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Estado de Minas LIVRO

Biografia de Ney Matogrosso mergulha na intimidade do t�mido espalhafatoso

Livro escrito pelo jornalista e cr�tico musical Julio Maria chega nesta sexta (23/07) �s livrarias. No m�s que vem, o artista completa 80 anos


23/07/2021 04:00 - atualizado 22/07/2021 23:03

Ney Matogrosso, aqui em registro de 1976, completa 80 anos no próximo dia 1º. Biografia relata seu rompimento com o pai, os grandes amores e as profissões anteriores ao ingresso na vida artística(foto: BOB WOLFENSON/DIVULGAÇÃO)
Ney Matogrosso, aqui em registro de 1976, completa 80 anos no pr�ximo dia 1�. Biografia relata seu rompimento com o pai, os grandes amores e as profiss�es anteriores ao ingresso na vida art�stica (foto: BOB WOLFENSON/DIVULGA��O)

Entre as muitas qualidades de Ney Matogrosso n�o est� a de contar hist�rias. “Ele n�o se emociona com o passado, acha tudo um pouco normal. N�o v� ele mesmo como um acontecimento. � um hippie mesmo”, afirma Julio Maria. Durante cinco anos, o jornalista teve que desfiar um novelo envolvido em uma coura�a, “fruto da postura e do respeito que ele d� para ele mesmo”.

N�o foi um caminho f�cil, mas “Ney Matogrosso, a biografia” (Companhia das Letras), que chega nesta sexta-feira (23/07) �s livrarias de todo o pa�s, re�ne um retrato sens�vel, bem-escrito e apurado do cantor que queria ser ator, do jovem que quando ficou adulto nunca deu valor ao dinheiro, do artista que, sem abra�ar bandeiras, tornou-se refer�ncia m�xima para a liberdade de express�o no pa�s. 

Com a expertise de quem cobre diariamente o cen�rio musical h� 25 anos – h� 15 � rep�rter e cr�tico musical do jornal O Estado de S.Paulo –, Julio chegou a Ney por dois motivos. Em 2015, depois de concluir sua primeira biografia – “Nada ser� como antes”, sobre Elis Regina – ele queria escrever sobre algu�m que lhe desse liberdade e n�o escondesse as coisas. “Qual artista vivo seria capaz de fazer isso? N�o tem muitos”, observa. A sinceridade que Ney demonstrou quando foi entrevistado para a biografia de Elis pesou na escolha do bi�grafo.

RESIST�NCIA

“Entendi tamb�m que a hist�ria do Ney � de resist�ncia. Em 2015, assistimos ao crescimento da homofobia, da ultradireita retr�grada, ou seja, tudo contra que ele havia lutado”, assinala o autor. A data do lan�amento coincide com a chegada do cantor aos 80 anos – em 1º de agosto pr�ximo. 

O livro � aberto pela en�sima briga da fam�lia Souza Pereira. No final da d�cada de 1950, em Bela Vista, nos confins do Mato Grosso do Sul, pr�ximo � fronteira com o Paraguai, o Sargento Matto Grosso vivia �s turras com o filho Ney. O pai j� havia notado que o filho de 17 anos era diferente. Um dia, cansado dos abusos paternos, Ney saiu de casa, deixando estupefata a m�e, Be�ta, mulher de personalidade forte – hoje, l�cida aos 99 anos, vive no s�tio do filho, na Serra do Mato Grosso, regi�o de Saquarema, interior fluminense.

Ney voltaria para casa uma vez, mas a quebra do v�nculo paterno foi definitiva. Os dois nunca foram pr�ximos – na primeira vez que o viu no palco, Sargento Matto Grosso estava sob o efeito de calmantes que as filhas providenciaram. At� se tornar Ney Matogrosso, no in�cio da d�cada de 1970, Ney de Souza Pereira viveu no Rio de Janeiro, em Bras�lia e em S�o Paulo, onde estreou como cantor com o Secos & Molhados.

TRANSGRESS�ES

Ingressou na Aeron�utica, onde ficou dois anos, como forma de sobreviv�ncia. Quando viu que precisava desafiar a mem�ria de Ney – para a escrita do livro foram sete longas entrevistas presenciais, al�m de conversas di�rias pelo telefone nos primeiros seis meses da pandemia –, Julio Maria foi atr�s de documentos. Descobriu que ele tinha, em sua ficha de ocorr�ncia, transgress�es. “Eu levava o documento, e ele se lembrava e contava. Logo vi que n�o poderia me prender s� � narrativa do Ney.”

O bi�grafo entrevistou cerca de 200 pessoas – de familiares a colegas de profiss�o, como Rita Lee, Paulo Ricardo, Simone, Caetano Veloso; al�m de produtores, empres�rios e jornalistas. Em Bras�lia, onde trabalhou em um hospital, Ney descobriu o teatro. Tamb�m logo come�ou a trabalhar com adere�os – criativo, se sustentou durante algum tempo vendendo artesanato. A m�sica chegou aos 31 anos – naquela idade, ele nunca tinha comprado um LP ou ido a um show de rock.

A aus�ncia de refer�ncias chama a aten��o em sua trajet�ria e talvez explique sua originalidade. “Todo mundo que virou cantor, compositor, tinha refer�ncias que alimentavam seus sonhos. Caetano e Gil ouviram Jo�o Gilberto e ficaram estonteados; Elis queria ser �ngela Maria. O Ney n�o teve isso. Quando ele aparece daquela forma com o Secos & Molhados, n�o queria ser nada, n�o tinha conhecimento de algo da carreira art�stica para seguir. E a forma��o de um artista aos 31 anos � algo muito particular”, afirma Julio. 

