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Estado de Minas CINEMA

Filme que venceu concurso em Minas vai recontar mito de rainha assassinada

Premiado no Brasil CineMundi 2021, 'O segredo de Sik�n' se baseia em hist�ria de personagem mitol�gica morta por homens ao revelar que estava destinada a reinar


07/10/2021 04:00 - atualizado 07/10/2021 11:33

Ilustração de Mayara Ferrão
Trecho inicial do filme contar� o mito de Sik�n em anima��o, com ilustra��es da baiana Mayara Ferr�o (foto: Mayara Ferr�o/Divulga��o)

"(O pr�mio) � fundamental para fortalecer o cinema feito por mulheres negras em Belo Horizonte. A gente tem muitas pessoas potentes aqui, que muitas vezes n�o t�m oportunidades para desenvolver os seus projetos"

Fernanda Vidigal, produtora

A diretora � baiana (Everlane Moraes); a produtora � mineira ( Fernanda Vidigal, da Carapi� Filmes). Juntas, elas pretendem realizar o longa “ O segredo de Sik�n ", narrativa fant�stica com uma abordagem feminista em seu modo de recontar um mito africano em terras nordestinas. 

O projeto do filme foi o vencedor da 12ª edi��o do Brasil CineMundi , evento paralelo � Mostra CineBH, dedicado a filmes em gesta��o. O an�ncio da escolha do j�ri pela coprodu��o Minas/Bahia foi feito no �ltimo domingo (5/10), em cerim�nia virtual. 

Everlane Moraes, de 33 anos, � graduada pela Escola Internacional de Cinema e TV de Cuba (EICTV-Cuba) e, desde 2012, se dedica � dire��o cinematogr�fica. Natural de Cachoeira (a 120 quil�metros de Salvador), ela j� dirigiu oito curtas. Com a produ��o documental “Pattaki” (2018), ela concorreu no Festival Sundance, o principal evento do cinema independente dos EUA.

Artista negra, Everlane afirma que seus filmes transitam entre diferentes g�neros e formatos, mas tratam, sobretudo, de “quest�es sociais, filos�ficas e espirituais da di�spora negra no mundo, principalmente no Brasil”. Com “O segredo de Sik�n” n�o � diferente. 

O projeto, ainda em fase de desenvolvimento, surgiu em Cuba, h� alguns anos. Foi na ilha que Everlane conheceu a mineira Fernanda Vidigal durante a forma��o na EICTV, entre 2015 e 2018. As duas firmaram a parceria para produzir “O segredo de Sik�n”, com a participa��o da roteirista Tatiana Monje, de Costa Rica.

A hist�ria tem como base a mitologia afro-cubana de Sik�n, que tem origem na Nig�ria, mas a situa em terras brasileiras. "� a liga��o entre tr�s pa�ses (Brasil, Nig�ria e Cuba), o que simboliza uma tr�ade da di�spora negra”, afirma Everlane.

a diretora Everlane Moraes
A diretora Everlane de Moraes tem oito curtas no curr�culo e j� participou do Festival de Sundance, com 'Pattaki' (2018) (foto: Nat�lia Medina/Divulga��o)

PRINCESA 

Na vers�o original, a princesa Sik�n recebe uma revela��o em segredo de uma divindade no Rio Od�nn. A profecia dizia que ela seria a rainha da cidade nigeriana de Calabar e traria paz � regi�o, que vivia em constante estado de guerra. No entanto, a princesa revela o segredo ao seu amante, e com isso � condenada � morte por homens de sua tribo.

A diretora observa que a lenda reproduz o machismo, porque julga e sacrifica uma mulher que amea�ava a hegemonia pol�tica dos homens. “Esse mito, assim como muitos outros, representa a mulher como a causadora do desequil�brio, dos males da sociedade. � sempre a mulher quem tem o pecado. Ela � indiscreta, n�o guarda segredos, � sedutora. S�o mitologias que contam a vers�o pelo ponto de vista masculino, que condena essas personagens.”

Everlane cita outros exemplos: “� a mesma coisa com Eva, que seduziu Ad�o a comer a ma�� e at� hoje a gente sofre com isso. Helena, por sua beleza, provocou a Guerra de Troia. Pandora era curiosa e abriu a caixa, libertando todos os males do mundo. � um mito que justifica a perda do poder social e pol�tico das mulheres. Sik�n supostamente contou o segredo sagrado, ent�o n�o era digna de ser uma rainha”. 

Nesse seu primeiro longa de fic��o, Everlane dar� a Sik�n uma nova representa��o, como uma mulher forte e discreta. No momento de sua condena��o, ela pula no rio e se transforma em um peixe m�gico, uma esp�cie de divindade que vai carregar a profecia durante s�culos. Ela percorre as �guas durante 3.500 anos, at� chegar ao Rio Paragua�u, em Cachoeira (BA).

