” (Arquip�lago Editorial), seu novo livro – que ter� lan�amento oficial nesta noite, em live do projeto Sempre um Papo –, tamb�m passou pelo processo de reescritura. A edi��o original, a primeira colet�nea de cr�nicas de Humberto Werneck, � de 2009.
Nessa reedi��o, o autor retrabalhou todo o material, excluindo textos, incluindo outros. Werneck, de 76 anos, tornou-se cronista regular de jornal em 2007, quando foi convidado a publicar textos curtos no extinto Metro. Depois, escreveu para o tamb�m finado Brasil Econ�mico. De l� passou 10 anos (2010-2020) como cronista do Estad�o. Mas a cr�nica que abre e d� t�tulo ao livro � de um momento anterior, quando ele atuava de forma eventual na produ��o de textos curtos.
“Em algum momento do come�o dos anos 1990, a revista Globo Rural me convidou para escrever uma hist�ria”, comenta. “Um cara urbano”, como ele pr�prio diz, escrever para uma publica��o do campo? Humberto ent�o revelou, por meio desse texto, a trajet�ria de seu pai, o ambientalista Hugo Werneck (1919-2008).
Dentista por profiss�o, “espalhador de passarinhos” por paix�o, o Werneck pai ganhou tal apelido por atuar pela preserva��o das esp�cies. Durante d�cadas, devolveu p�ssaros para a natureza. Recolhia-os de lugares onde eram abundantes – em viagens pelo interior de Minas, nos anos 1950, a bordo de um Chevrolet 39, escreveu o Werneck filho – para solt�-los em regi�es onde p�ssaros eram raros. “Tenho muita alegria de meu pai ter lido essa cr�nica”, comenta Humberto.

BH A partir da narrativa de abertura, o autor re�ne outras 53 cr�nicas, muitas delas de car�ter memorialista, que remetem � inf�ncia e juventude passadas em Belo Horizonte. Tem a hist�ria do garoto, o segundo dos 11 filhos do casal Wanda e Hugo Werneck, que sofreu na adolesc�ncia com as cal�as feitas em casa, “espichadas” sempre que ele crescia alguns cent�metros (“Roupa em fase de crescimento”).
Tem ainda a do jovem (e petulante) jornalista, tamb�m na �poca do “Suplemento Liter�rio”, que passou vexame com Clarice Lispector (“Meu traumatismo ucraniano”). A hist�ria � do fim dos anos 1960, mas seu desdobramento (sensacional, vale dizer) � de d�cadas depois.
“Minhas cr�nicas t�m muito da coisa memorial�stica, mas espero que n�o sejam mem�rias chorosas, pois n�o sou do tipo que acha que o meu tempo era melhor”, comenta Werneck.
LITERATURA Para ele, a discuss�o sobre se cr�nica � ou n�o g�nero liter�rio n�o tem muito sentido. “Como jornalista, voc� tem que escrever da forma mais objetiva e impessoal poss�vel. J� a cr�nica � o contr�rio, quanto mais subjetiva e pessoal, mais voc� estabelece liga��o com o leitor. Quando leio uma boa cr�nica, seja do Rubem Braga ou do Ant�nio Maria, sinto que o cronista est� sentado comigo no meio-fio falando alguma coisa”, comenta.
Mesmo deixando de atuar cotidianamente na imprensa, ele continua ativo no universo das cr�nicas. Humberto Werneck � editor do Portal da Cr�nica Brasileira (cronicabrasileira.org.br), projeto do Instituto Moreira Salles que recupera textos de grandes autores – Rubem Braga, para muitos o maior dos cronistas, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos, Rachel de Queiroz e Otto Lara Resende.
“O ESPALHADOR DE PASSARINHOS”

- Colet�nea de cr�nicas de Humberto Werneck
- Arquip�lago Editorial
- 176 p�ginas
- R$ 45
- Nesta quinta- feira (1º/07), �s 19h, o autor lan�a o livro no Sempre um Papo, em conversa com Afonso Borges. Acesso: Facebook, Instagram e YouTube do projeto.