A partir do momento em que Ney se firma na m�sica, a narrativa entremeia o processo de cria��o de seus discos e shows – e os reveses que teve ao longo da carreira – com a vida pessoal. Ele transou com quem quis, homens e mulheres, e teve tr�s grandes amores, todos mortos em decorr�ncia da Aids: Z�, Cazuza e Marco de Maria. 
 

PAIX�O

Z� foi a primeira paix�o de Ney no Rio de Janeiro. Filho de fam�lia abastada da alta sociedade carioca, nunca foi identificado publicamente, tanto que aparece sem sobrenome. Cazuza foi uma hist�ria muito r�pida – o namoro durou somente tr�s meses – mas a amizade, na vida e na arte, permaneceu at� a morte do cantor e compositor, em 1990. Quando ele j� estava bem doente, Ney ia � sua casa s� para lhe fazer massagem nos p�s.

Marco de Maria foi a �nica pessoa com quem morou junto. “Tinha que decifrar quem era esse cara, e o amor dos dois � muito bonito”, comenta Julio. O bi�grafo encontrou-se com os irm�os de Marco e obteve depoimentos muito impactantes. “A gente est� falando de um tempo em que quem contra�a Aids recebia o decreto de uma vida solit�ria. O Ney, desde o come�o, disse que ficaria com ele at� o fim.” 

Os dois estavam separados quando veio o diagn�stico positivo. Ney n�o s� levou Marco de volta para sua casa, como separou e equipou um quarto para ele. A fam�lia de Marco chegou a tentar lhe dar dinheiro para ajudar no tratamento, mas ele se negou a aceitar.

“Muitas vezes, o Ney teve que continuar a fazer shows para pagar o tratamento, que era car�ssimo. Isso foi lembrado em meio a l�grimas pela fam�lia. Para mim, foi uma li��o de car�ter. � tamb�m uma li��o para muita gente que ainda duvida de que homens podem amar outros homens”, diz Julio.

VACINA

A biografia segue at� os dias atuais. Julio colocou um ponto no final no texto em 1º de mar�o deste ano, quando Ney tomou a primeira dose da vacina AstraZeneca. Terminada a escrita, o bi�grafo foi atr�s do biografado. “L� atr�s, quando falei para o Ney da biografia, ele disse que n�o queria ler antes que ela sa�sse. Pois liguei e disse que queria que ele lesse para ver se havia alguma coisa errada, no sentido de uma fase, um ano, um lugar. Ele foi muito profissional, pegou uma canetinha, fez anota��es pontuais, mas sem tirar nada de contexto ou tentar amenizar.”

E gostou do que leu? Julio comenta que houve um sil�ncio ap�s a entrega dos originais. No quinto dia, pegou o telefone e ligou. “Ney disse que um dos pontos que o incomodaram foi que n�o sabia que o tinham chamado de ‘viado’ tantas vezes.” Chacrinha foi um de seus mais agressivos cr�ticos no in�cio da carreira. Na imprensa carioca, escreveu que “Ney Mato Fino” deveria ser “proibido pela censura e pelo Juizado de Menores” porque era “rebolativo, er�tico e muito do bich�nico”.

“Fico feliz que o livro saia agora, em meio a essa ideologia do mal que se instalou no pa�s”, afirma Julio, reafirmando que todo o processo foi “sem patrulhamento, mimimi ou egolatria do artista”. 


LIVES COM O AUTOR

V�rias lives v�o marcar o lan�amento da biografia. Na pr�xima quarta (28/07), �s 19h, Julio Maria participa de debate virtual no canal do YouTube da Livraria da Travessa. Em 5 de agosto, �s 19h, haver� live no Instagram da Livraria da Vila. E em 20 de agosto, �s 20h, o bi�grafo se encontra com Ney Matogrosso no palco do teatro Sesc Pinheiros. A transmiss�o ser� pelo YouTube do pr�prio teatro.


NOVO DISCO

Em 1º de agosto, dia de seus 80 anos, Ney lan�a as primeiras quatro faixas de seu novo �lbum, “Nu com a minha m�sica”, can��o de Caetano Veloso gravada pela primeira vez na voz de Ney. Al�m dessa, o repert�rio inclui “Gita” (Raul Seixas), “Unic�rnio” (Silvio Rodriguez) e “Se n�o for amor, eu cegue” (Lenine e Lula Queiroga). O disco completo, com 12 can��es, ser� lan�ado at� o fim do ano.


SHOW EM BH

Est�o � venda os ingressos para o Breve Festival 2022, que ser� realizado em 9 de abril, na Esplanada do Mineir�o. Ney Matogrosso ser� uma das atra��es do evento, ao lado de Elba Ramalho, Alceu Valen�a e Geraldo Azevedo (com O Grande Encontro), Gal Costa, Racionais MCs, Djonga, Pitty, entre outros. Ser� a primeira edi��o do festival desde 2019. Ingressos: R$ 100 a R$ 270. � venda no sympla.com.br/brevefestival.

(foto: Companhia das Letras/Divulgação)
(foto: Companhia das Letras/Divulga��o)

“NEY MATOGROSSO, A BIOGRAFIA”
• Julio Maria
• Companhia das Letras (512 p�gs)
• R$ 89,90 (livro) e R$ 39,90 (e-book)


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