A cartografia semelhante entre a regi�o baiana em que Everlane nasceu e Calabar influenciou sua decis�o de levar a narrativa para o Nordeste, onde se concentra a maior comunidade negra fora da �frica. Na vers�o original, duas tribos rivais s�o divididas pelo Rio Od�nn – assim como Cachoeira e S�o F�lix, na Bahia, s�o cortadas pelo Rio Paragua�u. “Para mim � importante porque mostra uma Bahia pouco conhecida e pouco explorada. E mais profunda, nesse sentido”, afirma a diretora.

a produtora Fernanda Vidigal
A produtora mineira Fernanda Vidigal classifica como 'simb�lica' a vit�ria do projeto, que d� visibilidade ao trabalho de mulheres negras no cinema (foto: Rafael Freire/Divulga��o)

"Acho que � um bom momento para discutir os espa�os de poder, n�o como uma coisa %u2018homem contra mulheres%u2019, nada disso. Mas que existe espa�o para todos exercerem seu direito � representatividade e � participa��o pol�tica"

Everlane Moraes, diretora�


NOITE ETERNA 

Entretanto, o Nordeste que ser� visto em “O segredo de Sik�n” � dist�pico. O mundo passou a ser habitado somente por pessoas negras, que nunca viram a luz do Sol. A injusti�a na condena��o de Sik�n trouxe a “noite eterna”, ao longo dos s�culos. A sociedade � governada por homens que est�o sempre guerreando. As mulheres s�o subjugadas e n�o t�m poder pol�tico. 

A trama gira em torno de cinco personagens, que s�o mulheres negras: a artista, a mulher trans, a m�e, a religiosa e a prostituta. Everlane Moraes conta que sonha em ter a atriz mineira Grac� Pass� como protagonista e est� em negocia��o com ela para o papel. O restante do elenco ser� formado por n�o profissionais. Todas as cenas ser�o gravadas no per�odo noturno. 

 Na narrativa, as mulheres organizaram uma irmandade secreta que busca mudar a realidade, investigando o mito de Sik�n. Elas tentam resgatar o peixe m�gico, sem chamar a aten��o dos homens, e entregar o segredo para a herdeira da princesa. Caso a miss�o seja bem-sucedida, as mulheres finalmente poder�o reinar, trazendo a paz e o sol de volta ao horizonte.

 “� um filme sobre a sororidade, a uni�o entre as mulheres. Elas se comunicam com o olhar, com a cumplicidade, porque precisam acabar com a guerra que mata seus filhos e maridos", diz a diretora. Embora inspirado em uma mitologia antiga, o filme discute quest�es atuais e problemas cr�nicos da sociedade, propondo uma “mudan�a de paradigma”, segundo Everlane.

“A gente est� falando de um poder que as mulheres t�m, mas foi retirado das m�os delas. Ent�o, � restitu�-lo atrav�s desse mito, na verdade”, diz. “Acho que � um bom momento para discutir os espa�os de poder, n�o como uma coisa ‘homem contra mulheres’, nada disso. Mas que existe espa�o para todos exercerem seu direito � representatividade e � participa��o pol�tica.” 

APOIO 

Na 12ª edi��o do Brasil CineMundi, o projeto conquistou mais de R$ 180 mil em servi�os para a produ��o do filme – ainda sem previs�o de estreia. Ap�s mais de 15 reuni�es com apoiadores da mostra,“O segredo de Sik�n” ganhou acesso a empr�stimo de equipamentos, servi�os de finaliza��o e de p�s-produ��o, al�m da tradu��o do roteiro para o franc�s. Os financiamentos v�m da Fran�a, Alemanha, Argentina e EUA.

Fernanda Vidigal, de 28 anos, afirma que foi muito simb�lico conquistar este reconhecimento em sua terra natal. “� fundamental para fortalecer o cinema feito por mulheres negras em Belo Horizonte. A gente tem muitas pessoas potentes aqui, que muitas vezes n�o t�m oportunidades para desenvolver os seus projetos”, diz. 

Ela tamb�m destaca a uni�o entre as regi�es ao longo da produ��o. “Para a gente � superespecial, porque estamos conectando mulheres pretas que trabalham com cinema e anima��o em Minas e na Bahia.” No longa, a introdu��o da hist�ria ser� feita em anima��o pela belo-horizontina M�rian Rolim. A ilustradora do projeto � a baiana Mayara Ferr�o. 

Fernanda diz que “o projeto se torna muito mais vi�vel a partir do momento em que outras pessoas acreditam nele tamb�m. Isso d� uma pot�ncia grande, ent�o � s� agradecer”. 

*Estagi�rio sob a supervis�o da editora Silvana Arantes


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